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terça-feira, agosto 12, 2025

Imigração e assimilação: os ocidentais e os outros

 


«A política relacionada com a imigração não vai desaparecer em breve porque as migrações transcontinentais e intercontinentais voltaram a ser uma característica da sociedade europeia e os receios e preconceitos garantirão que continuarão a ser consideradas disruptivas e politicamente exploráveis. Nas décadas anteriores, os preconceitos contra os imigrantes polacos, italianos ou portugueses acabaram por desaparecer à medida que os seus filhos, que não se distinguem pela religião, nem pela língua, nem pela cor, se fundiram na paisagem social. Estas vantagens da invisibilidade cultural e física não estão ao dispor dos seus sucessores oriundos da Turquia, da África, da Índia ou das Antilhas. A Europa tem muito pouca tradição de assimilação efetiva - ou, alternativamente, de «multiculturalismo» - quando se trata de comunidades verdadeiramente estrangeiras. Estes imigrantes e os seus filhos engrossarão as fileiras dos «perdedores» na competição pelos reduzidos recursos da Europa Ocidental.»

Tony Judt (sublinhado nosso)

 

Tony Judt, “Europa: a Grande Ilusão” in Quando os Factos Mudam, Ensaios 1995-2010, Edições 70, pág. 49.

 

(Ensaio originalmente publicado no The New York Review of Books, em julho de 1996)

 

***

 

Actualmente, mais do que nunca, assistimos a uma dificuldade de assimilação de imigrantes oriundos do mundo não ocidental. Estes imigrantes não possuem as “vantagens da invisibilidade cultural e física” de que falava Tony Judt, em 1996. São mais facilmente visados. O estranho entre nós torna-se visível, com consequências significativas nas relações interpessoais e nas tendências da política das nações ocidentais, que possuem populações mais velhas, mais fechadas, mais temerosas e conservadoras.

quarta-feira, fevereiro 13, 2013

Estou a gostar de ler...


E de o cruzar com este aqui:


Dois pequenos grandes livros que nos ajudam a compreender a crise da Europa dos nossos dias. Tony Judt escreveu em 1996. O ensaio de Ulrich Beck é mais actual (2012). Entre os dois livros existem áreas de intersecção que apontam no mesmo sentido: o domínio da Europa pela Alemanha.

E a Europa que se prepare:

"A Europa e a sua juventude estão unidas na raiva por causa de uma política que salva bancos com quantidades de dinheiro inimagináveis, mas desperdiça o futuro da geração jovem."

Ulrich Beck (2012), A Europa Alemã, Edições 70. pp. 20 

"A crise, diz Gramsci, é o momento em que a velha ordem mundial morre e em que é necessário lutar por um mundo novo, contra resistências e contradições."

Ulrich Beck (2012), A Europa Alemã, Edições 70. pp. 26

A leitura continua.

Os velhos partidos prosseguem alheios à mudança que se adivinha e ao meio em rápida mutação que os envolve. Ainda jogam no tabuleiro da velha ordem. Continuam a actuar como se a sociedade que os enquadra tivesse os mesmos problemas, interesses e contradições de há dois ou mais anos atrás. Talvez quando acordarem, seja tarde demais*. 

Os velhos partidos já não dão resposta às aspirações da juventude, vítima das políticas que a conduziram até aqui. E "aqui" é o desemprego. A democracia representativa carece de democracia, está ferida, e não se dá conta. Os partidos do "arco da desgovernação" estão a cavar a sua própria sepultura e a da democracia também.

Entretanto, os políticos governantes, tudo fazem para que se "regresse aos mercados", não querendo reparar que dessa forma prosseguem a mesma lógica que nos lançou na dependência dos especuladores. E cada vez que "vão ao mercado", asseguram aos jovens um futuro ainda mais sombrio, de austeridade e dependência, um futuro sem futuro, um futuro colonizado, porque serão eles os convocados a pagar a dívida e os juros contraídos pela actual geração governante.

É por isso que é cada vez mais "necessário lutar por um mundo novo, contra resistências e contradições".
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(*) Como encarar, por exemplo, o ensimesmamento do PS, os seus conflitozinhos internos, enquanto o país se afunda na crise? Parecem actuar com a inconsciência daqueles que discutem a cor do bote salva-vidas a lançar ao mar, enquanto o navio se vai afundando.

