domingo, dezembro 12, 2010

Grandes aberturas: Moby Dick


Tratem-me por Ismael. Há alguns anos – não interessa quando – achando-me com pouco ou nenhum dinheiro na carteira, e sem qualquer interesse particular que me prendesse à terra firme, apeteceu-me voltar a navegar e tornar a ver o mundo das águas. É uma maneira que eu tenho de afugentar o tédio e normalizar a circulação. Sempre que sinto um sabor a fel na boca; sempre que a minha alma se transforma num Novembro brumoso e húmido; sempre que dou por mim a parar diante de agências funerárias e a marchar na esteira dos funerais que cruzam o meu caminho; e, principalmente, quando a neuroastenia se apodera de mim de tal modo que preciso de todo o meu bom senso para não começar a arrancar os chapéus a todos os transeuntes que encontro na rua – percebo que então chegou a altura de voltar para o mar, tão cedo quanto possível. É uma forma de fugir ao suicídio. Onde, com um gesto filosófico, Catão se lança sobre a espada, eu, tranquilamente, meto-me a bordo. E não há nisto nada de extraordinário. Embora inconscientemente, quase todos os homens sentem, numa altura ou noutra da vida, a mesma atracção pelo oceano.”

Herman Melville, Moby Dick, Relógio D’Água

A leitura do grande romance de Melville, começa com um embarque. O embarque de Ismael? Não! O nosso embarque com Ismael. É com ele que embarcamos para a grande viagem, rumo ao desconhecido. É com ele que fugimos à vida quotidiana, à depressão e ao cansaço mental e zarpamos num estranho navio. E de repente o desconhecido não é só o que o oceano oculta para lá do horizonte e abaixo da linha das suas águas, nos abismos profundos. É também o próprio navio onde embarcamos e a sua estranha tripulação. E assim, aos poucos, vamos penetrando não só no oceano, mas também no navio, e nos mistérios de uma tripulação comandada por um homem obstinado, disposto a navegar em todos os mares do mundo. E com ele perseguimos a baleia que lhe foge e lhe torna a aparecer, quando menos se adivinha, investindo numa ira sem fim.

sábado, dezembro 04, 2010

Que me perdoe o Alegre mas…

...não é tempo para nos alegrarmos, e muito menos para nos encavacarmos. E que me desculpe o Lopes das nomenklaturas.

É tempo de nos enobrecermos.

O Alegre que me perdoe, mas votarei no Dr. Fernando Nobre.

  • Ele não é político.

  • Ele é um dos portugueses mais ilustres e notáveis da actualidade, um homem de qualidade.

  • Ele tem provas dadas no seu campo, ou seja, na área do auxílio humanitário e na ajuda ao próximo.

  • É um homem genuinamente sensível às causas sociais, longe de o ser por parecer bem ou por motivos eleitoralistas

  • A sua área política é suficientemente alargada: vai da esquerda à direita.

  • É genuíno e verdadeiro, fala a verdade ao contrário de Cavaco que mente quando diz que fala a verdade, pois de seguida afirma que não é político, sendo um dos políticos há mais tempo no activo na nossa praça.

  • Além disso confiaria em Fernando Nobre, se tivesse que lhe comprar um automóvel em segunda mão, ao contrário dos outros candidatos.

quinta-feira, novembro 11, 2010

É preciso pô-los a correr

Ou por outras palavras: é preciso correr com eles. E para bem longe.

Escumalha política!

terça-feira, novembro 09, 2010

A resposta dos “mercados”.

Ora aí está a resposta dos “mercados” aos cuidados dos políticos, que se esforçaram por chegar, contrariados, a um acordo para a viabilização do orçamento, (só para agradar aos “mercados”): os juros da dívida pública atingiram os 7%. Este facto demonstra que os “mercados” são, realmente, sensíveis (!) ao comportamento dos políticos…e continua a especulação, como se nada fosse.

A questão é que não se trata de “mercados”, mas de especulação financeira. São os especuladores senhores, são os especuladores…

No passado o financiamento da economia baseava-se na poupança. Diz a boa lei keynesiana que investimento é igual a poupança. Actualmente a economia financia-se junto dos mercados especulativos. Actualmente, o investimento é igual a endividamento e o endividamento é galopante. É a economia do crédito.

Por que não se retorna à economia da poupança? Por que razão os governos não desenvolvem medidas que fomentem a poupança em vez do crédito e do endividamento?

O Presidente Cavaco Silva já veio em defesa dos “mercados”: que não faz sentido agora atirar pedras aos “mercados”, diz ele. Mas o problema não está em questionar os “mercados”. O problema está naqueles que nos dirigem continuarem a tratar os “mercados” como se fossem deuses que é preciso aplacar, com sacrifícios cada vez maiores, quais molochs insaciáveis.

sexta-feira, outubro 08, 2010

A vingança dos mercados

O noticiário das 20:00 da RTP 1 abriu hoje com “o nervosismo dos mercados”. Estão “nervosos”, dizem, e é suposto que nós devamos tremer. Malandros dos mercados! O ministro Teixeira dos Santos ouve os mercados atentamente, mais do que a nós. Somos por isso governados pelos mercados.

No passado, os bancos financiavam-se com base nas poupanças dos seus clientes. Hoje financiam-se nos mercados bolsistas, que são autênticos casinos. O Estado também se financia, por isso, nos mercados financeiros e deles está refém.

Como os governos não regularam os mercados quando deviam, agora são os governos que são regulados pelos mercados. Governam ao sabor dos instáveis “estados de alma” das praças financeiras.

Andamos à deriva, ao sabor, não do vento, mas dos humores dos mercados.

quarta-feira, outubro 06, 2010

Salomé, maldita Salomé

Leon Herbo, Salomé, 1889

terça-feira, outubro 05, 2010

A sorte do mensageiro

Dizem que o primeiro a morrer é o mensageiro. O Baptista não escapou a essa sorte. Eis a sua cabeça, num prato, num excelente quadro de Caravaggio.

Caravaggio, Salomé, 1610

Mataram o mensageiro mas a mensagem não morreu. Sobreviveu-lhe e sobrevive, para todo o sempre.

Ainda a cruz

Cristo não morreu na cruz coisa nenhuma. Cristo viveu na cruz. Quando morreu já lá não estava. Se é que morreu.

Divagações sobre o Baptista


Leonardo da Vinci, São João Baptista, 1513-1516

Eis que Leonardo decidiu pintar um santo estrábico. O dedo indicador esticado é ofensivo em certas culturas. (Mas às vezes apetece esticar o dedo a certo tipo de gente, e não é o indicador).

Aponta o Baptista para o céu, parecendo querer indicar-nos a proveniência daquele que virá. Para onde olha o tolo? (Não me refiro ao Baptista). Para a cara do Baptista, para o dedo ou para o céu? (Diz um ditado, não sei se confuciano, que quando o sábio aponta para o céu, o tolo olha para o dedo). Estaria Leonardo a querer fazer de nós tolos? Onde está o céu?

Também a cruz está presente: saberia Baptista o destino daquele de quem anunciava a vinda?

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