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sábado, agosto 06, 2022

Do não alinhamento marxista com os fundamentalismos pós-modernos

 «A ideia de cultura contemporânea pouco tem a ver com cultura. Esta ideia também veio camuflar um problema fundamental das sociedades humanas: o falhanço da redistribuição da riqueza e a relevância da vida digna.

Esqueçamos as desigualdades económicas, a questão da distribuição da riqueza, os trabalhadores, o povo, a luta de classes. Estas foram substituídas pelas questões do sexo, da raça, da orientação sexual e de qualquer ideia de eventual subalternidade.»

 

João Maurício Brás, Os Novos Bárbaros - A Moral de Supermercado, Opera Omnia, 2021, p. 223.

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Um marxista que se preze não prescinde da divisão da sociedade em classes. A luta de classes para ele é imorredoura e motivada por esse “problema fundamental das sociedades humanas”, problema também ele perene porque jamais haverá uma sociedade sem classes, sem pobres e sem ricos. Isso é um ideal, para não lhe chamar uma utopia. Haverá, por essa razão, sempre chão para a sua luta.

Um marxista que se preze não confunde o fundamental com o acessório. Não confunde a luta de classes com outras lutas, acessórias, fracturantes e rendidas ao capital. Para o marxista, no centro estará sempre o trabalhador e o valor do seu trabalho apropriado pelo capitalista, e nunca o consumidor. Daqui surge o grande desajustamento com a actual sociedade de consumo, em que o trabalhador, camuflado pela novilíngua em “colaborador”, é cada vez mais um consumidor e o capitalista um “empreendedor”.

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P.S. O marxismo cultural é uma contradição nos termos. 

sexta-feira, julho 22, 2022

Do insulto: a propósito de perguntas insultuosas

 Sentir-se ofendido e vítima continua a ser uma estratégia bastante rentável perante quem nos confronta.

João Maurício Brás, Os Novos Bárbaros, Opera Omnia, 2021, p.22

 

Se alguém ou alguma coisa nos ofende – isto é, nos insulta de uma forma ou de outra – somos, sem dúvida, cúmplices do insulto. Porquê? Porque nos deixámos ofender pelo insulto.

Lou Marinoff, Mais Platão, Menos Prozac!, Editorial Presença, 2002, p. 59

 

Se quiserem, as pessoas encontram sempre um motivo para se ofenderem, mas, nesse caso, o problema é delas. O seu problema é que têm necessidade de sentirem que estão a ser ofendidas.

Lou Marinoff, Mais Platão, Menos Prozac!, Editorial Presença, 2002, p. 60

quinta-feira, julho 21, 2022

Livros lidos: O Atraso Português, Modo de Ser ou Modo de Estar

 

João Maurício Brás, O Atraso Português, Modo de Ser ou Modo de Estar, Guerra & Paz, 2022


µµµµµ


Um livro que todos os adultos portugueses, sejam jovens, maduros ou velhos (sim, há jovens que são adultos e adultos que são jovens, embora a infantilização dos adultos prolifere nos nossos tempos, na civilização ocidental: adultos infantilizados, para não dizer imbecilizados, é, aliás, coisa que não falta) deviam ler para saberem em que país estão metidos, em que povo estão metidos e por que pensam como pensam. E por isso mesmo, um livro que os responsáveis (e irresponsáveis) políticos deviam ler, os que nos governam e os que nos desgovernam.

Desde a Causa das Coisas (um o melhor livro de Miguel Esteves Cardoso) que não liamos com tanto gosto um livro sobre o nosso país e sobre nós, os portugueses, embora Miguel Esteves Cardoso tenha optado pelo humor para nos retratar. João Maurício Brás segue outros caminhos, da Filosofia à História, passando pela Política, Economia, Sociologia, Literatura, e por aí fora, apoiando-se em autores gigantes (entre os quais, os nossos gigantes), com destaque para Antero de Quental. E a sua escrita é clara e acessível ao comum dos mortais.

Um livro que responde à questão: por que temos a mentalidade que temos? Porque é uma questão mental, aquela que temos connosco mesmos. João Maurício Brás, descansa-nos logo à partida: o atraso português não é ôntico, é estrutural, é mental (mentalidade herdada de séculos e ainda por nós alimentada, sem quase nos apercebermos). Estamos efectivamente presos a uma teia mental da qual é muito difícil libertar-nos, principalmente se não o reconhecermos. Difícil, mas não impossível. As mentalidades também mudam, mas demoram tempo a mudar.

