quinta-feira, dezembro 31, 2020

Tocar a reunir

 

Conto com todos os poetas e profetas anacoretas,

Atletas das palavras,

Lançadores de discos, riscos e asteriscos.

Retiram das aljavas flechas de palavras

E montam cercos às cidades.

E com as suas catapultas as suas palavras arremessadas e catapultadas,

Derrubam muralhas.

 

Conto com todos os poetas e profetas anacoretas,

Atletas das palavras,

Para erguer este muro

Incontornável, insondável muralha,

Com todas as palavras do mundo.

 

É profundo o mundo.

quarta-feira, dezembro 30, 2020

Parabéns Patti

 Obrigado por iluminares a minha noite mais escura.

Because the night
Belongs to lovers
Because the night
Belongs to us

                Patti Smith/Bruce Springsteen


sábado, dezembro 26, 2020

Com efeito


     O mar mais azul, a areia mais dourada, a realidade mais sonhada.

     Arrábida ao fundo.

 

sexta-feira, dezembro 25, 2020

Feliz Natal 2020




Feliz Natal!

Ainda aqui estamos. Onde mais poderia ser? Na praia.



Fotografias de hoje, numa das praias mais magníficas da nossa costa. Praia do Carvalhal (Comporta).

quarta-feira, dezembro 02, 2020

Eduardo Lourenço (1923-2020)

 

Eduardo Lourenço (1923-2020)

quinta-feira, novembro 26, 2020

Adiós Maradona

 

Diego Armando Maradona (1960-2020)


Foi uma alegria vê-lo jogar no Campeonato Mundial do México de 1986. E antes e depois.

Ficará para sempre na memória.




sábado, novembro 14, 2020

Os mitos

 As histórias que sobrevivem mais tempo são as que nunca foram e sempre serão - os mitos.

Ann Druyan



Ann Druyan, Cosmos, Mundos Possíveis, Gradiva/National Geographic, 2020, Pág. 365

quarta-feira, novembro 11, 2020

Partidas: Gonçalo Ribeiro Telles

 

Gonçalo Ribeiro Telles (1922-2020)

Outro dos nossos melhores que parte.

Passearei sempre nos seus jardins. 

sábado, novembro 07, 2020

Long live to President Biden

 O mundo hoje tornou-se num lugar melhor. Há esperança.



sábado, outubro 31, 2020

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Sean Connery (1930-2020)

sábado, outubro 10, 2020

Onde a extrema-direita e a extrema-esquerda esbarram

 

«O que é afinal a União Europeia senão esse trabalho de desconstrução dos fundamentos identitários, um espaço liberto de todos os traços culturais de um território, das soberanias, dos valores e costumes, das tradições, dos gostos e valores, das questões religiosas e civilizacionais? O alargamento europeu é um modo de expansionismo ideológico e político através de uma visão economicista do homem e da destruição maciça de identidade para a construção de um grande supermercado.»

 

João Maurício Brás, Os Democratas que Destruíram a Democracia, Opera Omnia, 2019, pág. 95.

 ⁂⁂⁂

Aqui discordamos. Discordamos profundamente. O projecto europeu é o muro onde têm esbarrado todos os movimentos extremistas que se querem alçar ao poder nas suas nações. Quando colocam, abertamente ou veladamente, na sua agenda, a saída da União, perdem massa crítica, perdem votos. Isto porque se há um projecto do qual os povos não abdicam (exceptua-se aqui cerca de metade dos britânicos) é o da União Europeia. E com razão. Recordam o que foi a Europa durante séculos até 1945: uma guerra contínua intervalada por breves momentos de paz, momentos de preparação para a guerra seguinte. Nem a Belle Époque escapou, também ela culminando num período de rearmamento de cada um contra o seu vizinho. A Europa foi um eterno campo de batalha entre nações inimigas, agrupadas ou isoladas. Os solos da Europa estão pejados de reminiscências de sangue e de cadáveres de soldados e de civis, de bombas e de canhões. É bom não o esquecer. Ainda hoje, quando se fazem obras em certas cidades da Europa, encontram-se enterradas bombas de guerras pretéritas, que não rebentaram só por milagre, mas que ainda ameaçam rebentar e matar.

Se a União Europeia é “esse trabalho de desconstrução dos fundamentos identitários” a que João Maurício Brás se refere, então como explica ele a persistente presença das identidades nacionais, incólumes, ostentadas pelos povos que a integram, colocando muitas vezes em causa o objectivo da solidariedade entre os Estados-membros, como se viu recentemente? E as tensões entre Estados-membros na União Europeia, que impõem longas negociações até se conseguirem cedências de parte a parte? Ainda bem que as há. E ainda bem que são dirimidas por dentro. “Um espaço liberto de todos os traços culturais”? Não. Pertencemos à mesma civilização, mas as culturas, diversas, estão lá todas, enriquecendo-se umas às outras, colhendo o que de melhor há em cada uma delas sem se descaracterizarem por isso: estarão os lisboetas a dançar a sevilhana ou os andaluzes a cantar o fado?

