segunda-feira, dezembro 31, 2007

Sobre 2008

O silêncio e a incerteza assolam os nossos dias. Fica em branco a página das previsões para 2008. Atravessamos uma era de crises a nível mundial e nacional, logo, uma era de mudança e de incertezas. O mundo atravessa várias crises: crise social, crise ecológica, crise e reestruturação dos Estados, crise do Welfare State, riscos associados à globalização, crise das democracias…Crise da Civilização Ocidental e da Humanidade…

Em Portugal temos crise na economia, na educação, na saúde, na segurança, e de forma estrutural, na justiça, o que significa que é a democracia que está em crise. O momento é portanto, de desencanto. Não sabemos onde vai desaguar este rio. Há quem lhe augure um triste fim. A decadência é propalada por velhos intelectuais, e opinion makers. Neles esse potente narcótico da esperança, já não produz qualquer efeito. Onde reside a esperança?

Uma sombra vai cobrindo o nosso país, lenta e inexoravelmente.

Os recursos financeiros ao dispor do Estado, cada vez mais mal geridos, tornam-se por essa via, cada vez mais escassos. São como um cobertor que se torna pequeno demais para tapar todas as necessidades do país. Assim os recursos são empregues prioritariamente na endividada capital, em particular no seu centro, onde residem o poder político e o poder económico, mas onde vivem cada vez menos pessoas. O resto do país é cada vez mais preterido, e o Interior, deixado ao abandono e aos velhos sem esperança.

Fala-se no crescimento económico enquanto desígnio, mas omite-se que pode haver crescimento económico com aumento do desemprego. Fala-se na criação de emprego enquanto desígnio, mas esquece-se a qualidade do emprego. Pode ser criado emprego, precário, ou seja, desemprego a prazo. Fala-se na qualificação dos portugueses, mas a preocupação é estatística. Qualifica-se sem preocupação com a qualidade. É preciso qualificar depressa…É preciso mostrar resultados. Foram exigidos resultados! Que resultados? Onde está o Desenvolvimento?

Como pretendemos reduzir o número de pobres que se avoluma? Como tencionamos reduzir o número de desempregados? Como vamos reduzir as desigualdades na distribuição da riqueza e as disparidades regionais?

O silêncio e a incerteza assolam os nossos dias. Fica em branco a página das previsões para 2008.

segunda-feira, dezembro 24, 2007

El Niño Dios

La adoración de los pastores - Murillo (Século XVII)



sábado, dezembro 15, 2007

Pedra no sapato

O Kosovo é a pedra no sapato da União Europeia. Impede-a de avançar. Não há solução à vista. É que neste caso, não é nada fácil tirar o sapato e lançar a pedra fora. Tal significaria que a União Europeia se teria autonomizado na sua política internacional face aos Estados Unidos da América. Mas a União Europeia não funciona, neste caso, como um bloco e as suas divisões intrínsecas enfraquecem-na. Além disso, a NATO funciona aqui como um colete de forças, prendendo-lhe os movimentos.

A incapacidade de resolver o problema do destino a dar ao Kosovo representa por isso, toda a fragilidade e impotência da União Europeia face aos EUA e à Rússia. Talvez esteja aqui o gérmen de uma nova Guerra Fria ou o simples acordar da velha, facto que tanto parece agradar à Rússia, ansiosa por assumir velhos protagonismos no mundo. Neste contexto, a União Europeia nem é tida nem achada. É humilhada.

É que para tirar o sapato, tem de pedir licença.

Quem diria?!

Aqui na Arcádia oiço notícias longínquas da nossa laboriosa cidade do Porto. É agora comparada com Chicago dos anos 20 do século XX, a dos tempos da Lei Seca, ou com Medellín, onde os senhores da droga são quem mais ordena e as vendettas se sucedem ao ritmo de rajadas de metralhadora e explosões dilacerantes. A amistosa população do Porto não merece tais comparações. Afinal, ao que chegámos?

É o que acontece quando a política vigente agrava a pobreza, as desigualdades e o desemprego.

O nosso país parece-se cada vez mais com um qualquer da América Latina (à excepção do Chile!). Somos cada vez mais "Terceiro Mundo". Era bom que não chegássemos a tal.

Aguardemos pela acção de quem nos governa e dirige. Com ou sem esperança.

domingo, novembro 25, 2007

Heraclito e o ensino

Disse Heraclito:

134. O ensino é outro sol para aqueles que o recebem.

Nota: fragmento 134 editado por DIELS e extraído da obra de Weil, Simon (1953) , A Fonte Grega, Estudos sobre o pensamento e o espírito da Grécia, Livros Cotovia, 2006, página 154.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Sócrates e o ensino no Estado democrático

Disse Sócrates na República de Platão:
Ainda há estes pequenos inconvenientes: num Estado assim [democrático], o professor teme e lisonjeia os discípulos, e estes têm os mestres em pouca conta; outro tanto com os preceptores. No conjunto, os jovens imitam os mais velhos, e competem com eles em palavras e acções; ao passo que os anciãos condescendem com os novos, enchem-se de vivacidade e espírito, a imitar os jovens, a fim de não parecerem aborrecidos e autoritários. (Platão, A República, pág. 394)

Mas o excesso de liberdade, meu amigo, que aparece num Estado desses, é quando os homens e mulheres comprados não são em nada menos livres que os compradores. (Platão, A República, pág. 394)

Substitua-se a expressão “homens e mulheres comprados” pelo termo “assalariados”, e “compradores” pelo termo “empregadores” e temos então a aplicação desta ideia aos dias de hoje.

No passado o pedagogo era o escravo que levava o aluno, o filho do nobre ou do aristocrata, ao Mestre. Actualmente os professores são cada vez mais pedagogos, e cada vez menos, mestres. E o Nobre nos tempos democráticos é o Povo, pois é ele quem mais ordena. O que significa que os professores tendem a ser cada vez mais, uma espécie de escravos do Povo. E o sistema de ensino vigente, onde os políticos, representantes populares, mais ordenam, é a estrutura que suporta esta tendência.

Quando os mestres são convertidos em escravos é a educação que se escraviza. E é por aqui que se perde a Liberdade.

Sócrates advertiu há cerca de 2500 anos atrás:

É que, na realidade, o excesso costuma ser correspondido por uma mudança radical, no sentido oposto… (Platão, A República, pág. 396)

E o oposto da liberdade é sem dúvida a escravatura.

