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domingo, junho 09, 2024

O terrorismo de Estado e o outro

 Peter Sloterdijk

Reflexões de Um Apolítico que Deixou de o Ser

Frankfurter Allgemeine Zeitung, 19 de Junho de 2013

In Reflexos Primitivos, Relógio D’Água, 2021, p.67

 

 

“Irrefletidos são, sobretudo, aqueles contemporâneos, aparentemente bem-intencionados, que se obstinam em ignorar que noventa e nove por cento de todos os ataques terroristas no século XX se podem incluir no terrorismo de Estado. Em geral, foram Estados e regimes em posse do Estado que, sob os pretextos mais variados, maltrataram as suas populações por meio da política do medo, na maior parte dos casos para as proteger de pretensos agressores e outros elementos daninhos no interior.”

 

Peter Sloterdijk

 

Reflexão

 

Neste excerto, Sloterdijk coloca ao mesmo nível moral o terrorismo praticado pelos “Estados e regimes em posse do Estado” e o terrorismo praticado por movimentos terroristas. É tão terrorista o Estado terrorista como o terrorista do movimento, contudo, pelos meios de que dispõe, o Estado terrorista é mais eficaz, generalizado e letal. 

 

O Estado pode também fazer um uso instrumental do terrorismo – da política do medo - para dessa forma conseguir mobilizar os seus cidadãos para as causas dos mais elevados interesses que o movem, para além dos interesses de cada um, ou até contra os interesses individuais.

 

Onde termina a guerra e começa o terrorismo? Não será a guerra, em si, já uma forma de terrorismo?

 

Não tenhamos dúvidas. Partindo desta acepção de Sloterdijk, tanto é terrorista o movimento do Hamas como é terrorista o Estado israelita. Contudo o terrorismo de Estado de Israel é mais eficaz, generalizado e letal, e ainda que surja como uma resposta a um ataque terrorista, não deixa de ser também terrorismo. A resposta do Estado israelita foi (e está a ser) desproporcionada. Não olhou à condição dos seres humanos do território que que visava, fossem eles civis ou militares, crianças ou velhos, culpados ou inocentes, tal como fez o Hamas, quando atacou Israel a 7 de Outubro de 2023. Para ambos não existem inocentes. Reina o ódio assassino entre as populações de ambos os Estados. O terrorismo grassa.

domingo, novembro 15, 2015

A barbárie jamais vencerá.



Hoje as multidões encheram a praça frente à catedral Notre-Dame, depois da missa, e entoaram-se cânticos na place de la Republique. Aguarda-se uma resposta mais musculada contra os clusters do activismo islâmico na Europa e mais além. A barbárie não se pode sobrepor ao mundo civilizado, diz Obama frente ao presidente turco. O activismo islâmico não pode ser consentido na Europa e em nenhum outro lugar do mundo civilizado.

Ao longo das últimas semanas foram numerosos os atentados, a começar pela queda do avião comercial russo na península do Sinai. Depois no Líbano e na Turquia e agora em França. Serão os últimos estertores do Daesh, agora que o martelo russo cai na Síria e que infantaria iraniana entra no terreno? E temos ainda a intervenção das forças aéreas americana, francesa entre outras, em apoio dos peshmergas no solo. Como pode o Daesh resistir a tudo isto? E eis então que os ratos do Daesh fogem em todas as direções. É a debandada. Alguns dirigem-se para a Europa. Pois a Europa que acorde. Aqui há trabalho que não pode deixar de ser feito, sob pena de se repetirem os atentados de Paris.

sábado, novembro 14, 2015

Os terroristas vencem

Em vez de uma resposta destemida, que seria Paris a funcionar normalmente este sábado, com gente nas ruas - uma Paris desafiadora e confiante – a cidade acordou com medo, com os seus cidadãos escondidos atrás de portas, como cordeiros, com receio de lobos armados nas ruas. E tudo a conselho de uma fraca liderança. Os atentados são um acto de guerra, pois claro, mas não uma declaração de guerra, porque essa há muito foi declarada. Não é a Síria sobrevoada e bombardeada por aviões franceses?

Se fosse oposição em França, deixaria passar os dias de luto e a seguir cairia com força sobre o governo francês e o presidente. As falhas de segurança que permitiram estes atentados são inadmissíveis e a senhora Le Pen já está a tentar tirar proveito desta situação, com o seu populismo fácil.

terça-feira, junho 23, 2015

Sobre o jihadismo

«Olivier Roy tem defendido de forma brilhante e persuasiva, que os jihadistas contemporâneos não podem ser compreendidos principalmente em termos culturais ou religiosos. A religiosidade muçulmana genuína tem sempre estado implantada numa cultura local ou nacional, onde a doutrina religiosa universalista é modificada pela aposição dos costumes, hábitos, santos e afins locais, e apoiada pelas autoridades políticas regionais. Não é este tipo de religiosidade que constitui a raiz do terrorismo dos nossos dias. O islamismo e os seus rebentos jihadistas são o produto daquilo que Rot chama Islão «desterritorializado», no qual os muçulmanos individuais se vêem isolados das tradições locais autênticas, muitas vezes como minorias em terras não-muçulmanas. Isto explica o porquê de tantos jihadistas não serem oriundos do Médio Oriente, mas sim criados (como Mohamed Atta um dos conspiradores do 11 de Setembro) na Europa Ocidental. O jihadismo é, por conseguinte, não uma tentativa de restaurar uma forma originária de islamismo genuíno, mas uma tentativa de criar uma nova doutrina universalista, que possa ser fonte de identidade dentro do contexto do mundo moderno, globalizado e multicultural.»