Vivemos como sempre temos vivido, lado a lado, mas agora unidos.

Também não somos ingénuos ao ponto de acreditar que não há na União Europeia quem procure trabalhar no sentido da desconstrução dos fundamentos identitários e queira impor uma ideologia pós-moderna, pós-identitária, com a conivência do neoliberalismo dominante. Aqui João Maurício Brás indigna-se com razão. Essa gente está aí. Mas também há outra gente, como ele, que pensa de modo diferente.

A União Europeia não é um projecto estático e unidireccional. Pode ser transformada por dentro sem ser destruída. Pode ser melhorada. Há uma Ideia de Europa (George Steiner) que é preciso não deixar morrer.

Estamos fartos de guerras.

Destino & Horizonte

 Não esperes alterar com preces o destino fixado pelos deuses!

Virgílio, Eneida (citado por Séneca)


Os destinos estão determinados de uma vez por todas, e prosseguem a sua marcha em obediência à lei eterna do universo; tu irás para onde vai tudo o mais! 

Séneca, Cartas a Lucílio, Livro IX, Carta 77 


Toda a vida é sempre breve.

Séneca, Cartas a Lucílio, Livro IX, Carta 77

 

***


É bom não perder a referência da linha do horizonte.

O que há para lá dele, escapa-nos.

E também ele nos escapa, sempre que vamos ao seu encontro.

Tal como a perfeição, da qual podemos sempre aproximar-nos mas sem nunca a alcançar.

Carpe diem

Horácio, Odes, I, 11, 8.

segunda-feira, outubro 05, 2020

Frase do dia

Nós não vamos à caça com cornetas e pandeiretas.

Maria José Morgado
Procuradora-geral Adjunta

 

Quando questionada por Miguel Sousa Tavares, na TVI, sobre a pertinência da manutenção do segredo de justiça, quando o mesmo é violado a todo o tempo, segundo o jornalista.

Maria José Morgado não tem a mesma perspectiva de Miguel Sousa Tavares. É uma caçadora. Acredita no segredo de justiça.

A natureza humana. Che cos'è?

 “A natureza humana, o que quer que isso seja”, li um dia não sei onde, nem dito por quem. Perdi a referência. Talvez Agostinho da Silva… Não posso garantir. Dão-se alvíssaras a quem encontrar.

 

A natureza humana. Che cos'è?

 

Talvez os mitos nos digam mais sobre a nossa própria natureza do que aturados filósofos, que continuam em busca do “conhece-te a ti mesmo”. Permanecemos desconhecidos perante nós mesmos. E por muito que nos conheçamos, nunca nos conhecemos. O que somos? Quem somos? Por que somos? A cada avanço no sentido do conhecimento acerca de nós mesmos, um imenso desconhecido abre-se logo à nossa frente. A cada clareira de conhecimento que desbravamos, apreendemos logo uma imensa selva da qual não se adivinham os confins. Os seus limites, a existirem, vão muito para além de todos os horizontes, em qualquer direcção, para onde olhemos. Estamos perdidos à procura de nós mesmos e a busca é incessante. Por isso não nos venham falar com tanta certeza da natureza humana. Sabemos apenas que estamos juntos e que amamos. Talvez constitua o melhor da nossa natureza: a capacidade de amar em momentos difíceis e até adversos, pela simples compreensão das nossas próprias fraquezas.

quinta-feira, outubro 01, 2020

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Mafalda pensava o que Quino bem pensava.

Quino (criador de Mafalda) (1932-2020)

terça-feira, setembro 29, 2020

Paidéia, um lamento

 Paidéia ou educação era, até agora, o esforço de tirar a criança brincalhona, sensível, hedonista e curiosa da forma de ser do pequeno grupo, conduzindo-a ao clima universal das cidades e dos impérios com as suas perspectivas ampliadas, as suas lutas difíceis e o seu árduo trabalho forçado contra si mesmo. A tradição chamava adulto ao homem que tinha aprendido a procurar as suas satisfações em esferas sem felicidade. «A pessoa não tratada severamente não se educa.» Quando nasceram filosofias ou interpretações do mundo de tipo cultural avançado, foram também sempre escolas de tornar adulto no sentido de uma mudança da alma para maior.

 

Peter Sloterdijk, O Estranhamento do Mundo, Relógio D’Agua, 2008, pág. 217

 

***

A educação já não é a paidéia. Como resultado triunfou o hedonismo. O homem adulto infantilizou-se, cada vez menos preparado para enfrentar a vida, o sofrimento e a morte, ao contrário dos bons velhos estóicos. A alma dos homens do Ocidente apequenou-se.

segunda-feira, setembro 28, 2020

A paz da Europa

A Europa não é um lugar perigoso, mas está rodeada de lugares perigosos.