Actualmente nas nossas sociedades, ditas Ocidentais, vivemos sem dúvida, tempos de excesso…

E Sócrates concluiu peremptoriamente:

A liberdade em excesso, portanto, não conduz a mais nada que não seja a escravatura em excesso, quer para o indivíduo quer para o Estado. (Platão, A República, pág. 396)

Infelizmente parece que caminhamos paulatinamente e imparavelmente, no sentido apontado por Sócrates. O processo está em marcha e a educação dos tempos democráticos, já definha.

Nota: as citações foram retiradas da obra de Platão, A República, Fundação Calouste Gulbenkian, 9ª Edição, pp. 394-396.

quarta-feira, novembro 21, 2007

Contra Horácio

Esquece o dia!

Esquece-o! Como se fosse apenas mais um dia numa longa existência.

Dias melhores virão.

Hoje tive um mau dia.

sábado, novembro 17, 2007

The God Delusion*

Dawkins, como qualquer ateu, crê "piamente" na inexistência de Deus. Um crente, qualquer crente, crê piamente na existência de Deus.
É certo que não se pode - pelo menos nenhum ser humano até agora o conseguiu - provar cientificamente a existência de Deus. Mas, da mesma forma, também ninguém pode provar científicamente, a inexistência de Deus.
São na verdade questões de fé, mas de pólos opostos. Não se podem provar. Qualquer ateu não pode provar a inexistência de Deus, da mesma forma que não pode provar a Sua existência. Qualquer crente não pode provar a existência de Deus. Apenas acredita. Tem fé. E se o crente tem fé na existência divina, o ateu tem fé na sua inexistência.
A questão na verdade é antiga, muito antiga. E muito séria, pois as nossas crenças acerca do que existe para além dos limites da vida, afectam directamente a forma como vivemos aquém desses limites.
Miguel de Unamuno aborda esta questão no sua obra Do Sentimento Trágico da Vida, onde confronta filosoficamente a fé com a razão. Miguel de Unamuno recusa-se a acreditar que a existência é apenas um relâmpago entre duas eternidades de trevas. Nesse caso não há nada mais execrável do que a existência, diz ele.
Estou com Unamuno quando afirma que "a razão e a fé são duas inimigas que não podem manter-se uma sem a outra" e também que, "a razão não nos prova que Deus exista, mas também não prova que não possa existir".
E partilho o seu sentimento quando afirma que "há que sentir e comportarmo-nos como se nos estivesse reservada uma continuação sem fim da nossa vida terrena depois da morte; e, se é o nada que nos está reservado, não fazer que isto seja uma justiça, segundo a frase de Obermann".
Dawkins, não deve ter lido Miguel de Unamuno. Pelo menos não consta da bibliografia da obra em causa. Julga que o saber ou o conhecimento humano acerca do Universo e da Vida já é suficientemente sólido e vasto, para sustentar essa "evidência" da inexistência de Deus. Acaba por cair no erro em que caem certos "sábios" - a falta de humildade. Consideram grande o campo do conhecimento já desbravado pela ciência. Tão grande, julgam, que nos podemos comparar com deuses e dispor da vida e da morte, e do Universo inteiro. Parecem ignorar o ilimitado campo do saber ainda por desbravar. Ignoram que, por muito que se saiba, nada se sabe. Só sei que nada sei, disse Sócrates. E disse bem. Estes novos sábios, ébrios com os novos saberes alcançados pela ciência, tomam a atitude oposta - pensam que tudo sabem, sem nada saberem, ou sabendo muito pouco.

(*) - Título original da obra de Richard Dawkins, A Desilusão de Deus, editada em Portugal pela Casa das Letras.

sexta-feira, novembro 16, 2007

O Menino da Sua Mãe


No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
De balas trespassado
- Duas, de lado a lado -.
Jaz morto, e arrefece.

Raia-lhe a farda o sangue.
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.

Tão jovem! Que jovem era!
(Agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
«O menino da sua mãe».

Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve.
Dera-lhe a mãe. Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.

De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo
A brancura embainhada
De um lenço…Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.

Lá longe, em casa, há a prece:
«Que volte cedo, e bem!»
(Malhas que o império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mãe.


Poema de Fernando Pessoa

quinta-feira, novembro 15, 2007

Inferno de Dante

E o silêncio soprou nas searas ondulantes...

Sereias sussurrantes, de assombrosos cânticos, perseguiram-me,
E perderam-me.
Perdi-me,
E perderam-se.

Nas searas ondulantes...

Oh! Vil! Inferno de Dante!

sábado, outubro 20, 2007

"Hoje acordei assim!"*

"Alegrias", de Júlio Romero de Torres
(*) - Dedicado à Bomba Inteligente, que não sei quem é. Olé!

quinta-feira, outubro 18, 2007

Sócrates revisitado

Se não sabemos alguma coisa, não saberíamos que é insuficiente, que é incompleto, que nos faltam outros algos pedidos por aquele que já temos. Isto é consciência do problema. É saber que não sabemos bastante, é saber que ignoramos. E tal foi, em rigor, o sentido profundo do «saber o não saber» que Sócrates atribuía a si próprio como único orgulho. Claro!, como que é o começo da ciência: a consciência dos problemas.

Ortega Y Gasset, O que é a filosofia?, Biblioteca Editores Independentes, pág. 103

Ouvi uma vez dizer alguém, supostamente citando Espinoza, que a humildade é a impotência dos fracos. Fiquei a pensar naquilo (e com muitas comichões). Então essa suposta virtude é afinal um defeito? Então a humildade não consiste no reconhecimento do quanto se é pequeno ou ignorante, ante a grandiosidade e os mistérios do universo e da existência?

Não foi Sócrates humilde, quando declarou que só sabia que nada sabia? E na verdade ao assumir essa sua ignorância, não demonstrou ele grande saber, e por isso, grandiosidade, força e magnificência? Talvez seja que a humildade nos fracos derive da impotência, e nos fortes, do saber. Mas o que é isso de ser fraco ou ser forte? Não é isso ser humano?