Voltaremos a este livro.

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Do livro:

 

Não há um modo de ser português, identificado num antes, num agora e para sempre.

Brás, op. cit., pág. 80

 

O atraso como resultado de características ônticas que explicariam a identidade de alguns povos teve o seu tempo áureo.

Brás, op. cit., pág. 81

 

O destino de cada povo é, em muito, o que ele quer e consente que seja, a identidade de um país também é a ideia de futuro que dele se tem e o que cada um está disposto a fazer.

Brás, op. cit., pág. 16

A intransigência para com os políticos e os média, mas também para connosco, é outro passo incontornável para invertermos essa tendência de persistirmos em aprofundar a nossa miséria.

Brás, op. cit., pág. 16

sábado, novembro 09, 2019

Quem quer tramar a ADSE?


No primeiro dia da semana que agora acaba, Marques Mendes, na SIC, alertou para a má gestão da ADSE pelo Governo. Mais, deu a entender que se trata de uma gestão danosa - estranhamente danosa - quando se trata de um serviço que assegura os cuidados de saúde dos funcionários públicos – os utentes – que para ele contribuem e também para os outros, que não contribuindo por o seu rendimento ser inferior ao salário mínimo nacional, a ele têm direito. No total, segundo referiu, trata-se de um milhão e duzentos mil utentes. Acontece que os que não contribuem acabam por ser suportados pelos que contribuem, não colocando o Estado um único cêntimo para suportar esse encargo, quando é da sua responsabilidade fazê-lo. Segundo Marques Mendes, o Estado deve milhões à ADSE, não compensa a ausência de contribuições dos utentes isentos, e o Governo está a ignorar, há quatro anos, um estudo do Tribunal de Contas que aponta caminhos de viabilidade para a ADSE.

Hoje, no final da semana, o economista Daniel Bessa, na sua coluna do Expresso, volta a chamar a atenção para a situação insustentável da ADSE.

Ora parece que há algo de podre no reino da Dinamarca. É caso para perguntar: quem quer tramar a ADSE? O que tem o Governo Socialista contra a ADSE? Por que razão procede a uma gestão danosa?

domingo, julho 07, 2019

Para onde vai o dinheiro dos nossos impostos


A enorme dívida pública continua a subir em termos absolutos, tendo sido avolumada nos últimos anos, é preciso não esquecê-lo, pela integração da dívida de privados, bancos privados (BPN, BES, BANIF, etc.), “grandes demais para falirem”, que entretanto foram alvo de bailout, intervenção, nacionalização – chamem-lhe o que quiserem - pelo Estado.

Enquanto o dinheiro dos nossos impostos for principalmente destinado a pagar essa dívida, que não fomos nós que contraímos, da qual não somos nós, todos, responsáveis, o país não se desenvolverá.

Mais do que a Educação*, os Transportes, a Defesa, a Segurança e Ordem Pública… é a rubrica das Operações Relacionadas com a Dívida Pública que acolhe a maior proporção do dinheiro dos nossos impostos. Percebemos agora a degradação das escolas, dos transportes, das esquadras, das prisões, dos tribunais, e até dos hospitais, dos centros de saúde, das repartições públicas, dos quartéis, dos paióis, das universidades e das estradas? Percebemos agora por que razão muitos alunos aprendem em contentores, pré-fabricados improvisados, edifícios degradados e obras inacabadas cuja conclusão é eternamente adiada? Percebemos agora a degradação de tudo isso?

O que tem feito este governo para alterar esta situação? Pouco ou nada. A dívida pública continua a aumentar em termos absolutos. E se referem que diminui em relação ao PIB, é para criar uma ilusão, pois é o PIB que aumenta e não a dívida pública que diminui. Além disso, o PIB não aumentará para todo o sempre. E como será então, quando ele diminuir?