 Nuno Rogeiro, “Leste Oeste”, SIC Notícias (27/09/2020)

*** 

Arménia, Azerbaijão, Turquia (áreas reivindicadas pelos curdos), Ucrânia (Leste), Síria, Líbano, Palestina, Líbia, entre outros. Lugares perigosos, nada recomendáveis.

 

É também bom lembrar que a Europa já foi um lugar perigoso, muito mais perigoso do que os actuais lugares perigosos que a rodeiam.  E já o foi muitas vezes. E poderá voltar a sê-lo. A paz na Europa hoje está bem cotada, o que não significa que seja uma garantia para todo o sempre.

 

A atual paz da Europa Ocidental é uma anomalia histórica. É bom não o esquecer.

domingo, setembro 27, 2020

Livro Lido: O Mundo às Avessas, O Manicómio Contemporâneo

 João Maurício Brás, O Mundo às Avessas, O Manicómio Contemporâneo, Opera Omnia, 2018


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O livro ilustra bem a decadência em que estão a cair os cursos de Ciências Socias e Humanas, contaminados e parasitados, cada vez mais, pelos novos dogmas da pós-modernidade, que de ciência nada têm. As ciências sociais não foram capazes de lidar com os seus falhanços, ou hipóteses não confirmadas pela experiência, a horrível e trágica experiência do século XX. Em vez de criarem novas hipóteses e abandonarem velhas premissas, tal como o fazem as ciências naturais, tecnológicas e exactas – para se chegar a uma teoria, em ciência, muitas hipóteses são testadas e a maioria acaba por não se confirmar, mas daí retiram-se aprendizagens e conclusões que ajudam a encontrar o caminho – as ciências sociais lançaram fora a água do banho com o bebé lá dentro. Um sociólogo, um antropólogo ou um geógrafo humano do final do século XIX e início do século XX, se agora fosse confrontado com os programas e as ideias dos atuais cursos dessas ciências, não as reconheceria, nem se reconheceria nelas. Pelo menos parece ser para aí que as coisas se encaminham, se não atalharem rapidamente caminho e inverterem o rumo. As Ciências Sociais renegam agora os seus cânones e os seus clássicos, e desenraízam-se.

 

Estamos então perante um maravilhoso mundo novo nada recomendável, totalitário e delirante no campo das ideias, no que concerne às Ciências Sociais e Humanas, na academia.

 

Se a Universidade hoje ainda se salva, é pelas Ciências Naturais e Exactas (Física, Química, Biologia, Geofísica, Matemática, etc.) pela Arquitectura e pela Medicina. As Ciências Sociais encontram-se enredadas numa crise sem tamanho – uma crise de identidade.


***

Alguns sublinhados do livro:

 

Os departamentos universitários de Ciências Sociais e Humanas atravessam tempos complicados. Se em muitas das áreas já não encontramos conhecimento mas ideologia, a sua influência tem peso, ainda que de modo difuso. O seu prestígio científico desapareceu, mas fornecem caução intelectual a certas agendas políticas.

Estas áreas académicas estão transformadas em ciências da cultura e estudos críticos, estudos de género, estudos étnicos, pós-colonialistas e queers studies. Não podemos esquecer também os departamentos de arte e literatura, que oferecem e produzem trabalhos e teses totalmente incompreensíveis, onde tudo e o seu contrário é possível. (…)

Pág. 156

O drama profundo dessas áreas académicas [estudos culturais, literários, na arte, no cinema, na moda, etc.]  é que, para além do palavreado hermético e gongórico, lhes subjaz uma orientação política e ideológica intransigente, histérica e totalitária, mas influente.

Pág. 160

 

***

 

Bem-vindo, portanto, ao mundo novo, que nada tem de admirável.

Bem-vindo ao manicómio contemporâneo que se vai instalando na ala das Ciências Sociais da academia.

sábado, setembro 26, 2020

O privilégio da classe ociosa

 Só  uma vida de luxo pode dar extrema atenção ao desnecessário.

Gonçalo M. Tavares

sexta-feira, setembro 25, 2020

A geração mais bem preparada de sempre

Analisar o que se passa nos comportamentos dos mais jovens dá-nos a medida do fracasso do presente. É uma geração de direitos que esqueceu os deveres, apta para as tecnologias e inapta para o resto, hiper-sensível, egoísta, que exige mas não dá. É a geração mais protegida de sempre e a mais assustada, que se quebra à mínima contrariedade, sempre conectada a terminais de informação e diversão, mas desligada do que importa e incapaz de distinguir o essencial do irrelevante.