Um dia Karl Popper disse que “Seria desejável que por vezes nos lembrássemos que é precisamente no pouco que sabemos que somos diferentes, já que somos todos iguais na nossa ilimitada ignorância.” (*)
(*) – Karl Popper, Em Busca de um Mundo Melhor, Editorial Fragmentos, 1989, pág. 59

Portanto, ó intelectuais sapientíssimos! Ficai lá com a vossa altiva sapiência, que eu cá me fico com a minha ilimitada ignorância.

E boa noite!

quarta-feira, outubro 17, 2007

Do saber que não se sabe

Ode a um ministro qualquer

Ora, arvoram-se do alto dos seus palanques,
doutos sobre a turba.
Aturdem-nos com o dedo em riste
nos seus distendidos discursos.
Esmagam-nos com tanta sapiência,
A nós, os ignaros que os escutamos,
Homens sem ciência, mas com muita paciência.
Que sabemos apenas que nada sabemos.
E curvamo-nos ante o senhor doutor professor juiz,
Homo sapiens sapiens,
que sabe que sabe! Mas não sabe que não sabe!
Homem falho na humildade,
Homem morto na acção.

sábado, outubro 13, 2007

Manadas de bisontes empurradas pelo vento.

ODE A WALT WHITMAN (de Garcia Lorca)

Pelo East River e pelo Bronx
os rapazes cantavam mostrando as cinturas.
Com a roda, o óleo, o coiro e o martelo
noventa mil mineiros arrancavam a prata das rochas
e os garotos desenhavam escadas e perspectivas.

Porém nenhum adormecia,
nenhum queria ser rio,
nenhum amava as grandes folhas,
nenhum, a língua azul da praia.

Pelo East River e pelo Queensborough
os rapazes lutavam com a indústria,
os judeus vendiam ao fauno do rio
a rosa da circuncisão
e o céu desembocava por pontes e telhados
manadas de bisontes empurradas pelo vento.

Porém nenhum se detinha,
nenhum queria ser nuvem,
nenhum procurava os fetos
nem a roda do tamboril.

Quando a lua nascer,
as polés rodarão para turvar o céu;
um limite de agulhas cercará a memória
e ataúdes serão levados aos que não trabalham.

Nova Iorque de lama,
Nova Iorque de arame e de morte:
Que anjo levas oculto na tua face?
Que voz perfeita dirá as verdades do trigo,
o sonho terrível das tuas anémonas manchadas?

Nem um só momento, velho e formoso Walt Whitman,
deixei de olhar a tua barba cheia de borboletas,
os teus ombros de bombazina gastos pela lua,
as tuas coxas de Apolo virginal,
a tua voz como coluna de cinza;
ancião formoso como a bruma,
que gemias como um pássaro
com o sexo atravessado por uma agulha.
Inimigo do sátiro.
Inimigo da vide
e amante dos corpos ocultos por tecidos grosseiros.

Nem um só momento, formosura viril,
que em montes de carvão, vias-férreas e anúncios,
sonhavas ser um rio e dormir como um rio
com aquele camarada que poria no teu peito
uma pequena dor de ignorante leopardo.

Nem um só momento, Adão de sangue, Macho,
homem sozinho no mar, velho e formoso Walt Whitman,
porque nas esplanadas,
agrupados nos bares,
saindo em cachos das sargetas,
tremendo entre as pernas dos chauffeurs
ou girando nas plataformas do absinto,
os maricas, Walt Whitman, apontam-te.

Também esse! Também! E despenham-se
na tua barba luminosa e casta,
loiros do Norte, negros das areias,
multidões de gritos e ademanes,
como os gatos e as serpentes,
os maricas, Walt Whitman, os maricas
turvos de lágrimas, carne para chicote,
bota ou mordedura de domadores.

Também esse! Também! Dedos pintados
apontam a margem do teu sonho,
quando o amigo come a tua maçã
com um leve sabor a gasolina,
e o sol canta nos umbigos
dos rapazes que brincam sob as pontes.

Mas tu não procuravas olhos arranhados
nem o pântano sombrio onde afogam os garotos,
nem a saliva gelada,
nem as curvas feridas como panças de sapos
que levam os maricas em carros às esplanadas
enquanto os fustiga a lua pelas esquinas do terror.

Tu procuravas um nu que fosse como um rio.
Toiro e sonho que junte a roda à alga,
pai de tua agonia, camélia da rua morte
e gemesse nas chamas do teu Equador oculto.

Porque é justo que o homem não procure o prazer
na selva de sangue da manhã mais próxima.
O céu tem praias onde evitar a vida
e há corpos que não devem repetir-se na Aurora.

Agonia, agonia, sonho, fermento e sonho.
Assim é o mundo, amigo, agonia, agonia.
Apodrecem os mortos sob o relógio das cidades,
passa a guerra chorando com um milhão de ratas cinzentas,
os ricos dão às suas amantes
pequenos moribundos iluminados,
e a Vida não é nobre, nem boa, nem sagrada.

Pode o homem, se quiser, conduzir o desejo
por veia de coral ou nu celeste;
amanhã todo o amor será rocha, e o Tempo
uma brisa que chega adormecida pelos ramos.

Por isso não ergo a minha voz, velho Walt Whitman,
contra o garoto que escreve
um nome de menina na sua almofada,
nem contra o jovem que se veste de noiva
na penumbra da sua alcova,
nem contra os solitários dos casinos
que bebem com nojo a água da prostituição,
nem contra os homens de olhar verde
que amam outro homem queimando os lábios em silêncio.
Mas sim contra vós, maricas das cidades,
de carne apodrecida e pensamento imundo.
Mães de lodo. Harpias. Inimigos sem o sonho
do Amor que reparte grinaldas de alegria.

Contra vós sempre, que aos rapazes dais
gotas de suja morte com veneno amargo.

Sempre contra vós,
Faeries da América,
Pájaros de Havana,
Jotos do México,
Sarasas de Cádis,
Apios de Sevilha,
Cancos de Madrid,
Floras de Alicante,
Adelaides de Portugal.

Maricas de todo o mundo, assassinos de pombas!
Escravos da mulher, cadelas de seus toucadores,
abertos nas praças com febre de leque
ou emboscados em hirtas paisagens de cicuta.

Não haja trégua! A morte
irrompe dos vossos olhos
e junta flores de cinza na margem do lodo.
Não haja tréguas! Alerta!
Que os confundidos, os puros,
os clássicos, os predestinados, os suplicantes
vos fechem as portas da bacanal.