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(*) PS - O sector da Educação, claramente, estar a ser o sector sacrificado. Gasta-se mais com o serviço da dívida do que com Educação, atendendo ao destino do dinheiro dos nossos impostos. Apenas a Protecção Social e a Saúde recebem mais do que as Operações Relacionadas com a Dívida Pública.

terça-feira, abril 16, 2019

O projecto europeu e a questão da imigração


A questão da imigração, sabemos hoje, está a ser altamente desestabilizadora nas sociedades ocidentais. O resultado do referendo do Brexit, a eleição de Trump e a ascensão de movimentos de extrema-direita e de demagogos populistas, por exemplo, resultaram da incapacidade das democracias actuais em lidarem com esta questão e com os imigrantes económicos (que muitos teimam em não distinguir dos refugiados, colocando todos no mesmo saco). Esta questão está a gerar incerteza, insegurança e dissensões no projecto europeu. Seria assim bom que os partidos que se apresentam agora às eleições para o Parlamento Europeu clarificassem muito bem a sua posição em relação à imigração. Qual das três posições cada um assume: porta aberta (entram todos), porta fechada (ninguém entra) ou uma imigração regulada? Cada uma destas posições tem as suas consequências para o projecto europeu e para a democracia. A continuar como estamos, não nos admiremos se o projecto europeu continuar a abrir brechas aqui e ali até naufragar.

Para que fique claro, sou a favor de uma imigração controlada, e de um apoio humanitário e de emergência aos que suplicam por refúgio enquanto a guerra e as perseguições políticas persistirem nos seus países de origem (“não se deve recusar água a ninguém”).

Não votarei em partidos que defendam uma política migratória de porta aberta. Não votarei em partidos que se manifestem por uma política migratória de porta fechada. Não votarei em partidos que não deixem bem claro qual é a sua posição nesta questão.

E não embarcarei na cantilena daqueles que querem fazer destas eleições europeias um voto de confiança ou de desconfiança em relação ao governo vigente. Essas eleições são lá mais para a frente.

sábado, janeiro 12, 2019

O novo mantra político do ano


O novo mantra político do ano – vamos ouvi-lo muitas vezes, porque é preciso repeti-lo até à exaustão para que se inculque no comum dos mortais a necessidade de privatizar tudo: “O Estado falhou”.

Os privados nunca falham.

Onde estão aqueles que determinaram a privatização dos CTT, em 2014? O que terão agora a dizer às populações que residem em concelhos onde se anuncia o encerramento do único balcão de correios, passando para as juntas de freguesia – para o Estado, portanto – os serviços e funções que são atributo das estações de correio?

Ei-los aqui, rejubilando. 

Uns amigalhaços!

A lógica do lucro assim o determina, não é verdade?


Fantástico Mike!

Foto: daqui.

quarta-feira, setembro 05, 2018

Luminárias e alimárias

A propósito disto.


Entre luminárias e alimárias há certos deputados da República que encaixam que nem uma luva na segunda categoria. Parece ser o caso.

Quando vejo e oiço políticos deste jaez lembro-me sempre da advertência de John Tyler a Thomas Jefferson, em 1782, quando este queria renunciar ao cargo para o qual tinha sido eleito pelo povo do condado de Albemarle, de delegado na Câmara, por estar cansado de cargos públicos. Tyler advertiu Jefferson de que «homens bons e capazes fazem melhor em governar do que em deixar-se governar, uma vez que é possível, e na verdade altamente provável, que as pessoas capazes e boas que se retirem da sociedade sejam substituídas por outras venais e ignorantes». (Boorstin, 1997: 112)

Ora não tenho a mínima dúvida de que em Portugal muita gente boa e capaz se furta a cargos públicos, que não encara decerto como um dever cívico e não quer sujeitar-se àquilo. Só assim se explica a abundância de gente venal sentada nas cadeiras da Assembleia.

Dito isto, diga-se no entanto que na Venezuela se assiste a uma tragédia – a governação de Maduro e seus apaniguados. A boa gente daquele país já vota com os pés e parte em demanda de outras paragens. Fazem bem, pois se pegassem em armas seria um banho de sangue. Os ditadores, tudo fazem para se manter no poder, nem que seja à custa da vida dos seus concidadãos. Veja-se o que fez Assad na Síria. Na Venezuela só um golpe militar à 25 de Abril poderia resolver a situação trágica em que aquele Estado se encontra pois é muito improvável que Maduro se afaste, abrindo as portas à democracia.
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Referência

Daniel Boorstin, Os Americanos: A Experiência Colonial,  Gradiva, 1997.