Excesso de população, a miséria, a pobreza, as injustiças sociais (por exemplo 63 pessoas detêm mais riqueza que 50% da população mundial), guerras permanentes, precariedade dos recursos naturais, aumento das doenças mentais e problemas ecológicos são secundários e mero joguete político. São outros os temas principais da sociedade ocidental: os pelos nas axilas da filha da cantora Madonna, o novo estatuto jurídico dos animais como membros da família, homens grávidos, proibição de livros que fazem distinção entre raparigas e rapazes, negação das diferenças entre masculino e feminino, etc.

O ruído dos debates pós-modernos distrai-nos do essencial e potencia grandes negócios. No sistema capitalista democrático, a bandeira da emancipação foi transformada no principal veículo da publicidade e do consumo.

 

João Maurício Brás, O Mundo às Avessas: o Manicómio Contemporâneo, Opera Omnia, 2018, pág. 16.

 

***

Inversões: direitos sem deveres. O acessório tomou o lugar do essencial. O que era elevado rebaixou-se e o que era baixo, elevou-se. Inversão de valores, desorientação, alucinação, eis onde estamos. A educação já não é a paideia. O ensino empacota-se e vende-se, em particular na universidade. A universidade já não é a Universidade. É toda uma indústria.

 

Andamos distraídos como sonâmbulos, aos grandes movimentos do mundo. Entregues aos opiáceos da publicidade e do consumo e aos bufões das televisões – curiosamente cada canal tem o seu, saltaricando nos programas da manhã - enredados nas insignificâncias da espuma dos dias.

***

“É a geração mais protegida de sempre e a mais assustada, que se quebra à mínima contrariedade” diz João Brás. São a “geração mais bem preparada de sempre” refere uma campanha publicitária da SIC. Uma bajulação que esconde uma ironia.

 

É a geração mais mal preparada de sempre. Mas como em todas as gerações, a vida vai tratar dela, mais cedo ou mais tarde.


quinta-feira, setembro 24, 2020

Juliette Gréco

 

Juliette Gréco (1923-2020)


A minha humilde homenagem, antes que passe mais um dia.

Uma das melhores senão a melhor cantora francesa de sempre.

Até sempre.

domingo, setembro 20, 2020

Os lacaios do patronato aflito

 Não tardou muito e apareceram logo os sabujos e os lacaios do patronato aflito, nos jornais habituais, a opinar sobre a necessidade de se sair para a rua mesmo em tempo de pandemia, que a saúde de pouco valia face aos mais altos valores da economia. 

 

Ainda crocitam por aí.

Um riso crocitante

 O riso daquela mulher assemelhava-se ao crocitar de uma ave de carniça. Era um corvo que ria na praia um riso galhofeiro, boçal, à passagem de um barrigudo emproado que pelas narinas sorvia o ar fresco da tarde. Caminhava bamboleando-se pela beira do mar. Ao longe o horizonte do mundo, alheio e esquecido, amigo íntimo do mar profundo.

sexta-feira, setembro 18, 2020

O triunfo da boçalidade

As mentes não se conquistam pela força, mas pelo amor e pela elevação espiritual.

Baruch Espinosa, Ética, 1677

(citado em por Ann Druyan, Cosmos: Mundos Possíveis, Gradiva, 2020)


                                                                 ***

O grande filósofo Baruch Espinosa morreu novo. Tinha 44 anos. Polia lentes.

Reflicto na sua frase e constato que nos nossos tempos já não se aplica.  Se não, então como justificar a ascensão de Trump, de Bolsonaro ou de Duterte, assim como de outros ignorantes, aos lugares cimeiros da governação das respectivas nações? Como conquistaram eles as mentes dos homens? Com amor? Com elevação espiritual? Não me parece. Outros valores pesam mais hoje na conquista das mentes. Ou as mentes são outras. Mentes maleáveis e empobrecidas pela deseducação metralhada dos mass media, do marketing e da propaganda. Mentes acríticas, incapazes de formular uma sábia avaliação. Mentes que votam sem saber distinguir a forma do conteúdo. Mentes que formam maiorias eleitorais expressivas.

O amor e a elevação espiritual perderam valor nos nossos dias. Parecem já não contar na batalha pelas mentes. A boçalidade triunfa.


terça-feira, setembro 15, 2020

The West is the Best


Basta ver como até na academia, particularmente nas ciências sociais e humanas, o conhecimento é ativismo e ignorância. Os estudos culturais, de género, pós-colonialismos, literaturas disto e daquilo, estudos críticos e mesmo algumas derivas mais loucas e disparatadas que tanto podem ser estudos homossexuais, guionismo pós-pornografias, seminários de masturbação feminina como promoção da diversidade, os mais de cem géneros, as monomanias libertistas, a afro-matemática, as denúncias sobre geografia machista, seriam apenas hilariantes, se não fossem levadas a sério.
(…)
A visão do mundo ocidental e as suas políticas dominantes apresentam-se como forma hipermoderna de tirania. Afinal esta é a melhor civilização de sempre, tão boa que não tem alternativa, o seu absolutismo sinuoso é incontestado.