E tu, belo Walt Whitman, dorme nas margens do Hudson
com a barba virada ao pólo e as mãos abertas.
Argila branca ou neve, a tua língua chama
Camaradas que velem tua gazela sem corpo.

Dorme, não fica nada.
Uma dança de muros agita as pradarias
e a América afoga-se em máquinas e pranto.
Quero que o ar forte da noite mais profunda
tire flores e letras do arco onde dormes
e um garoto negro anuncie aos brancos do oiro
a chegada do reino das espigas.



Por Garcia Lorca

Traduzido por Eugénio de Andrade

sexta-feira, outubro 12, 2007

Epílogo – Resposta a Marx

O que Marx escreveu não se encontra escrito na pedra. Afinal, dividir as sociedades em classes de oprimidos e opressores, não deixa de ser uma forma maniqueísta e simplista de as considerar. A realidade é um pouco mais complexa e é sabido que muitas vezes os oprimidos de hoje, se tornam os opressores de amanhã, ainda que aconteça muitas vezes a um homem, manter a condição de oprimido ou de opressor durante a maior parte da sua vida, senão na sua totalidade. Em cada oprimido há um potencial opressor e vice-versa, e o homem é na verdade lobo do homem, como referia Thomas Hobbes. Talvez essa reviravolta, de oprimido em opressor, ocorra quando o oprimido se apercebe que a maior arma do opressor é a sua própria cabeça (a do oprimido). Por outro lado, que dizer daqueles a quem não cabe nem a condição de oprimido, nem a condição de opressor? Serão esses os homens verdadeiramente livres? Os que nem oprimem nem são oprimidos? Será tal condição sequer possível?

O opressor por sua vez torna-se vítima da sua opressão, muitas vezes sem tomar consciência disso, ou por outras palavras, o opressor é oprimido pela sua própria acção de oprimir. É como refere Steiner: “O carrasco tortura a sua vítima e condena-se desse modo a ser uma eterna vítima.”*

E há ainda outra questão (para dizer a verdade, há muitas questões), que é essa ideia de a religião ser o ópio do povo. Ainda que possamos considerar que assim seja, o mesmo não o poderemos referir relativamente à religiosidade. Pois se religiosidade e religião forem consideradas a mesma coisa, então o homem anda entorpecido na dormência do ópio, desde o momento em que se tornou homem. É que a religiosidade é uma dimensão do ser humano. Ela é apenas o terreno (solo) de onde brotam as religiões. Por isso encontramos religiões por todo o planeta, cada uma com o seu deus ou os seus deuses, paradoxalmente, únicos e omnipresentes. Mas o facto de o homem possuir a religiosidade como uma das suas dimensões, tal não significa que tenha de professar necessariamente uma religião. E se as religiões são formas de apropriação da dimensão religiosa de cada homem visando atingir relações de dominação ou prevalência de uns sobre outros (todas as religiões têm os seus sumo-sacerdotes, xamãs, curandeiros, mediadores entre o mundo de além e o mundo de aquém, supostamente detentores de informação privilegiada, e informação é poder, e daqui à dominação e à opressão são dois passos), a religiosidade inerente a cada homem não é disso que se trata. Sabendo isto, é um erro querer negar a religiosidade potencial e inerente a cada homem, para dessa forma se anularem os efeitos perversos das religiões – um dos quais, dividir os homens, antagonizando posições. O objectivo perene do ecumenismo é a prova das eternas divisões. Ora, nesta questão da religião ser o ópio do povo, confundiu-se a religião com a religiosidade. E assim muitos querem despir a sua religiosidade como quem despe um casaco, como se isso fosse possível, quando a religiosidade lhes está entranhada na sua própria humanidade. É que podemos não professar uma religião, mas não podemos negar a nossa religiosidade.

Marx contudo, foi um verdadeiro filósofo, um cientista social, que, tal como Tocqueville, realizou uma análise certeira à sociedade do seu tempo, e adoptou uma concepção materialista da história que, em grande parte o levou a conclusões acertadas e a projecções que vieram, com efeito a verificar-se, tais como, a globalização alimentada pelo capitalismo insaciável, as causas das crises cíclicas do capitalismo ou as relações sociais e económicas determinadas pelo capitalismo – o sistema vigorante.


(*) – in Ramin Jahanbegloo, Quatro entrevistas com George Steiner, Fenda, pág.63

terça-feira, outubro 09, 2007

Do medo de perder o emprego

A MELHOR ARMA DO OPRESSOR É A CABEÇA DO OPRIMIDO

Graffiti que pode ler-se nalgumas paredes suburbanas da Margem Sul. Autor desconhecido. (Talvez escrito na “clandestinidade” por um lunático esclarecido, ou, por algum esclarecido e por isso, lunático.)

Diz Karl Marx:

Até agora, toda a sociedade se baseou, como vimos, na oposição entre classes opressoras e classes oprimidas. Mas para poder oprimir uma classe é necessário assegurar-lhe determinadas condições em que ela possa, pelo menos, continuar a sua existência servil.

Karl Marx, «Kommunistiches Manifest», in Patrick Gardiner, Teorias da História. FCG. 4ª ed.

Quanto mais precário for o emprego, ou por outras palavras, quanto mais flexível for, mais estarão reunidas as condições de opressão e para a existência servil de uma classe. E assim, viva a flexisegurança!

Flexisegurança?!

Como se existisse segurança no emprego flexível. Querem convencer-nos que a Lua é cúbica.

Talvez por isso mesmo, o maior factor de liberdade seja não ter emprego, principalmente quando o emprego passa a ser um factor de escravatura. Por outras palavras, o melhor é não ser empregado do Príncipe, do Senhor, do Estado ou da Multinacional. Talvez só se seja livre, realmente livre, trabalhando para os outros, sem ser empregado de ninguém.

domingo, outubro 07, 2007

Sus! Marx outra vez?!

A Globalização Antecipada

As condições burguesas tornaram-se demasiado estreitas para conterem a riqueza por elas produzidas. – E como vence a burguesia estas crises? Por um lado, aniquilando pela violência [hoje, leia-se, pelo desemprego] as massas de forças produtivas; por outro, conquistando novos mercados e explorando a fundo os antigos.