sábado, setembro 02, 2017

Quando o Inverno chegar


Público, aqui, 1 de Setembro de 2017

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Continuamos a sacrificar o futuro pelo presente. Quem vier a seguir que pague a conta. E assim o capital vai fazendo a sua incursão nesse território que é o futuro (o capital precisa sempre de novos campos para alimentar a sua sede ilimitada de acumulação e por isso se expande no espaço e no tempo). Assim, no futuro não teremos nem território, nem soberania. Seremos escravos de credores. Outros governos terão pretextos para políticas austeras, medidas draconianas e aumentos colossais de impostos. Seremos novamente um protectorado sujeito aos ditames de funcionários de um império sem rosto. Outras troikas virão. Governar como hoje se governa, contraindo dívida, é fácil, pois o custo das decisões é sempre enviado para o futuro. É uma governação de cigarras. Depois não se queixem, quando o Inverno chegar.



quinta-feira, julho 06, 2017

Substancial, incidental e fatal

Como brincam com as palavras os políticos.

A coisa é muito grave, mas releva do campo do incidental, não do substancial. Há que distinguir as coisas e os nossos aliados sabem distingui-las, garante o ministro Augusto Santos Silva, ou seja, trata-se de um incidente muito grave, o dos paióis, mas não é substancial.

Contudo poderá vir a ser fatal. É aí que reside o problema.

quarta-feira, junho 07, 2017

Baixem lá essa bosta, pá!


Quereis um desígnio? Baixem-na! Baixem a dívida pública! Libertem as futuras gerações desse fardo. A dívida pública excessiva será uma amarra que não as deixará navegar.

É certo que cresceu com a crise económica após 2009, pela integração de dívida privada, do crédito mal-parado e dos bancos resgatados pelos contribuintes. Grandes (alguns na verdade eram pequenos e foram tratados como grandes) demais para falirem.

Mas não nos deixemos iludir pelos que se ufanam de tão bons tempos que vivemos (dizem eles), do reduzido défice (o menor de sempre, dizem), da redução do desemprego (é bom ouvir) e do incipiente crescimento económico que o país manifesta agora, em grande parte, devido ao turismo e às actividades no seu entorno. 

Gostaria de ouvir os políticos, lá do alto dos seus palanques, perorarem sobre a dívida pública com o mesmo entusiasmo com que discursam acerca da redução do défice e do crescimento económico. Mas não é lá muito conveniente, pois não?!

Enquanto uma dívida pública desta magnitude perdurar não estaremos seguros, nem nós, nem os nossos filhos, nem os nosso netos. Eles é que vão pagar. Teremos então gerações de escravos. 

quarta-feira, janeiro 27, 2016

Quando a normalidade democrática é uma anormalidade.

A arte da política, se for democrática, é a arte de desmontar os limites à liberdade dos cidadãos; mas é também a arte da autolimitação: a de libertar os indivíduos para capacitá-los a traçar, individual e coletivamente, seus próprios limites individuais e coletivos. Esta segunda característica foi praticamente perdida. Todos os limites estão fora dos limites.

(…)

Os poderes mais poderosos fluem ou flutuam e as decisões mais decisivas são tomadas num espaço distante da ágora ou mesmo fora do espaço público politicamente institucionalizado; para as instituições políticas do dia elas estão realmente fora dos limites e fora de controle.

Zygmunt Bauman, Em busca da Política, Zahar Editores, 2000, (na Introdução)

Lamenta-se Pacheco, no Abrupto, da perda da independência, da perda da soberania, da perda da democracia (não se lamenta, curiosamente, da perda da política). Parece ter tido um rebate, apercebendo-se, só agora, da nova realidade em que vivemos mergulhados e para a qual já alguns cientistas sociais, como Zygmunt Bauman, já nos tinham alertado. Os tempos são efectivamente novos. Os tempos são pós-democráticos e o poder já não mora aqui. Os portugueses, na sua generalidade, não se aperceberam ainda – continuam a votar no passado (ainda e sempre presos nos “labirintos da saudade”, quem sabe?). Foi assim nestas eleições presidenciais: o candidato vencedor tem raízes num Estado que de Novo, só o nome tem. É uma coisa de antanho, que nos tem acompanhado quase quotidianamente, na rádio e na TV.