Mas alguém pode esperar alguma coisa desta gente? Afinal não estão eles também entre os que nos conduziram até aqui? A esperança, se é que ainda há esperança, reside noutro lado. Tem de residir noutro lado.

domingo, dezembro 16, 2012

A elite cosmopolita e os intelectuais locais: o padrão “europeu”

Hoje em dia, em muitos aspectos, Bucareste pode parecer apenas parcial e vagamente europeia, mas precisamente por essa razão, e por causa das cada vez mais óbvias qualidades não-europeias da ruralidade romena remota, parte da sua intelligentsia, tal como a de Belgrado, sempre tentou associar-se ao Ocidente, em especial à França, como acto de desafio contra a natureza estranha do seu ambiente interno. O resultado tem sido, muitas vezes, o suscitar do hipernacionalismo entre outros intelectuais locais e afastar ainda mais a elite cosmopolita das massas populares. Também este é um padrão caracteristicamente «europeu».

Tony Judt, Uma Grande Ilusão? Um ensaio sobre a Europa. Edições 70. 2012 P. 65

Também nós tivemos os nossos estrangeirados - intelectuais cosmopolitas -, alguns repelidos pelo provincianismo local, outros, privilegiados, foram ver o mundo lá fora e regressaram, e tornaram-se tão ou mais provincianos que os ditos “provincianos”. Entre os repelidos temos Agostinho da Silva, José Saramago, Jorge de Sena, Eduardo Lourenço, etc. Foram rechaçados pelo nosso provincianismo e ficaram a olhar para nós, e por nós, lá de fora. Amavam e amam Portugal, mais do que os regressados. Destes, os que retornaram ao seio dos “indígenas” e que desprezam o país natal até às vísceras, nem vamos falar. E depois temos ainda os que sempre cá estiveram, os “provincianos” que sempre amaram o seu país e nem precisaram de ir mais além. Afinal sempre é possível ir a Índia e voltar, sem abandonar Portugal. Há quem considere estes verdadeiros patriotas, nacionalistas parolos…, mas sabemos que não é bem assim. 

sábado, dezembro 15, 2012

As fronteiras oscilantes da pobreza

         © AMCD

«Há, e sempre houve uma Europa rica e uma pobre, mas a fronteira que as divide tem mudado ao longo dos séculos. Ainda não há muito tempo, o litoral mediterrânico e o seu interior urbano, de Marselha até Istambul, contavam-se entre as regiões mais prósperas da Europa. Em contraste, as terras escandinavas foram pobres durante uma grande parte da sua história. Com algumas excepções notáveis, hoje é o contrário.»

Tony Judt, Uma Grande Ilusão? Um ensaio sobre a Europa. Edições 70. 2011. P. 62

***

Sempre estivemos no limite oscilante entre a pobreza e a riqueza. Mas, quase sempre, do lado da pobreza. Seja à escala europeia, aquela a que Tony Judt se refere, seja à escala mundial, a que Adriano Moreira se refere, na sua obra, Da Utopia à Fronteira da Pobreza. Já fomos os cafres da Europa, quando da Europa não éramos. Na verdade, estávamos no mundo ocupados, fora da Europa, e nos oceanos. Nela desembarcámos em 1986, após uma descolonização apressada (*). Por isso, muitas vezes dizemos que entrámos na Europa. E ao nela desembarcarmos, embarcámos numa utopia da qual vamos agora acordando. Afinal foi tudo um sonho.

Nós, os primeiros dos ocidentais a assomar às exóticas costas de África e aos distantes mares de Timor, retornámos acossados. Rapidamente voltámos à nossa prévia condição de cafres da Europa, mas agora pior, porque nela estamos, tendo perdido já essa liberdade de ser cafres livres onde bem quisermos. Mas nessa viagem, como em todas as viagens, também aprendemos algo. Talvez possamos ainda ensinar alguma coisa aos habitantes desta península da Ásia, que é a Europa, em particular, aos que por cá ficaram, ensimesmados, frios e calados como teutões.



(*) Afinal sempre estivemos numa espécie de jangada de pedra.

quinta-feira, janeiro 05, 2012

Tony Judt no ano da sua morte, acerca do neoliberalismo. Lê isto ó Gaspar.