Karl Marx (1818-1883), «Kommunistiches Manifest», in Patrick Gardiner, Teorias da História. FCG. 4ª ed. Pág. 164.

Eis a abertura dos mercados orientais, da China e da Índia e de outras chinas e índias, lá, onde a vida humana, assim como o trabalho, de tão numerosa que é se desvaloriza, como se uma lei económica caprichosamente se aplicasse também às vidas humanas, tal como ao trabalho. É nestes países, onde todos os dias os direitos humanos são pisados, que agora se instalam as empresas geradoras de riqueza no mundo – uma riqueza desigualmente distribuída, entenda-se.

É que já no século XIX, Marx havia notado:

Quanto menos habilidade e demonstração de força o trabalho manual exige, isto é, quanto mais a indústria moderna se desenvolve, mais o trabalho dos homens é substituído pelo das mulheres e das crianças.

Karl Marx, «Kommunistiches Manifest», in Patrick Gardiner, Teorias da História, FCG. 4ª ed. pág. 165

E David Landes, um historiador actual, crítico de Marx, também o nota:

A história dos primórdios da industrialização é invariavelmente uma crónica de trabalho árduo por baixo salário, para não falar de exploração. Uso esta última palavra, não no sentido marxista de pagar ao trabalho menos do que o seu produto (que outro modo haveria de o capital receber a sua recompensa?), mas no sentido significativo de obter mão-de-obra compulsória de pessoas que não podem dizer «não» - de mulheres e crianças, escravos e semiescravos (os involuntários servos da gleba).

David Landes, A Riqueza e a Pobreza das Nações, Gradiva, 6ª edição. Pág. 427.

É claro, que actualmente tal só ocorre nalguns lugares do mundo.

Numa versão mais actual desta evidência, os que realmente pagam a factura da globalização económica e financeira (leia-se, do desenvolvimento da "indústria" moderna), os mais fracos, já não são as mulheres nem as crianças das sociedades ocidentais, mas sim os ingénuos e oprimidos trabalhadores do outro mundo – esse a que convencionaram chamar de Terceiro, como se não tivéssemos nada com aquilo.

sexta-feira, outubro 05, 2007

A crise aí está

Há vários decénios que a História da indústria e do comércio não é mais do que a história da revolta das forças de produção modernas contra as condições modernas de produção, contra as relações de propriedade que formam as condições de existência da burguesia e do seu predomínio. Basta mencionar as crises do comércio, que por serem periodicamente cíclicas põem em jogo e cada vez mais ameaçadoramente a existência de toda a sociedade burguesa. Nas crises do comércio, uma grande parte, não só dos produtos existentes, mas também das forças de produção anteriormente criadas, é sistematicamente aniquilada. Nestas crises, irrompe uma epidemia social, que teria parecido absurda a todas as eras anteriores: a epidemia da superprodução.

Karl Marx, Manifesto Comunista, in Patrick Gardiner, Teorias da História

Ufanam-se os economista americanos Samuelson e Nordhaus, o primeiro, Prémio Nobel de Economia em 1970, com as “profecias erradas” de Marx, em particular as que previam a degradação das condições de vida dos trabalhadores. Dizem eles na sua bíblia da Economia, lida e estudada por estudantes universitários de todos os cantos do Mundo:

Estas foram as profecias que inspiraram gerações de radicais da velha e da nova esquerda. Com o passar das décadas, contudo tornou-se claro que a história não estava a seguir o guião de Marx. Os trabalhadores estavam a beneficiar de salários reais cada vez maiores e de menos horas de trabalho e a parcela do trabalho no rendimento nacional estava a crescer lentamente. (…) E quando Keynes escreveu a sua Teoria Geral em 1936 deu nova vida e renovou a fé no capitalismo misto. Samuelson e Nordhaus Economia, 14ª Edição. MacGraw-Hill, pág. 447.

Há muito que os economistas e filósofos se tinham apercebido das crises cíclicas do capitalismo, desde Juglar, passando por Kondratief a Schumpeter, para não mencionar Marx. E se o capitalismo se renovou com Keynes, tal só aconteceu, porque o mesmo reescreveu as regras do jogo. Com Keynes, o capitalismo deixa de ser puro e passa a ser misto, e porquê? Porque advoga a intervenção do Estado para corrigir, exactamente, as desregulações em que ciclicamente o mercado cai e as ineficiências de que o mesmo padece, em particular, no que concerne à redistribuição da riqueza. Por outras palavras, se o mercado for deixado a funcionar por si próprio, não haverá nenhuma mão invisível que a prazo o coloque nos eixos. Com Keynes, é o Estado que toma o lugar dessa inexistente mão invisível. Assim, após 1929 até final da década de 70, tivemos com efeito, um “capitalismo misto” que elevava os salários reais sendo cada vez menos as horas de trabalho.

Após o início da década de 80, com os governos de Tatcher e de Reagan, desencadeia-se o monetarismo de Milton Friedman e as políticas económicas keynesianas passam a ser consideradas obsoletas: o capitalismo puro instalou-se outra vez lentamente e, defendem os novos arautos do capitalismo, o papel do Estado enquanto regulador da economia e do mercado deve ser mínimo.

Se assim é, porque nos admiramos com o regresso das crises cíclicas, e das exigências para se trabalhar mais horas por semana e mais tempo na vida? Porque nos admiramos com a quebra dos salários reais, com o crescente número de desempregados e com o medo generalizado de se perder o emprego? Na verdade, é com esse medo que hoje joga o opressor. E parece ser uma grande verdade, aquela que li nas paredes das ruas suburbanas: a melhor arma do opressor é a cabeça do oprimido.

Alan Greenspan diz que está optimista, que a tempestade há-de passar. Mas já percebemos que é só para nos dar alguma confiança. E Jean-Claude Trichet, esse, já não sabe o que fazer com as taxas de juro. O que se sente na verdade, é a incerteza e a insegurança, pois quando se está verdadeiramente confiante, não é necessário afirmá-lo.

segunda-feira, outubro 01, 2007

A condição do português e dos homens valorosos

Quis Cristo que o preço da sepultura dos peregrinos fosse o esmalte das armas dos portugueses, para que entendêssemos que o brasão de nascer portugueses era a obrigação de morrer peregrinos: com as armas nos obrigou Cristo a peregrinar, e com a sepultura nos empenhou a morrer. Mas se nos deu o brasão que nos havia de levar da pátria, também nos deu a terra que nos havia de cobrir fora dela. Nascer pequeno e morrer grande é chegar a ser homem. Por isso nos deu Deus tão pouca terra para o nascimento e tantas para a sepultura. Para nascer, pouca terra; para morrer, toda a terra; para nascer, Portugal; para morrer, o mundo.