João Maurício Brás, 
Os Democratas que Destruíram a Democracia, 2019, Opera Omnia, pág. 12.


***

Estamos cada vez mais tomados por uma visão dualista, entre opressores e oprimidos, como se a realidade não fosse ela mais complexa. Como se os que agora se vitimizam, ou os que dizem ser os oprimidos da história, também eles (muitos deles, nem todos) não tivessem feito parte do jogo. E como se o jogo não fosse ele mais complexo, muito para além de uma análise dual entre dominadores e dominados.

A civilização ocidental é a melhor de todas. Ainda é, e provavelmente será. Legou-nos o melhor da filosofia, da ciência, da matemática, da música, do teatro, do cinema, da pintura, do desporto olímpico, etc., etc., etc. Mas há quem ande por aí, entre nós, na Academia, a tentar desvalorizá-la, ainda que seja emulada por todas as outras civilizações.

quinta-feira, setembro 10, 2020

Um prodígio

 


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Pela nossa Selecção.

terça-feira, setembro 08, 2020

Vicente Jorge Silva (1945-2020)


Gostava de ler as suas crónicas. Que descanse em paz.

quinta-feira, setembro 03, 2020

Contra o relativismo cultural e o construtivismo

 “O civilizado descobriu que a cultura ocidental afinal era obsoleta e má, racista, machista, sexista, homofóbica, patriarcal, heteronormativa e egofalocêntrica. (…) Descobrimos o fim da história, o fim do homem, o fim da metafísica, que a ciência é ideologia, que não há verdade, nem objetividade, nem realidade, que tudo é cultural, político e construção social” (pág. 10).
João Maurício Brás
Os Democratas que Destruíram a Democracia (Opera Omnia, 2019), p.10
citado por Carlos Fiolhais, aqui e aqui.

"Quando se descobriu que o faraó Ramsés II tinha morrido de tuberculose, [Bruno] Latour discordou, uma vez que o bacilo da tuberculose só foi descoberto por Koch em 1882. Antes dessa descoberta, não poderia existir a bactéria… Chama-se a isto “construtivismo”: as coisas não existem, têm de ser inventadas. Não há uma realidade, mas sim, e tão-só, construções mentais."
Carlhos Fiolhais
no Jornal i, aqui, referindo-se ao texto de João Maurício Brás, em que critica Latour.

Comentário de Carlos Ricardo Soares, um leitor do blogue De Rerum Natura:

"Há mil anos quem tinha um olho era rei.
Hoje, quem tem dois olhos nem sabe o que é um rei e um rei não sabe o que é um olho, embora tenha dois."
***
Assim é. Infelizmente as Ciências Sociais, na Academia, estão a enveredar pelo caminho do relativismo cultural e do construtivismo. Allan Bloom escreveu 1987 um longo ensaio sobre o declínio da cultura geral e de como a educação superior – as Humanidades e as Ciências Sociais – estava a defraudar a democracia e a empobrecer os espíritos. Denunciava então o relativismo cultural. Tinha razão. No seu livro mais recente, João Maurício Brás acusa os democratas de terem destruído a democracia. Não é por acaso. Os eleitores de grandes democracias como a brasileira e a norte americana elegeram ignorantes para os guiarem. Há algo de muito errado aqui.

domingo, agosto 30, 2020

Um poema de Fernando Grade


A correr atrás da carruagem
um eco de patas a percorrer a melancolia
de as rodas serem mais velozes
que ossos rasgados rente ao sabugo
- correndo na sombra da caleche
ou do coche, o cão avança pelo medo acima
e dentro colados às janelas
os dois namorados de cimento e brisa
vêem o bicho das estepes e dos fumos
animal trinado (o som é a melhor besta!)
a beijar o pó, o púbis da terra
e quando o cão corre uma solidão doméstica
uma minúscula pátria egoísta
penico sentado, um cerco de bosta seca
- os dois húmidos namorados
vão à língua de cada um – rangendo –
e tornam-se a própria sombra em crueldade.

E aonde foi o cão? A angústia de armas que
ladra é um tapete voador com alma de Sade.

Fernando Grade (1990)



in Fernando Grade, O Livro do Cão, Edições Mic, 1991.

Aristocracia e civilização


Ora um povo sem aristocracia não pode ser civilizado. A civilização, porém, não perdoa. Por isso esse povo civiliza-se com o que pode arranjar, que é o seu conjunto. E como o seu conjunto é individualmente nada, passa a ser tradicionalista e a imitar o estrangeiro, que são as duas maneiras de não ser nada.