“Hoje em dia, ainda se ouvem ecos atabalhoados da tentativa de reacender a Guerra Fria em torno de uma cruzada contra o «islamo-fascismo». Mas o verdadeiro cativeiro mental dos nossos tempos está alhures. A nossa fé contemporânea no «mercado» segue nos mesmíssimos trilhos da sua sósia radical oitocentista – a crença cega na necessidade, no progresso e na História. Tal como o infeliz chanceler trabalhista britânico entre 1929-1931, Philip Snowden, desistiu perante a Depressão e declarou que não valia a pena contrariar as leis inelutáveis do capitalismo, assim os dirigentes da Europa de hoje se refugiam à pressa em medidas de austeridade orçamental para acalmar «os mercados».
Mas o «mercado» - tal como o «materialismo dialéctico» - é apenas uma abstracção: simultaneamente ultra-racional (a sua argumentação supera tudo) e o apogeu do absurdo (não pode ser questionado). Tem os seus verdadeiros crentes – pensadores medíocres quando comparados com os pais fundadores, mas ainda assim influentes; os seus compagnons de route – que em privado podem duvidar dos princípios do dogma, mas não vêem alternativa a pregá-lo; e as suas vítimas muitas das quais nos EUA, em especial, engoliram pressurosamente o seu comprimido e proclamam aos quatro ventos as virtudes de uma doutrina cujos benefícios nunca verão.
Acima de tudo, a servidão em que uma ideologia mantém a sua gente mede-se melhor pela sua incapacidade colectiva para imaginar alternativas. Sabemos muito bem que a fé ilimitada nos mercados desregulados mata: a aplicação estrita do que até há pouco tempo, em países em desenvolvimento vulneráveis, se chama o «consenso de Washington» - que punha a tónica numa política fiscal rigorosa, privatizações, tarifas baixas e desregulamentação – destruiu milhões de meios de subsistência. Entretanto, os «termos comerciais» rígidos em que estes remédios são disponibilizados reduziram drasticamente a esperança de vida em muitos locais. Mas na expressão letal de Margaret Thatcher, «não há alternativa».

Toni Judt, O Chalet da Memória, Edições 70. 2011.Páginas 180-181.
(os sublinhados são nossos)
***

Onde estão os verdadeiros sociais-democratas como Tony Judt? É certo que um dia, quando o dogma neoliberal for desacreditado (ou derrubado) pelos resultados de pesadelo a que nos irá conduzir, muitos dos nosso falsos “sociais-democratas”, esses do intitulado “Partido Social Democrata”, irão aparecer aos magotes, batendo com a mão no peito, afirmando a alta voz que sempre foram verdadeiros sociais-democratas, renegando o neoliberalismo – essa teologia do “mercado” que agora apregoam. Hoje, nas fileiras desse partido, verdadeiros sociais-democratas é coisa que não encontramos: todos se converteram ao dogma que não acredita em alternativas; todos se submeteram, inclusive os nossos auto-intitulados “socialistas” que, tal como o Dr. Jekyll and Mr. Hyde, fazem uma coisa quando estão no Governo e defendem outra quando na Oposição.

quarta-feira, dezembro 29, 2010

O último tratado de Tony Judt (1948-2010)

Como cidadãos de uma sociedade livre, temos o dever de olhar o mundo criticamente.

Toni Judt, Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, Edições 70, 2010, p. 219

Um pequeno livro. Um portento!

Obrigado Tony Judt.

Que descanse em paz.

terça-feira, dezembro 28, 2010

Não tenham medo!

«Começámos uma época de medo. A insegurança voltou a ser um ingrediente activo da política nas democracias ocidentais. Insegurança gerada pelo terrorismo, é claro; mas também, e mais insidiosamente, medo do ritmo incontrolável da mudança, medo de perder o emprego, medo de perder terreno para os outros numa redistribuição de recursos cada vez mais desigual, medo de perder o controlo das circunstâncias e rotinas da nossa vida diária. E talvez, sobretudo, medo de que talvez não sejamos só nós que já não conseguimos moldar as nossas vidas, mas que também que quem manda tenha perdido o controlo, para forças fora do seu alcance.»

Toni Judt, Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, Edições 70, 2010, p. 203

Ao ler este trecho do excelente texto de Tony Judt, escrito no ano da sua morte, lembrei-me das palavras de João Paulo II, no discurso inaugural do seu pontificado: “Não tenham medo!”. Actual, portanto. Se nos querem amedrontar, sejamos bravos e corajosos. Oponhamos a coragem ao medo. Agora, mais do que nunca.

Coragem contra a repressão. Coragem contra a opressão. Coragem contra a reacção, agora mais forte do que nunca. Coragem contra a supressão do debate democrático. Coragem contra esta política do medo. Coragem para questionar este caminho único que nos querem impor. Coragem para viver.

segunda-feira, dezembro 27, 2010

Com que então não há alternativa*?!