Padre António Vieira, Sermão de Santo António.
Palavras de Péricles:

Com efeito, a terra inteira é o túmulo dos homens valorosos, e não é somente o epitáfio nos mausoléus erigidos em suas cidades, que lhes presta homenagem…

Tucidides, História da Guerra do Peloponeso
Partir, sempre foi a condição do português e dos homens valorosos.

domingo, setembro 30, 2007

Aqui, na Arcádia


Aqui na Arcádia os marmelos rebentam nos ramos e os ribeiros albergam divindades transfiguradas em esvoaçantes pássaros azuis. Não há templos nas colinas. Repito. Não há templos nas colinas. Que se apartem as marchas rituais e os beatos, para sempre, destas terras sagradas.

Aqui na Arcádia, pendem até ao chão os ramos das oliveiras, carregadas de azeitonas, inchadas e verdes, e o perfume das estevas ainda inunda o ar húmido da tarde. Ébrio com o seu perfume, caminho nas margens das ribeiras, sob as laranjeiras prenhes de flores e frutos, e sob as figueiras odoríferas. É aqui que o Verão se esconde, nestes vales apertados e profundos das serras de xisto. E é aqui que se revela ainda. Aqui, os homens repetem gestos ancestrais: enchem de carícias e cuidados as plantas das suas hortas e as ovelhas que os seus cães guardam com zelo. E assim se renovam os ciclos.

Aqui na Arcádia onde deambulo, o mundo parece coisa longínqua, mas não está longe. Quando desço da Serra ao Algarve, lá onde fervilham as cidades, é grande o linguarejar e são estrangeiros os que sobressaem, vindos no Norte, lá da terra de Sua Majestade. Divirto-me a pensar numa colónia em formação, numa nova Gibraltar, e numa armada que virá um dia, se necessário, em sua protecção. Os súbditos de Sua Majestade, já se aproximam do lugar onde o Verão se esconde. E se revela, ainda.

domingo, setembro 23, 2007

Nos mares da Filosofia


Este mundo (esta ordem do mundo – κόσμος), o mesmo para todos, nenhum dos deuses, nenhum dos homens o fez, mas sempre foi, é e será, fogo sempre vivo, aceso de acordo com a medida, apagado de acordo com a medida.


Heraclito

fragmento 30 de DIELS


Abandonemos os dias apocalípticos à espuma dos dias,

E naveguemos no palpitante Universo, muito mais profundo.

Universo sempiterno, sistólico e diastólico, pulsante como um coração.

Universo de fogo sempre vivo, aceso de acordo com a medida, apagado de acordo com a medida.


Rumemos novamente para mares nunca antes navegados.

Porque navegar é preciso e viver não.

É preciso varrer de novo o horizonte com o olhar.

Demandar a Ilha dos Amores* com as suas Ninfas.


(*) – Pequeno agradecimento a quem, surpreendentemente para este Robinson, descobriu alguns tesouros nesta árida e solitária ilha, perdida algures nos mares do Sul.

quinta-feira, agosto 30, 2007

O fim do mundo, todos os dias


Quando era muito novo cheguei por momentos a viver angustiado com a ideia de que um dia iria assistir ao fim do mundo. Num só dia o planeta explodiria após uma sucessão de factos estranhos na vida de cada ser vivente. Nesse dia, pouco antes do fim, a loucura tomaria conta do mundo e dos homens. E depois, o fim. Na verdade tal poderia acontecer. Vivia-se nos anos da “guerra-fria” e uma chuva de bombas atómicas poderia, a qualquer momento, por termo a tudo. Fui crescendo e o medo desvaneceu-se até desaparecer completamente. O mundo não poderia acabar num só dia.

Hoje porém começo a perceber que já estamos a viver o fim do mundo. E ainda que possa durar séculos, à escala do tempo geológico será uma questão de segundos. Todos os anos, sucessivamente, o planeta na sua translação oferece os seus bojos ao Sol. De Setembro a Março, o hemisfério sul, e de Março a Setembro, o hemisfério norte. E assim se explica o Verão, ou melhor, a estação quente, alternada em cada hemisfério. É precisamente nessa estação que cada hemisfério é brindado com fogos ardentes que consomem as florestas e as obras dos homens. Ora arde a Austrália, ora a Califórnia, ora a Amazónia, ora a Europa, e por aí fora. Em alternância é o planeta inteiro que aquece e arde, continuamente.

Quando contemplo as chamas devoradoras tragando os campos da Grécia e as encostas do Olimpo é o fim do mundo que me vem à ideia.

Imagino uma outra civilização extra-planetária que ao chegar à Terra, daqui a milénios, ao contemplar os vestígios e as ruínas da nossa civilização, irá por certo concluir que nos últimos dias lutámos contra o fogo em todo o planeta e que nesse inferno sucumbimos.

terça-feira, agosto 28, 2007

O anonimato na blogosfera

Por que se preocupam tanto alguns com o anonimato de outros? Não saberão que o anonimato é mero instinto de sobrevivência? O homem é lobo do homem. Num país onde durante tantos séculos vingou a Santa Inquisição (o tribunal do Santo Ofício cessou as suas funções apenas no século XIX!), e a PIDE perseguiu e castigou durante décadas no século XX, há que prevenir. Tudo indica que na nossa sociedade se desenvolveu um gene delator e muitos indivíduos parecem possuí-lo. Portugal é um país de delatores! E quem pode garantir que amanhã não haverá outro Pogrom desencadeado, não pela Santa Inquisição, mas por outra Santa qualquer? Não seria a primeira vez que os inocentes de hoje seriam os perseguidos de amanhã. É preciso dificultar a vida a essa gente (os delatores). Hoje já nem sequer é preciso a Santa Inquisição ou a PIDE. Tudo se passa de forma mais subtil. Existem novas formas de delação e de opressão que se estendem ao comum dos mortais. Generaliza-se uma nova espécie de totalitarismo em que todos se controlam uns aos outros. Para se ser livre é preciso escapar a isso.