Fernando Pessoa (1923)


sexta-feira, agosto 28, 2020

A carnificina americana

This American carnage stops right here and stops right now.

Presidente Donald Trump,
Discurso Inaugural da Presidência Americana, 20 de Janeiro de 2017. Daqui.



Entretanto, prossegue a carnificina americana. E continuará, dada a incapacidade e a falta de vontade dos sucessivos presidentes e da sociedade americana em extirparem da sua Constituição a Segunda Emenda que defende o direito de um indivíduo possuir armas de fogo. Resulta daqui que qualquer anormal pode possuir uma. Resulta daqui a carnificina americana. Qualquer proclamação anunciando o seu fim sem que a mesma contemple o fim dessa emenda, é pura hipocrisia demagógica.

Obama nada pôde contra a poderosa National Rifle Association e Trump é apoiado pela mesma.


https://home.nra.org/

quinta-feira, agosto 27, 2020

A marcha da guerra


Shostakovich, 1942
Não conhecia a 7ª Sinfonia de Shostakovich. Ouvi-a, enquanto pintava as paredes de um sótão infinito, no programa Véu Diáfano, na Antena 2, de Pedro Amaral. Apanhei o primeiro andamento em andamento, quando liguei um velho rádio e nele reconheci logo os sons de uma marcha bélica – a loucura da guerra estava ali. (Excelente programa! Excelente Antena 2! O que se aprende ali.) Vim pouco depois a saber que se tratava da 7ª Sinfonia de Shostakovich, composta em Leninegrado durante o cerco das tropas alemãs, como bem explica Pedro Amaral. Tenho ouvido o primeiro andamento desde então, e tem sido uma descoberta. A 7ª Sinfonia de Shostakovich, "Leninegrado", está cheia de referências sarcásticas, mordazes, irónicas e amargas, composições distorcidas de outros compositores muito apreciados pelos nazis e especificamente por Adolf Hitler. Pedro Amaral refere que nos sons de Shostakovich se encontra uma “citação” à opereta A Viúva Alegre, de Franz Lehar. Um sarcasmo de Shostakovich, pois a composição soa propositadamente distorcida. E não é que descubro também outros sarcasmos nesse primeiro andamento de Leninegrado: cerca do minuto dezanove,  no vídeo abaixo, Richard Wagner faz a sua aparição com o prelúdio dos Mestres Cantores de Nuremberga, também tocado de forma distorcida. Pedro Amaral não lhe faz referência, mas que Wagner está ali, está. A deformação dessas referências musicais por Shostakovich, a meu ver, é um efeito que pretende ilustrar a deformação do carácter do mal, no caso encarnado por Hitler e pelos líderes políticos nazis, que gostavam de mostrar o quanto apreciavam as obras "arianas" de Franz Lehar e de Richard Wagner, entre outras.  Talvez a música lhes soasse assim: deformada nas suas cabeças deformadas. A maldade e a loucura deformam. A marcha militar do primeiro andamento da 7ª Sinfonia de Shostakovich é uma marcha tomada pela loucura. A marcha da guerra.

Ouvir Shostakovich é um exercício intelectual.


terça-feira, agosto 25, 2020

O riso trocista do mundo


Aqui no Porto, esta noite, bandos de gaivotas cruzam os céus como nuvens de flechas lançadas por arqueiros. Trocistas e esganiçadas riem
o riso trocista do mundo.

Porto, 11 de Agosto de 2020

sábado, agosto 22, 2020

As recordações mais profundas não têm epitáfios


Quando nessa glacial noite de Inverno o Pequod enterrou as amuras vingativas nas frias e maliciosas vagas, fui descobrir Bulkington ao leme. Considerei com simpatia, admiração e temor o homem, que em pleno Inverno e apenas desembarcado de uma perigosa viagem de quatro anos, se alistava incansavelmente para outra tempestuosa aventura, como se a terra lhe queimasse os pés. As coisas mais maravilhosas são quase sempre aquelas de que não se faz menção: as recordações mais profundas não têm epitáfios.

Herman Melville, Moby Dick


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Referência

Herman Melville, Moby Dick (1º vol.), Relógio D’Água, p.139.

"Land Ho!"

Grandma loved a sailor, who sailed the frozen sea.
Grandpa was that whaler and he took me on his knee.
He said, "Son, I'm going crazy from livin' on the land.
Got to find my shipmates and walk in foreign sands."

This old man was graceful with silver in his smile.
He smoked a briar pipe and he walked four country miles,
Singing songs of shady sisters in old time liberty,
Songs of love and songs of death and songs to set men free.

I've got three ships and sixty men,
A course for ports unread.
I'll stand at mast, let north winds blow, till half of us are dead

Land Ho!