«A dinâmica inelutável da competição e integração económica global tornou-se a ilusão da nossa era. Como Margaret Thatcher uma vez explicou: Não Há Alternativa(p. 182).

«Mas tal como as instituições intermédias da sociedade – partidos políticos, sindicatos e leis – dificultavam os poderes de reis e tiranos, também o próprio Estado democrático pode agora ser a principal ‘instituição intermédia’: situada entre os cidadãos impotentes e inseguros e companhias ou agências internacionais insensíveis e inimputáveis. E o Estado – ou pelo menos o Estado democrático – conserva uma legitimidade única aos olhos dos seus cidadãos. Só ele responde perante estes, e estes perante ele.» (p. 184)

Tony Judt, Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, Edições 70, 2010

Em democracia há sempre alternativa! E os governos têm duas: ou se colocam ao lado “dos cidadãos impotentes e inseguros” ou passam a servir as “companhias e agências internacionais insensíveis e inimputáveis”, ou por outras palavras, passam a servir os “mercados financeiros ” não democráticos. Se escolherem este segundo caminho, como parece que está a acontecer, então os cidadãos serão obrigados, mais tarde ou mais cedo, a encostar os governos à parede.

É claro que são duas alternativas polares, e os governos podem ainda escolher uma intermédia, mas toda a alternativa que se afaste da defesa dos direitos dos cidadãos e aponte para o desmantelamento do Estado-providência, é uma alternativa que se afasta da democracia.

domingo, dezembro 26, 2010

O progresso

«Foi uma proeza notável do Iluminismo unir categorias morais clássicas a uma visão secularizada do aperfeiçoamento humano: numa sociedade bem ordenada, os homens não se limitariam a viver bem, mas lutariam por viver melhor do que no passado. A ideia de progresso entrou no vocabulário ético e dominou-o durante grande parte dos dois séculos seguintes. Ainda hoje nos chegam ecos desse optimismo inocente, quando os Americanos falam entusiasticamente de 'reinventar-se'. Mas à excepção das ciências naturais, será que o progresso ainda é um relato credível do mundo que habitamos?»

Tony Judt, Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, Edições 70, 2010, pág. 173-174.

Se o progresso é a bomba atómica, então estamos falados quanto ao progresso.

E não me falem mais em progresso! Seus babuínos!

segunda-feira, agosto 09, 2010

Tony Judt: nem neoliberalismo, nem marxismo


Partiu o historiador que não acreditava nem no neoliberalismo nem no marxismo. Mas acreditava na democracia e no Estado social.

«Os que festejam o triunfo do mercado e o recuo do Estado, e que gostariam de nos fazer celebrar o alcance sem regras da iniciativa económica no mundo «plano» contemporâneo, esqueceram-se do que sucedeu da última vez que aqui passámos.
(...)
Quanto aos que sonham voltar a exibir a cassete marxista, remasterizada digitalmente e limpa de irritantes ruídos comunistas, fariam bem em perguntar-se, mais cedo do que tarde, o que é que se passa com os «sistemas» de pensamento totalmente abrangentes que conduzem inexoravelmente a «sistemas» de poder totalmente abrangentes.»

Tony Judt, O Século XX Esquecido, Lugares e Memórias, Edições 70, pág. 153

domingo, julho 19, 2009

Memória Esquecida

«O que é significativo na época de transformação actual é a singular despreocupação com que abandonámos não só as prácticas do passado - isso é bastante normal, e não tão alarmante - mas a sua própria memória. Um mundo que mal acabámos de perder já está meio esquecido.» (pág. 17)

(...)

«Em muitos países, "pôr o passado para trás" - ou seja, concordar em superar ou esquecer (ou negar) uma memória recente de extermínio mútuo e violência intercomunitária - foi um objectivo primordial dos governos do pós-guerra: às vezes conseguido, às vezes demasiado conseguido.» (pág. 18)

(...)

«Mas mesmo na Europa uma nova geração de cidadãos e políticos está cada vez mais esquecida da história: ironicamente, é o que acontece em especial nos países ex-comunistas da Europa Central, onde "construir o capitalismo" e "tornar-se rico" são as novas metas colectivas, enquanto a democracia é tida por garantida e até encarada em alguns quadrantes como um estorvo.» (pág. 31)

Tony Judt, O Século XX Esquecido - Lugares e Memórias, Edições 70

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