É porém uma grande cobardia denegrir alguém, escudado no véu do anonimato. Neste caso o anónimo torna-se tão abominável como o delator. E não há pior delator que o delator anónimo.

domingo, julho 15, 2007

Lisboa tem medo*

Lisboa tem medo.

Tem medo de perder o poder que julga ter, a sua proeminência em relação ao resto do país. Como se Lisboa fosse Portugal e o resto paisagem. Lisboa sente o poder escapar-lhe e tem medo. Tem medo de perder o “prestígio” que já não tem, se é que alguma vez o teve. Nunca se apercebeu que é uma cidade provinciana. Até Eça, ao escolher uma cidade a opor às suas serras, escolhe Paris. Paris é a Cidade, Lisboa não.

Lisboa tem medo que lhe retirem o aeroporto debaixo das suas saias e não se apercebe que as maiores capitais têm os seus aeroportos principais a dezenas de quilómetros do seu centro (curiosamente, Lisboa, não tem medo que lhe caia um avião em cima!).

Lisboa tem medo da auto-estrada que liga o Norte ao Sul do país, sem que seja necessário passar por ela. Que desconsideração!

Lisboa tem medo da regionalização – isso seria devolver o poder ao resto de Portugal, à “paisagem” – e Lisboa tem medo de perder o poder que ainda tem.

Lisboa é um sorvedouro de dinheiros públicos e privados e já é um escolho ao desenvolvimento do país. Concentra em si cada vez mais, os poucos recursos que o país produz ou possui. E numa situação de má gestão, de má política, numa situação desesperada, tudo quer para si, mesmo que isso signifique o empobrecimento progressivo das outras cidades e regiões. Em dias de apertado orçamento, o pouco que há, o pouco que ainda resta, vai para Lisboa. Lisboa é um buraco negro que colapsa sobre si mesmo. Resultado: noutros lugares e regiões, mais ou menos distantes deste país, encerram maternidades, escolas, postos de correio, esquadras da polícia, hospitais e centros de saúde, etc. Acelera-se o despovoamento do interior. As universidades de província definham e ameaçam encerrar. Há cursos que encerram com a falta de estudantes, disputados pelas numerosas universidades de Lisboa.

Mas o país não dorme e aos poucos apercebe-se que o seu desenvolvimento não passa por Lisboa. Esta é antes um desafio a vencer. Algumas cidades e regiões revelam um dinamismo potencial que não se vê em Lisboa, e começam a traçar caminhos que não passam por lá.
(*) - Lisboa, leia-se, os poderes e os "poderosos" que lá moram.

domingo, junho 24, 2007

Da Andaluzia...

Naranjas y Limones
















Julio Romero de Torres (1874 – 1930)
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Adelina em Passeio

Não tem laranjas o mar,
nem Sevilha tem amor.
Morena, que luz de fogo.
Empresta-me o guarda-sol.

Pôr-me-á a cara verde
- sumo de lima e limão -,
tuas palavras – peixinhos –
virão nadar em redor.

Não tem laranjas o mar.
Ai amor.
Nem Sevillha tem amor!

Garcia Lorca (1898-1936), traduzido pelo poeta Eugénio de Andrade.
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Música: “Pantomina” de Manuel de Falla (1876 – 1946)
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O que me encanta na Andaluzia?

Talvez a lua nas noites de estio.
Talvez as esguias silhuetas das andaluzas ao luar,
esgueirando-se nas ruas estreitas e serpenteantes
onde ecoam as guitarras e soa o flamenco.
Nas bodegas escondidas e animadas, dançam e cantam.

Talvez os laranjais aromáticos.
O Guadalquivir, o Darro e o Genil.
Sevilha, Córdova e Granada.
A Serra Nevada, quente e gelada.

Talvez as brancas e apinhadas aldeias de Jerez. O quente sabor do vinho.
A frescura da tarde, nas margens dos rios…
O flamenco e a guitarra, mais uma vez!
A pintura, a poesia e a dança.
O sangue e a tourada. A vida e a morte.

Talvez o que cantam os poetas andaluzes, os de agora e os de sempre,
Sim, esses mesmos, os que quando cantam parece que estão sós.

Talvez o mar andaluz, Atlântico e Mediterrânico.
E sem dúvida, a fiesta e a siesta.

Errar na Andaluzia é um prazer.

Também nas minhas veias corre sangue andaluz.
E sei-o porque o sinto.

sábado, junho 16, 2007

Gustave Doré (1832-1883)


Foi numa tarde quente em Sevilha, no ano 2001, que o conheci. Mais precisamente, no Museu de Belas Artes, quando saia. Reparei então numa galeria menor, onde estavam expostos os seus quadros, desenhos e esboços. Um convite para entrar. Entrei e descobri inadvertidamente, Doré. Gustave Doré. Os seus quadros e desenhos eram muitos deles cinzentos, sombrios, românticos, exóticos, mas muitos irradiavam uma luz mágica, quase divina, uma auréola misteriosa. A luz lutava contra a sombra. O Bem contra o Mal. Imagens de tempos imemoriais, reais e imaginárias. Ilustrações de obras literárias, desde a Bíblia a Dom Quixote e à Divina Comédia, entre outras obras.

A ilustração que encima este blog é dele. É acerca do desespero e da frustação que sentem os Homens quando se deparam com a impossibilidade de concretizarem os seus planos mais ambiciosos que desafiam os deuses. Sempre que a ambição é desmedida e os passos maiores que as próprias pernas, a queda é inevitável. Os deuses não gostam de ser desafiados. Não existem barcos inafundáveis (como foi dito em relação ao Titanic) e as altas torres de Nova Iorque, que ousavam aproximar-se do Olimpo, foram derrubadas. E sempre que os homens ousaram pensar que eram deuses, provaram o amargo travo da sua própria destruição. Tudo cai por terra, quando se vai longe e alto demais. Que o diga Ícaro. A história é antiga. Há limites que resistem a serem ultrapassados. O destino existe.

Que o diga também o Ancient Mariner (na figura), amaldiçoado por a sua tripulação ter morto o albatroz, em desafio a uma lenda antiga.

quinta-feira, junho 07, 2007

Em torno de quem gira o mundo?

domingo, junho 03, 2007

Vontade

Nem que nade contra o rio e o rio me leve.