                                                                                                   Jim Morrison (1970)



A avó amou um marinheiro
Que nos mares gelados navegou.
O avô era esse baleeiro,
Que nos joelhos me sentou.

Dizia-me: “Filho, dou comigo em doido,
por viver em terra,
Temos de encontrar os meus camaradas
E caminhar por areias estrangeiras”.

Era um velho gracioso,
Com prata no seu sorriso,
Fumava um cachimbo de urze e
Caminhámos quatro milhas,
Cantando canções de mulheres da vida
E da antiga liberdade,
Canções de amor e canções de morte
E canções para libertar os homens.

Eu tenho três barcos e sessenta homens
Um rumo para portos por encontrar.
Ficarei junto ao mastro,
que soprem os ventos do norte,
Até dizimarem metade dos homens.


Terra!

                                                                                          Jim Morrison (1970)

quarta-feira, agosto 19, 2020

Terraformar a Terra



É preciso terraformar a Terra. Está a transformar-se num planeta estranho, um planeta que não reconhecemos, alienígena e hostil à vida. 

Entretanto arde o Pantanal.


terça-feira, agosto 18, 2020

Território


Os homens têm olhado para o deserto como uma terra estéril, terreno livre para quem o quiser atravessar; mas, efectivamente, cada colina, cada vale do deserto tinham alguém que era o seu dono reconhecido e que seria capaz de defender imediatamente o direito da sua família, do seu clã a esse deserto, contra as transgressões. Até mesmo os poços e as árvores tinham os seus donos, que permitiam às pessoas que usassem as segundas como madeira e bebessem livremente dos primeiros, tanto quanto necessitassem, mas que imediatamente reprimiriam quem tentasse tomar conta da sua propriedade e explorá-la a ela ou aos seus produtos com outros, para benefício particular.  

T.E.Lawrence, Os Sete Pilares da Sabedoria
Publicações Europa-América, 1989, pp. 85-86

Refugio-me no deserto, neste momento particular, mas nem o deserto, descubro, é um espaço de liberdade. A liberdade colide sempre com a propriedade. O território é um espaço apropriado pelo ser, humano ou não humano. O território, na verdade, faz parte do ser. É a nossa circunstância, um prolongamento do corpo ou um espaço sem o qual o corpo definha. Eu sou eu e a minha circunstância (Ortega y Gasset). O território faz parte dessa circunstância que me define.

segunda-feira, agosto 17, 2020

O futuro


O futuro é um caixão. Lamento informá-lo, mas será isso que o aguarda no fim da jornada. Entretanto goze o caminho. E não vale apena chorar ou clamar injustiça. É pessimismo? Os espanhóis dizem que um pessimista é um optimista esclarecido. Mas não há qualquer optimismo aqui. Os dias têm sido negros. Primavera negra, Verão cinzento. "There must be some kind of way out of here", Said the joker to the thief (*). Aguardemos o Outono e o Inverno, com a esperança no horizonte.
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(*) Bob Dylan, All Along the Watchtower, 1967.

domingo, agosto 16, 2020

Epitáfio de Bartolomeu Dias

     V

        EPITÁFIO DE BARTOLOMEU DIAS



Jaz aqui, na pequena praia extrema,

O Capitão do Fim. Dobrado o Assombro,

O mar é o mesmo: já ninguém o tema!

Atlas, mostra alto o mundo no seu ombro.


                                              Fernando Pessoa, Mensagem


s.d.

Allegory Salvator Mundi

























Leonardo da Vinci (?), Auto-retrato (?), Allegory Salvator Mundi

sábado, agosto 15, 2020

Festa do Avante, comunistas e anticomunistas


Não sou comunista. Nunca o fui. Não gostaria de viver num regime comunista como o de Cuba, da Venezuela, da Coreia do Norte ou da China. Mas não sou anticomunista. Os comunistas são uma espécie de anticorpos contra o fascismo. Os melhores anticorpos que uma sociedade pode ter. Anticorpos que se activam quando as sociedades caem nessa doença do fascismo.
O vírus fascista que se cuide quando numa sociedade existem anticorpos comunistas.

Foram os comunistas os primeiros que entraram em Berlim, em 1945, o centro nevrálgico do nazismo. Foram a melhor resistência na Itália, na França, na Jugoslávia e noutros lugares, contra os opressores fascistas e nazis. Desalojaram o ditador cubano, Fulgêncio Baptista, do poder. Derrotaram os agressores americanos no Vietname. Foram derrotados no Chile por Pinochet e sofreram na pele por isso. Também perderam quando enfrentaram Franco, na Guerra Civil de Espanha, mas lutaram. Em Portugal, contra o Estado Novo, foram os que mais combateram e estiveram entre os que mais sofreram por isso.

Colocá-los na mesma plataforma que os fascistas ou os nazis, diz mais acerca de quem o faz do que dos comunistas.

