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segunda-feira, maio 09, 2022

O trauma da Primeira Guerra, da Segunda e da Terceira

Ninguém foi para a Segunda Guerra Mundial a cantar, nem mesmo os alemães.

Eric Hobsbawn

A Era dos Extremos, Editorial Presença, 3ª ed., 2002, p. 155.

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Cantavam enquanto marchavam para a guerra, os soldados da Primeira Guerra. Alegremente marchando para o matadouro. Isto no início, quando ignoravam a lama e a metralha, o gás e o arame farpado.

Para a Segunda Guerra marcharam em silêncio, temerosos e soturnos, com a memória da Primeira nos encéfalos.

Para a Terceira Guerra, como marcharão? Com lágrimas? Alguém marchará? Ou antes da bota cardada bater no chão, o chão marchará e os corpos arderão como tochas? Não, para a Terceira Guerra ninguém marchará. Só os loucos.

E no entanto, hoje é dia de marchas e de memória em Moscovo. Comemoram, mas não parecem estar a fazer um correcto uso da memória. 
Se não, não marchariam como marcham, carreando os monstros nucleares da Terceira Guerra pela trela. Não. Nem agiriam como agem. Nem gritariam como gritam: hurrá! hurrá! hurráaaaaaaaaaaaaaa!


segunda-feira, outubro 29, 2012

As nomenklaturas

«The story of how political institutions developed cannot be told without understanding the complementary process of political decay. Human institutions are “sticky”; that is, they persist over time and are changed only with great difficulty. Institutions that are created to meet one set of conditions often survive even when those conditions change or disappear, and the failure to adapt appropriately entails political decay. This applies to modern liberal democracies encompassing the state, rule of law, and accountability as much as to older political systems. For there is no guarantee that any given democracy will continue to deliver what it promises to its citizens, and thus no guarantee that it will remain legitimate in their eyes.»

Francis Fukuyama, The origins of political order: from prehuman times to the French Revolution, Farrar, Straus and Giroux, 2011, p. 30.

«Still, let us not disarm, even in unsatisfactory times. Social injustice still needs to be denounced and fought. The world will not get better on its own. »

Eric Hobsbawm, Interesting times: a twentieth-century life, The Penguin Press, 2002, p. 489.

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Vivemos tempos de decadência política. O cheiro a pólvora já começa a invadir o ar. Sabemos que as instituições humanas tendem para a inércia, em particular as políticas, com os seus acomodados, as suas nomenklaturas, os seus apaniguados, tentando manter a todo o custo o status quo e a manter-se a si mesmos - que o digam os velhos deputados que se sentavam nos cadeirões do politburo. Quando tudo aquilo ruiu o tecto caiu-lhes em cima, para sua surpresa. A nomenklatura tenta a todo o custo manter o status quo, nem que seja iludindo enquanto pode a realidade, tentando em última instância, mudar tudo para que tudo fique na mesma, como dizia o Lampedusa. Mas não nos deixemos iludir. Nada voltará a ser como dantes e iludida andará a nomenklatura se pensa que tudo retornará. Terá o seu choque de realidade. E embora as instituições políticas, criadas para dar resposta a um conjunto de condições que já não existem mais, teimem em resistir, acabarão por entrar em ruptura no limite da decadência política. Enquanto as nomenklaturas persistirem neste impasse de auto-preservação ante uma realidade na qual já não encaixam, adiam apenas mais um pouco a inevitabilidade e o curso da história e da mudança, que já se fareja.

A mudança, lembra-nos Fukuyama, ocorre, mas só com grande dificuldade e sofrimento. Assim, se as nomenklaturas tentam entravar o curso da história, não nos surpreendamos. Resistem à mudança. Por isso lembramos as últimas palavras da biografia de Hobsbawm: "o mundo não se tornará melhor por si só". É nestes momentos que se impõe a acção dos homens e das mulheres que querem mudar o mundo para melhor, porque ele, por si só não mudará.

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Portugal é um país de nomenklaturas, não duvidemos. Há departamentos do Estado Central e nas Autarquias, por exemplo, onde ruminam famílias inteiras de instalados e de militantes partidários. É claro que assim é difícil mudar este estado de coisas. Todo o país está minado por este cancro e já cheio de metástases.

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É muito curioso ouvir agora da boca daquele que proclamou o fim da história e teceu loas às democracias liberais, a afirmação de que afinal, qualquer democracia liberal moderna já não pode garantir, nas actuais condições, aquilo que prometia aos seus cidadãos – e o grosso dos portugueses que o diga - e portanto já não oferece garantias de que permanecerá legítima aos olhos dos seus cidadãos. Se assim é, têm agora a palavra os cidadãos. É preciso trazer novamente legitimidade à democracia, pois não nos serve uma democracia ilegítima, que ao invés de responder aos anseios dos cidadãos, os castiga tiranamente e os priva do futuro. Os nossos governantes prestam contas aos poderosos do mundo financeiro e aos mercados e o grosso dos cidadãos fica para segundo plano. É isto uma democracia legítima?

terça-feira, outubro 02, 2012

Eric Hobsbawm

Eric Hobsbawm (1917-2012)

Outro Mestre que parte (partiu ontem). O da Era dos Extremos e doutras Eras que estudou e que nos deu a conhecer. Era o melhor historiador britânico da actualidade. Metia o Sr. Niall Ferguson no bolso. Marxista. Para Hobsbawm a Era dos Extremos teve origem em 1914 e cessou em 1991. O eclodir da Iª Guerra Mundial e o fim da URSS eram os marcos que limitavam o século XX de Hobsbawm. Quais cem anos?!

Neste blogue Hobsbawm já nos tinha servido de inspiração. AQUI.

Que descanse em paz.

terça-feira, junho 03, 2008

O desvanecimento da memória, mais uma vez

Por aqui têm desfilado personalidades de vulto, mestres, que nos avivam a memória para o facto de que vivemos actualmente um grande paradoxo: é exactamente no momento em que mais proliferam os suportes mediáticos da memória, que o passado, em particular o mais recente, “o passado público” da época em que vivemos, se obscurece na memória dos homens, principalmente, na dos homens jovens. Vivemos numa espécie de “presente contínuo”, à deriva, sem qualquer vinculação à experiência vivida pelas gerações passadas.

Senhoras e Senhores, Eric Hobsbaw:

A destruição do passado – ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam a nossa experiência pessoal à das gerações passadas – é um dos fenómenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem. Por isso os historiadores, cujo ofício é lembrar o que outros esquecem, tornam-se mais importantes que nunca no fim do segundo milénio. Porém, por esse mesmo motivo, eles têm de ser mais que simples cronistas, memorialistas e compiladores, embora essa seja também uma função necessária do historiador.

Hobsbawm, Eric, A Era dos Extremos, Editorial Presença, 1996, Pág. 15.

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