«Há, e sempre houve uma Europa rica e uma pobre, mas a fronteira que as
divide tem mudado ao longo dos séculos. Ainda não há muito tempo, o litoral
mediterrânico e o seu interior urbano, de Marselha até Istambul, contavam-se
entre as regiões mais prósperas da Europa. Em contraste, as terras escandinavas
foram pobres durante uma grande parte da sua história. Com algumas excepções
notáveis, hoje é o contrário.»
Tony Judt, Uma Grande Ilusão? Um ensaio sobre a Europa.
Edições 70. 2011. P. 62
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Sempre estivemos no limite
oscilante entre a pobreza e a riqueza. Mas, quase sempre, do lado da pobreza.
Seja à escala europeia, aquela a que Tony Judt se refere, seja à escala mundial,
a que Adriano Moreira se refere, na sua obra, Da Utopia à Fronteira da Pobreza. Já fomos os cafres da Europa, quando da Europa não éramos. Na verdade, estávamos
no mundo ocupados, fora da Europa, e nos oceanos. Nela desembarcámos em 1986,
após uma descolonização apressada (*).
Por isso, muitas vezes dizemos que entrámos na Europa. E ao nela desembarcarmos,
embarcámos numa utopia da qual vamos agora acordando. Afinal foi tudo um sonho.
Nós, os primeiros dos ocidentais a
assomar às exóticas costas de África e aos distantes mares de Timor, retornámos
acossados. Rapidamente voltámos à nossa prévia condição de cafres da Europa, mas agora pior, porque nela estamos, tendo
perdido já essa liberdade de ser cafres
livres onde bem quisermos. Mas nessa
viagem, como em todas as viagens, também aprendemos algo. Talvez possamos ainda
ensinar alguma coisa aos habitantes desta península da Ásia, que é a Europa, em
particular, aos que por cá ficaram, ensimesmados, frios e calados como teutões.
(*) Afinal
sempre estivemos numa espécie de jangada de pedra.