Muitas vozes que se ouviram, a mais de três meses da data marcada para a realização da Festa do Avante, criticando a sua realização em tempos de pandemia, mais do que vozes preocupadas com a difusão do vírus, eram vozes anticomunistas. O seu anticomunismo falava mais alto do que reais preocupações sanitárias que diziam ter. Vozes toldadas pela ideologia, pelo anticomunismo. Desonestidade intelectual é o seu nome. Não enfio esse barrete, nem o barrete de qualquer ideologia. As minhas balizas sou eu que as traço.

À aproximação da data de realização da Festa, e avaliando a situação pandémica, os comunistas começaram a tomar medidas preventivas e a travar. Já limitaram o número de pessoas a entrar no evento para um terço, mas não se ficaram por essa medida. Vamos ver como será a Festa do Avante. Tomo os comunistas portugueses, como sempre tomei, por pessoas responsáveis e dignas de respeito.


sexta-feira, agosto 14, 2020

Ainda cá estamos

 © AMCD 

Praia da Sereia, há pouco. Cabo Espichel ao fundo.

Vírus Trump















Kamala Harris, no primeiro discurso enquanto vice-presidente candidata dos EUA:

Aos 43:52

“Vejam só o que eles [Trump e Mike Pence] nos deixaram: mais de 16 milhões sem trabalho, milhões de crianças que não podem regressar à escola, uma crise de pobreza, de sem-abrigo, afectando principalmente negros, mestiços e nativos índios, uma crise de fome que atinge uma em cada cinco mães com crianças que sentem fome e, tragicamente, mais de 165 000 vidas que foram encurtadas, e muitos não puderam ter a oportunidade sequer de despedir-se dos seus entes queridos. E não tinha de ser desta forma.”

Kamala Harris (traduzido daqui)


Aos 46:17


“Tudo isto [a gestão desastrosa de Trump e Pence da crise pandémica] é a razão. É a razão pela qual um americano morre a cada 80 segundos de COVID-19. É por isso que um número incontável de negócios tiveram de fechar as suas portas. É por essa razão que há um completo caos acerca de quando e como se devem reabrir as nossas escolas. Pais e mães estão confusos, inseguros e zangados relativamente aos cuidados a ter com as suas crianças e a segurança dos seus miúdos na escola. Se ficarão em perigo se forem à escola ou se ficarão para trás se não forem. Trump é também a razão pela qual milhões de americanos estão agora desempregados. Herdou a mais longa expansão económica da história que vinha desde a presidência de Barack Obama e Joe Biden. E depois, como tudo o que herdou, tratou logo de a deitar ao chão. Por causa das falhas de liderança de Trump, a nossa economia alcançou um dos maiores recordes entre as nações mais industrializadas, com uma taxa de desemprego que triplicou. Isto é o que acontece quando se elege um tipo que não é apto para o trabalho que tem de desempenhar. O nosso país acaba em frangalhos, acontecendo o mesmo com a nossa [dos EUA] reputação em todo o mundo.”

Kamala Harris (traduzido daqui)

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A gestão desastrosa de Trump, a sua desvalorização da ameaça que representava o vírus quando o mesmo se anunciava, o seu desgoverno, foi outro vírus que atingiu a América. Trump é um vírus.

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Traduzido daqui:



quarta-feira, agosto 12, 2020

Kaputt


Curzio Malaparte (1944), Kaputt, Publicações Europa-América, 1979.

[Há uma edição deste ano da Cavalo de Ferro]

óóóó


Kaputt, onde o italiano Malaparte passeia impunemente a sua insolência (que faz passar por irreverência) sob o nariz dos nazis enquanto com eles janta. Teve de testemunhar o mal com os seus próprios olhos para aprender, da pior forma, o horror do nazismo e do fascismo, que antes abraçara. É nessa condição de “aliado” que lhe é conferido um livre trânsito que o leva a testemunhar os horrores na frente Leste: as perseguições, os fuzilamentos, a chacina dos judeus. Por toda a obra transparece o seu repúdio pela crueldade dos nazis, com a qual convive horrorizado, com a habilidade e a inteligência necessária para os ludibriar e sair dali vivo.

Tem, no entanto, um tique que manifesta ao longo do livro: associa muitas vezes o mal a um elemento feminino (chega a gracejar, dizendo que Hitler é uma mulher, ou que há um elemento feminino no "medo" e na crueldade dos alemães). Talvez não seja de forma consciente. É uma tendência com profundas raízes bíblicas e mitológicas: não foi Eva que convenceu Adão a morder a maçã? Não foi da caixa de Pandora que fugiram todos os males do mundo? Não era Medusa uma mulher? Ou Circe uma feiticeira? Será que Malaparte não se deu conta desta tendência para a diabolização do elemento feminino na sua história e na história da literatura?

O capitão Curzio Malaparte

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