Francis Fukuyama, Depois dos Neoconservadores - A América numa Encruzilhada, Gradiva, 2006, pág. 67-68.

***

sábado, outubro 11, 2014

Quando o “Estado Islâmico” éramos nós

O nosso Estado foi construído contra o Castelhano e contra o Mouro, há quase 900 anos, na Idade Média. As práticas terroristas que hoje condenamos ao Estado Islâmico, e condenamos bem, também nós já as praticámos. Então, os bárbaros éramos nós. Pilhagens, cercos, razias, conquista de territórios à espadeirada, decapitações, eram o “pão nosso de cada dia”, a tal ponto que, perto delas, as atuais práticas terroristas do Estado Islâmico parecem ser coisa de crianças.

Fica um excerto do texto de Martin Page, A Primeira Aldeia Global, relativo ao cerco de cidade de Lisboa (1147), então cidade moura, pelos exércitos de D. Afonso Henriques, auxiliados por cruzados bretões, ingleses, normandos e alemães, entre outros:

«Escreveu no seu relato, o capelão dos cavaleiros normandos: “O ânimo dos nossos homens foi enormemente fortalecido para continuar a lutar contra o inimigo.” Um grupo de cavaleiros, que, entretanto, tinha ido fazer uma incursão a Sintra, acabava de regressar para junto dos seus companheiros de cerco, carregado com o produto das pilhagens.

Enquanto os bretões pescavam na margem sul do Tejo, um grupo de muçulmanos atacou, matando vários deles e fazendo cinco prisioneiros. Como represália, os ingleses organizaram um assalto à margem sul, à cidade de Almada, regressando nessa mesma tarde, com 200 prisioneiros muçulmanos e moçárabes e mais de 80 cabeças cortadas, o que, segundo então afirmaram, só lhes havia custado uma baixa. Empalaram as cabeças em lanças e agitaram-nas por cima das muralhas de Lisboa.

“Vieram ter com os nossos homens, suplicando-lhes que lhes dessem as cabeças que tinham sido cortadas”, acrescenta o capelão cronista. “Tendo-as recebido, voltaram para dentro das muralhas chorando a sua dor. Durante a noite, em quase todas as zonas da cidade, apenas se ouvia a voz da mágoa e o lamento da saudade. A audácia deste feito transformou-nos no pior terror para o inimigo.”»

Martin Page, A Primeira Aldeia Global, 6ª ed, Casa das Letras, 2010, pp. 87-88.

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Em suma, naquela altura os terroristas éramos nós. (Não estamos com isto a querer desculpar os imperdoáveis crimes do Estado Islâmico, mas factos são factos)

Hoje, o Estado Islâmico está a aplicar tácticas medievais de terror que os ocidentais então usavam sem qualquer pudor. Mas estamos no século XXI.

Naquele distante ano do século XII, a cidade sob cerco era Lisboa, hoje é Kobani.

segunda-feira, setembro 12, 2011

Entretanto, entre os sonâmbulos das “nações afortunadas”

Quem poderia contestar que os alarmistas, como sempre, têm quase inteiramente razão? Os habitantes das nações afortunadas avançam o mais das vezes como sonâmbulos no pacifismo apolítico. Passam os dias numa insatisfação dourada. Entretanto, nas margens da zona de felicidade, os que nos importunam e até os seus verdugos virtuais mergulham nos manuais da química dos explosivos – requisitados às bibliotecas públicas dos seus países de acolhimento.

Peter Sloterdijk (2006), Cólera e Tempo, Relógio D’Água, 2010, pág. 60

domingo, setembro 11, 2011

Colectivos da cólera e das «civilizações» vexadas


"De acordo com tudo o que hoje sabemos das coisas que nos esperam, seremos forçados a supor que a primeira parte do século XXI será também ela marcada por imensos conflitos que serão desencadeados por colectivos da cólera e das «civilizações» vexadas."

