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sexta-feira, maio 08, 2020

Livro Lido: O Terceiro Chimpanzé, de Jared Diamond


Um excelente livro (óóóó).

Desfeita foi essa ideia do humanismo grego que proclama o homem como um ser prodigioso.

Foi Sófocles, na Antígona, que disse:

Muitos prodígios há; porém nenhum maior do que o homem.

Lido o livro, o prodigioso homem revela-se um exterminador, um genocida, um agressor contra o ambiente que o ampara, contra a terra-mãe que o gerou. Um horror!

O livro é muito bom, mas por vezes exaustivo, como por exemplo no capítulo 8, sobre a linguagem humana, tornando-se enfadonho nesse capítulo. Julgamos que o autor se deixou levar pela sua paixão pelas línguas.

Mas o livro ajuda-nos a perceber o momento que atravessamos e alerta-nos para os horrores que estamos a desencadear: um holocausto ambiental que terá repercussões na civilização humana e na vida do planeta que vão muito para além dos malefícios causados pelo coronavírus que agora nos aflige.

E, muito importante, refere Jared Diamond, na página 269:

Finalmente, a maioria das principais actuais doenças infecciosas e parasitas da humanidade não poderia ter-se estabelecido antes da transição para a agricultura. Estes assassinos persistem apenas em sociedades populosas, com má nutrição e sedentárias, constantemente reinfectadas pelos outros e pelos próprios esgotos. A bactéria da cólera, por exemplo, não sobrevive por muito tempo fora do corpo humano.
Jared Diamond, O Terceiro Chimpanzé, 1993, pág. 268.


A bactéria da cólera não sobrevive por muito tempo fora do corpo humano, tal como um vírus. E da mesma forma que o campo de cultura fértil ideal para a eclosão de fenómenos bacteriológicos e virológicos eram as sociedades populosas e poluídas da Era Agrícola, pré-industrial, também hoje continuam a ser as áreas mais densamente povoadas e poluídas como as cidades industriais do Oriente, da China, entre outras, porque também as há noutros países e continentes, as áreas de onde continuam a brotar esses assassinos microscópicos. Porém desse país mais populoso e densamente povoado, que é a China, em particular nas suas regiões orientais e meridionais, advirão outras ameaças, segundo o autor, que refere que a sua dimensão populacional e a sua economia asseguram que os problemas ambientais se transformarão em problemas para o resto do mundo também(Diamond, 1993 [posfácio à edição de 2006], pág. 515)

Será dessas regiões densamente povoadas e poluídas que advirão as maiores ameaças ambientais e microbiológicas para a Humanidade. Mas não haja ilusões – essas regiões não são ilhas e o que lá ocorre não é só da responsabilidade de quem lá vive. A globalização une-nos a todos, produtores e consumidores, seres humanos. Seremos todos responsáveis enquanto não se criarem instituições globais com capacidade para regulamentar e impor o respeito pelos direitos dos trabalhadores e garantir as suas condições de vida e o seu bem-estar, em todos os países do mundo.

terça-feira, julho 12, 2016

O arreigado empenho da Europa na desunião

A habitual unidade da China e a perpétua desunião da Europa têm ambas uma longa história. As áreas mais produtivas da China moderna foram politicamente unidas pela primeira vez em 221 a.C. e assim permaneceram pela maior parte do tempo desde então. A China teve um só sistema de escrita desde os inícios da literacia, uma única língua dominante por muito tempo e unidade cultural substancial durante dois mil anos. Pelo contrário, a Europa nunca esteve, nem de longe, perto da unificação política: ainda estava repartida por 1000 pequenos estados independentes no século XIV, em 500 estados em 1500 d.C., reduziu-se a um mínimo de 25 estados na década de 80 e, no momento em que escrevo esta frase, já é de novo constituída por cerca de 40. A Europa ainda tem 45 línguas, cada uma delas com o seu alfabeto modificado, e uma diversidade ainda maior. Os desacordos que ainda hoje continuam a frustrar até as mais modestas tentativas de unificação europeia através da Comunidade Económica Europeia (CEE) são sintomáticos do arreigado empenho da Europa na desunião.

Jared Diamond, Armas, Germes e Aço, Relógio d’Água Editores, 2002, página 447.
(destaques nossos)

E ainda hoje, em 2016, como se comprova pelo actual contexto político europeu, a Europa se empenha na desunião.

“União Europeia” soa, portanto, a ironia da história. Jamais resultará. É uma ideia peregrina. São utópicos os que defendem um aprofundamento da união política da Europa, uma comum federação. Afinal poderá um cão ser cavalo? Poderá uma Europa que sempre prosseguiu a desunião política – é essa a sua essência, desde que o Ocidente é Ocidente, desde o fim do Império Romano – converter-se em união política? Nada mais há de contranatura. Se algum dia a Europa se tornasse politicamente unida, então anular-se-ia enquanto tal. Deixaria de ser Europa para passar a ser outra coisa qualquer. Os que propugnam um aprofundamento político da União Europeia estão a opor-se a um movimento longo, com mais de um milénio. São Quixotes que investem contra moinhos de vento ou tentam parar o vento com as mãos.

Poderá haver união na diversidade? Paradoxalmente, essa parece ser a fórmula. Mas para isso, é preciso abandonar a ideia de uma união política da União Europeia, como se de um império sediado em Bruxelas se tratasse. Não há povo que o deseje, apenas os líderes de um eixo que ambiciona exercer a sua dominação sobre os demais.

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