Ontem Guterres acabou, sem querer, por emitir um paradoxo, ao desejar que "o país, agora que todos os actos eleitorais estão concluídos, entre em plena normalidade democrática." Mas, perguntamos nós, há algo mais normal numa democracia do que a ocorrência de eleições? Pelo contrário, actualmente o acto eleitoral parece ser o único momento de normalidade democrática nesta nova realidade pós-democrática e pós-política em que vivemos. Com efeito, a única situação em que a democracia se manifesta com toda a sua normalidade é durante os actos eleitorais. Depois das eleições, a dita “normalidade democrática” desaparece, pois como refere Bauman, os poderes decisórios encontram-se num “espaço distante da ágora ou mesmo fora do espaço público politicamente institucionalizado”, muito para além, portanto, do alcance dos eleitores e dos seus legítimos representantes.

Em suma, vivemos uma fachada democrática. O tempo da “normalidade democrática” a que Guterres se refere, é um faz de conta.

sábado, janeiro 02, 2016

O "pragmatismo"

No Conselho da Diáspora Portuguesa, Cavaco Silva sublinhou que o pragmatismo tem dominado as decisões dos governos da União Europeia face a uma realidade que se impõe às governações ideológicas. Na verdade trata-se de uma realidade que se impõe à própria democracia. O “pragmatismo” de que fala o presidente faz lembrar o do presidente Benes que, em 1938, para poupar o seu povo à guerra e ao sofrimento, foi forçado a ser pragmático ao ter de abrir as fronteiras da Checoslováquia à invasão dos nazis.

O “pragmatismo” de que fala Cavaco Silva é a única escolha que resta aos governos da União Europeia face ao poder avassalador dos mercados. E ai do governo que rejeite esse “pragmatismo”. Será forçado a ser "pragmático". Até os mais rebeldes, como o governo grego liderado por Tsipras, tiveram de atalhar caminho, aprendendo rapidamente a serem “pragmáticos”. Hoje a democracia na Europa está ferida. Às democracias europeias e aos povos da Europa resta apenas o “pragmatismo” da ideologia do mercado, o único caminho, a única via, a única alternativa. Outros poderes se erguem já, na determinação do destino dos povos, que não obedecem à sua livre escolha democrática. Poderes que alguns divinizam, mas que estão longe de ser divinos.

sexta-feira, novembro 27, 2015

Chegado o novo governo e…

Já se perfilam as corporações: sindicalistas e patrões, taxistas e empresários (pequenos, médios e grandes), banqueiros e bancários, professores e enfermeiros, juízes e guardas prisionais, polícia de segurança pública e forças armadas, médicos e maquinistas, proprietários e senhorios e etc., etc. etc., e assim sucessivamente. Eis o país onde tudo falta e tudo se pede, cada um de acordo com os seus interesses, cada um sem olhar às possibilidades. O país onde todos ganham mal, desde o trolha ao presidente (o mesmo o disse). Ingovernáveis estes lusitanos, já diziam os romanos.

Que Costa não caia no erro de querer dar tudo a todos. Guterres nisso deu-se mal. Tanto ouviu que partiu, para escapar ao pântano lodoso da governação em que se meteu.

Mas Costa abre já com um ar de festa: cria mais ministérios e secretarias de estado, que há muita gente a sentar. Bem podia ser como a Holanda, como insinua aqui o Rentes. Sempre seria mais comedido e precavido. Mas não. Tempos festivos estes.

Ao Costa e aos seus, votos de um bom trabalho. É difícil fazer pior do que o governo anterior. Que saiba dizer não e que prove que sabe governar, ao largo de todas as banca rotas e corporações.

sábado, novembro 14, 2015

A velha “solução” europeia para todos os problemas do mundo.

Despejar dinheiro em cima dos problemas. É o que a União Europeia faz quando se depara com problemas aparentemente insolúveis ou trabalhosos e de difícil resolução. Não faz, mas paga a quem faça. Assim inunda a Turquia com dinheiro para que contenha os refugiados. Inunda com dinheiro a Faixa de Gaza para a pacificar. E lança dinheiro sobre África para conter os incómodos migrantes lá na terra deles. Como se isso resolvesse o problema.


Na União Europeia as incompetências dos políticos e dos tecnocratas sempre se podem ocultar sob uma larga e opaca camada de dinheiro. Na União Europeia o dinheiro fala sempre mais alto.

Uma acordo, pois.

Uma coisa é uma coligação pós-eleitoral e pontual, outra é um acordo.