Sloterdijk, Peter (2006), Cólera e Tempo, Relógio D' Água, 2010. Pág. 40

quinta-feira, julho 28, 2011

Os terroristas enquanto produtores de entretenimento

Diz Peter Sloterdijk, filósofo alemão, acerca do terrorismo (os sublinhados são nossos):

«Se compreendemos porque é que as circunstâncias trabalham a favor dos terroristas, podemos também fazer uma ideia mais precisa da nossa própria situação: melhor que muitos produtores de televisão, os bombistas compreenderam que os senhores dos cabos não podem produzir todos os conteúdos em estúdio e continuam a depender dos contributos de acontecimentos provenientes do exterior. Passaram a sabê-lo por experiência própria: eles próprios oferecem os acontecimentos mais procurados, pois possuem praticamente um monopólio enquanto contet providers no sector da violência real. (…) Tal significa que a agressão continua a vender-se e que quanto mais impiedosa for, maior é a recompensa mediática. Desalmadamente divertidos, os agressores percebem os motivos disso: os sistemas nervosos dos habitantes do palácio de cristal podem ser ocupados sem dificuldades por quaisquer invasores, pois os referidos ocupantes, entediados com o palácio, continuam à espera de notícias do exterior.»

Peter Sloterdijk, O Palácio de Cristal, Relógio D’Água, 2005, pp. 195

É esse entretenimento que aqui recusamos. O nosso mundo não pode ser um palácio de cristal e nós não podemos comportar-nos como ocupantes entediados de tal palácio, ávidos por novos acontecimentos, consumidores de terror. O mundo não deve ser encarado como um palco, ou como um circo romano, onde as vítimas aguardam aterrorizadas a entrada dos leões para gáudio do público. É que as vítimas também somos nós.

***

«Podem [os terroristas] confiar no facto de que a única medida anti-terrorista que garantiria o êxito, a saber, o silêncio absoluto dos media quanto aos novos ataques (ou então a instauração de uma quarentena da informação que produzisse uma distância entre o atentado e o seu eco sensacional), seria inevitavelmente bloqueada, porque aqueles fariam questão de exercer o seu dever de informar

Peter Sloterdijk, O Palácio de Cristal, Relógio D’Água, 2005, pp. 196

Silenciar o terrorista e a sua obra, não significa enfiar a cabeça na areia, mas sim, adoptar a “única medida anti-terrorista” que garante o êxito da luta contra o terrorismo.

segunda-feira, julho 25, 2011

O terrorista norueguês

A sua imagem não será aqui exposta e o seu nome não será proferido. Os textos que escreveu não serão aqui lidos, nem transcritos. Não será citado. Que seja julgado à porta fechada e que a sua voz não seja ouvida no mundo, para lá das paredes do tribunal. Que o seu nome seja esquecido e se perca rapidamente nas areias do tempo. Que não seja feita a vontade ao terrorista que procura a fama, a glória negra, distorcida, e a lembrança. Também aqui, não será considerado lunático porque o mal existe e há quem o esconda atrás de doenças mentais. Chamar louco ou demente a um assassino é, de certa forma, perdoar ou diminuir a sua responsabilidade no mal que causou porque passará a ser visto como um inimputável. Ora o mal é muito racional e muito humano, demasiado humano. Por isso não chamaremos animal ao assassino, por respeito aos animais não humanos. Que seja esquecido e jamais perdoado. Que não seja feita a sua vontade.

Assim procederemos doravante com todos os terroristas.

Não nos aterrorizarão.

segunda-feira, maio 02, 2011

Morreu um terrorista

Hoje morreu um terrorista. Bin Laden era isso, na sua essência. Dizem, contudo, que ainda não terminou a guerra contra o terrorismo, como se estivessem a elucidar-nos. Como se estivessem a contar-nos uma grande novidade.

Enquanto houverem dois homens à superfície da Terra, haverá sempre um, pelo menos um, potencial terrorista.

Este é um dos significados da história bíblica de Abel e Caim.

quarta-feira, julho 30, 2008

O "medium" é a mensagem, ou, o mensageiro é a mensagem

Os media assumem-se como veículo da condenação moral do terrorismo e da exploração do medo com fins políticos, mas simultaneamente, na mais completa ambiguidade, difundem o fascínio bruto do acto terrorista, são eles próprios terroristas, na medida em que caminham para o fascínio (eterno dilema moral, ver Umberto Eco: como não falar do terrorismo, como encontrar bom uso dos media – ele não existe).

Baudrillard, Simulação e Simulacro

Quando os media difundem as mensagens dos terroristas tornam-se os media terroristas. Isto não é um mero jogo de palavras.

Desta forma os terroristas entram pelas nossas casas, mesmo com as portas trancadas.

E assim o mensageiro é a mensagem.

Neste contexto, é preciso desligar o mensageiro.
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Leituras posteriores:

- Baudrillard, Jean (1981). Simulacres et simulation. Éditions Galilée.

- Biernatzki, Williams (2002). “Terrorism and Mass Media”, Communication Research Trends, Vol. 21, n.º 1.

- Eco, Umberto (1968). La Struttura Assente. Milan: Bompiani.

- McLuhan, Marshall (1962). The Guttenberg Galaxy: The Making of Typographic Man. London: Routledge & Kegan Paul.

- Rantanen, Terhi (2005). “The message is the medium – An interview with Manuel Castells”, Global Media and Communication, Vol. 1 (2): 135 – 147.

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