Uma coisa é um governo coligado PS/BE/CDU outra é um governo do PS com o apoio acordado da CDU e do BE. Os acordos, tal como nos casamentos, têm o seu estado de graça e os estados de graça na política são breves. Até o Syriza para governar na Grécia teve de se coligar com um partido fora da sua área política para que houvesse alguma legitimidade na governação.

Num acordo, a responsabilidade é menor do que seria caso os partidos se coligassem pontualmente para governar e existissem ministros ou secretários de estado de todos os partidos que o assinaram. É até estranho que a CDU e o Bloco não impusessem nas negociações a condição de participarem num governo, com ministros ou secretários de estado. Afinal todos os partidos têm como objectivo alcançar o governo do país.

CDU e BE dão assim razão àqueles que os remetem para as bancadas opositoras do hemiciclo, para todo o sempre. Os mesmos que dizem que o BE e a CDU não têm vocação de governo e que não são partidos do “arco da governação”.

quarta-feira, outubro 28, 2015

Sampaio da Nóvoa em entrevista

Num ápice Sampaio da Nóvoa arrumou a questão do espantalho comunista e extremista erguido por Cavaco Silva, logo a seguir às eleições e mais recentemente (o da saída da NATO, na Zona Euro, da União Europeia, do incumprimento dos compromissos internacionais, e dos dos tratados e do não pagamento da dívida externa, etc.). Cavaco deu o mote aos políticos do PSD e do CDS/PP para uma argumentação do tipo “cuidado vem aí o papão, tenham medo, muito medo”.

Disse Sampaio da Nóvoa em entrevista que os programas dos partidos não têm de ser confundidos com o programa de Governo. E deu o exemplo do Partido Popular Monárquico (PPM) que integrava a AD que governou Portugal, nos idos anos 80. Que se saiba a República não se converteu numa Monarquia só por o PPM ter integrado o governo da altura.

Caros senhores arrumem lá a viola no saco ou cantem outra canção, que esse argumento do espantalho comunista ou extremista não serve.

Entrevista AQUI

sexta-feira, outubro 23, 2015

Lamentável

Poderia ter-se limitado a indigitar o primeiro-ministro e fundamentar a sua decisão com base no primeiro argumento que enunciou: cumpria com uma tradição de 40 anos de Democracia e com a Constituição – a de convidar o líder do partido ou coligação mais votado, e que constitui o grupo de deputados mais numeroso (mas não em maioria), para formar governo. Essa decisão seria legítima. Aliás, não é aí que está a questão.

Cavaco Silva foi mais longe. Foi longe demais. Transformou a sua comunicação ao país numa espécie de "Conversas em Família", com muitas mensagens e prescrições. Contradizendo um dos princípios que disse mais valorizar – o da estabilidade. O paladino da estabilidade, afinal manifestou a intenção de lançar o país na instabilidade política ao dar a entender que iria manter um governo de gestão se uma moção de rejeição impedisse a constituição de um novo governo do PAF. 

Cavaco Silva, tem medo. Medo dos mercados, das agências de rating, dos credores, dos comunistas e do Bloco de Esquerda. Para ele o interesse nacional é o interesse dos mercados, das agências de rating, dos credores e da Comissão Europeia. Para ele o interesse nacional não é o interesse dos portugueses (como economista valoriza mais as questões económicas e financeiras em detrimento dos imperativos sociais).

Logo após as eleições teve um comportamento incendiário, desestabilizador e intelectualmente desonesto, lançando o medo, a incerteza e a insegurança, quando deu entender que um governo liderado por socialistas e com o apoio do Bloco de Esquerda e da CDU colocariam em perigo a presença de Portugal na NATO, na Zona Euro e na União Europeia. Além disso estaria em perigo o cumprimento das obrigações do País para com os credores e os mercados. Só faltou dizer que as criancinhas estariam em perigo porque os comunistas vinha aí para as comer. Como se ainda estivéssemos nos tempos da Guerra Fria ou no PREC. Um governo liderado por socialistas, sublinho. Como se um governo liderado por socialistas fosse um governo de comunistas ou de trotskistas. Enfim, confundiu e agitou. Deu o mote e os partidos do PAF aproveitaram logo para cantar a mesma ladainha e lançarem areia aos olhos dos portugueses. Como se o PS nunca tivesse governado o país. Lamentável.

Finalmente, e diga-se de passagem, uma solução de governo alternativa ao atual, com o PS, o Bloco de Esquerda e a CDU só seria estável se integrasse ministros dos três partidos. Ninguém puxa um tapete se estiver em cima do tapete. Caso contrário, se se constituísse governo apenas com ministros do PS, com base num acordo parlamentar que viabilizasse a sua formação, então a qualquer momento os partidos apoiantes desse governo, que não o PS, poderiam puxar o tapete, fazendo cair o governo que inicialmente apoiaram. Nessa circunstância o PS estaria sempre nas mãos desses partidos.

domingo, setembro 27, 2015

Quatro anos a furtar


Quatro anos a transformar direitos em mercadorias, em nome de uma doutrina política radical que conduz ao empobrecimento e à servidão a larga maioria da população. Foram quatro anos de uma certa revolução e os extremistas, os radicais, esses sim, estiveram no Governo.

Quatro anos de privatizações, de vendas ao desbarato das mais rentáveis empresas públicas, ou da sua parte rentável, em troca de uma receita qualquer, fugaz. Quatro anos de servilismo, de quem nos governou, perante o poder financeiro e estrangeiro, alemães e chineses.

Quatro anos a tratar-nos como se todos fossemos responsáveis pela gestão danosa de bancos privados. Como se todos fossemos responsáveis por igual, e em igual medida, pela situação a que isto chegou.

Quatro anos de buracos, para o contribuinte pagar e tapar. Buracos que não foram abertos por ele, o contribuinte. E ao fim de quatro anos, pasme-se, deixam-nos um buraco ainda maior, e uma dívida pública monumental para os nossos filhos pagarem. Foram quatro anos de cortes, e mais quatro anos de empobrecimento se avizinham. Não é preciso ser profeta para o adivinhar.

Quatro anos de vergastadas nos funcionários públicos, nos trabalhadores do sector privado, nos pensionistas, nos jovens, nos desempregados e nos pobres. Os jovens foram convidados a emigrar, na sexta nação mais velha do mundo. É obra!

Quatro anos de cortes salariais, de cortes nos feriados, nos dias de férias, nas prestações sociais, e em tudo, através de um IVA abusivo que atinge nalguns produtos necessários, quase um quarto do seu valor. 

Quatro anos a furtar.

Quatro anos a pontapear a Constituição e a apoquentar o Tribunal Constitucional e os portugueses (bom, diga-se de passagem, e em abono da verdade, que neste ano da Graça o primeiro-ministro disse que nada iria fazer quanto a propostas de duvidosa constitucionalidade, como aquelas a que nos habituou em anos precedentes. É ano de eleições, não é verdade?)

Lançaram e aumentaram a dívida sobre gerações futuras, sobre os ainda não nascidos. E findos estes quatro anos, não há família que não tenha um desempregado ou um emigrado ou um vizinho nessas condições. 

Nestes últimos quatro anos, gerações foram lançadas contra gerações, velhos contra novos, trabalhadores do sector privado contra trabalhadores do sector público, ricos contra pobres, e as desigualdades sociais não pararam de aumentar. Foi dividir para reinar, nestes quatro anos. Quatro anos a furtar.



Epílogo


Ouvi-os gritar na rua – gritos de descontentamento. Vi-os invadir as escadarias da Assembleia e arremessar paralelepípedos às barreiras policiais. Ouvi-os cantar o “Acordai!” frente ao Palácio de Belém e o “Grândola Vila Morena” no Parlamento e noutros lugares. Vi-os subir e descer largas avenidas e ruas estreitas em manifestação e também por lá caminhei e me manifestei. Vejo-os ainda, todos os dias, revoltados, manifestando-se frente a um banco assaltante – coisa que nunca vi na Grécia, nem com o Siryza, mesmo quando os bancos gregos estavam fechados.

Pois bem, é agora a hora! A hora de acordar. Porque se não for agora, nestas eleições… se voltarem a eleger os que lá estiveram, não me venham pedir outra vez para ir para a rua gritar ou cantar o “Acordai”. Não irei!

Farei como o Saramago. À primeira, retirar-me-ei para uma Lanzarote qualquer, para bem longe. Será o cada um por si e o salve-se quem puder. E, definitivamente, Portugal passará a ser um problema que terei comigo mesmo.

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