Mesmo sabendo que nem todos os rios desaguam no mar.

domingo, maio 06, 2007

Abraçar uma Cruz

E mesmo que o trabalho fosse o nosso castigo, deveríamos tender para fazer dele, do próprio castigo, a nossa consolação e a nossa redenção e, se tivermos de abraçar uma cruz, não há outra melhor para cada um do que a cruz do trabalho, o seu próprio ofício civil. Cristo não nos disse «toma a minha cruz e segue-me», mas «toma a tua cruz e segue-me»; cada qual leva a sua, que a do Salvador ele leva-a sozinho.

Miguel de Unamuno, Do Sentimento Trágico da Vida

sábado, maio 05, 2007

Da importância da experiência e da prática

Aparentemente, ninguém se torna médico apenas pela leitura de compêndios de medicina.

Aristóteles, Ética a Nicómaco

domingo, abril 29, 2007

Um segundo para Deus pode ser uma eternidade para o Homem. Uma eternidade para Deus pode ser um segundo para o Homem.

sábado, abril 28, 2007

Apeiron

Onde estiver a origem do que é aí também deve estar o seu fim, segundo o decreto do destino. Porque as coisas têm de pagar umas às outras castigo e pena, conforme a sentença do tempo.
Anaximandro, séc. VI a.C.

domingo, abril 22, 2007

50 Anos de Paz

Lamentam-se os opinion makers*, mais uma vez, acerca do estado a que chegou a União Europeia, da críse da Europa, das suas incapacidades e limitações, do facto de ficar aquém dos EUA em quase todos os domínios, da sua dificuldade em constituir-se como federação, do facto de não ter futuro, de que o futuro morreu, etc.., etc., etc. É só ler o Público deste domingo.
Parece que não lhes bastam os 50 anos de paz na Europa Ocidental. Um facto sem precedentes nesta região. Será que se esqueceram dos primeiros 50 anos do século XX? (para não ir mais atrás no tempo)
O que é que queriam? Guerra na Europa Ocidental?
Iludidos e mergulhados na actual conjuntura, estes "velhos do Restelo" consideram a paz como um dado adquirido e por isso não a valorizam devidamente. Talvez só quando ela se perder então lamentem o facto.
E não se diga que só há paz porque os europeus não sabem fazer a guerra, ou não se podem dar a esse "luxo" por terem perdido a IIª Guerra Mundial, ou por os "polícias americanos" o não permitirem. Foram os europeus ocidentais que construíram a comunidade europeia. Foram os europeus que trataram de assegurar o prevalecimento da paz entre si.
Os 50 anos de paz, por si bastam, para tornar o projecto europeu um sucesso sem precedentes desde os tempos do Império Romano.
Trata-se de um feito notável e necessário para que não desfaleça a esperança no futuro da União Europeia.
(*) - Vasco Pulido Valente; Eduardo Lourenço; Teresa de Sousa

domingo, abril 15, 2007

A Sobra do Mundo


Ortega e Gasset disse um dia que os EUA tinham sido construídos com a sobra da Europa. Na verdade, foram construídos com a sobra do mundo. Em pouco tempo se tornaram uma espécie de Novo Mundo, construído com a sobra do mundo. Um micromundo. Talvez na diversidade dos povos que os compõem resida a sua maior riqueza. Os EUA são uma subcivilização da civilização Ocidental, mas a tender para a formação de uma nova civilização.

sábado, março 24, 2007

Há uma única maneira convincente de fazer o elogio da Europa: é falar da sua cultura.

Folco Quilici

segunda-feira, março 19, 2007

Das multidões...

29. Os melhores escolhem um só bem em troca de todos os outros, a glória eterna em troca das coisas mortais. A multidão sacia-se como as manadas.

Heraclito, Fragmentos
Com efeito, nada há de mais insensato do que uma multidão inútil, nada há de mais insolente.
Heródoto, Histórias (livro 3º)

domingo, março 18, 2007

Da espuma dos dias...

- Com tudo isso te faço saber, irmão Pança - replicou dom Quixote -, que não há memória que o tempo não acabe nem dor que a morte não consuma.

Cervantes, Dom Quixote
Tudo flui, tudo se apaga, tudo se dissolve no maelstrom do tempo.
Mas apetece responder como César no poema de Alfonso Canales, no seu "Discurso de César às Legiões":
...quando tudo se suma num longo silêncio, e não haja um só sinal para decifrar, TEREI VIVIDO.

Algumas interrogações

Hoje acordei com algumas interrogações:

Poderá um comunista ser um liberal?

Poderá um liberal ser um comunista?

O interesse colectivo não se opõe, a partir de determinado limite, à liberdade individual?

Até que ponto podem coabitar a liberdade e a igualdade?

E o Estado, representante do interesse colectivo, não poderá tornar-se opressor frente ao indivíduo?

Não pode o Estado ser protector sem ser opressor?

E qual é o interesse colectivo?

E quando o interesse colectivo é a liberdade do indivíduo?

sábado, março 03, 2007

Império

Em terceiro lugar, o poder do Império funciona a todos os níveis da ordem social, penetrando até às regiões mais profundas do mundo social. Não se limita a gerir um território e uma população, mas cria também o mundo real que habita. Não se limita a governar as interacções humanas, mas pretende também governar directamente a natureza humana. O objecto do seu poder é a totalidade da vida social e, por isso representa a forma paradigmática do biopoder.
Hardt, Michael; Negri, António (2000), Império, Livros do Brasil, pág. 15
No dia 2 de Março de 2007 jogaram no ring mediático, o poder das multidões contra o poder dos milhões (€). Venceu o Império dos milhões. A "importância" dos milhões em jogo, justificou a opção de serem eles a abrir os telejornais desta paróquia. É preciso criar o "mundo real" que o Império habita. E o "mundo real" é cada vez mais criado nos media - se a notícia não passou na televisão, então não aconteceu, dizem. Neste caso, valorizou-se mais a OPA que a manifestação dos descontentes - a maior desde o fim do Estado Novo. O Império mostrou quem manda. Os media e os seus representantes mostraram de quem são lacaios.

sexta-feira, março 02, 2007

O Império

Mais de 100 000 pessoas manifestaram-se hoje nas ruas de Lisboa e os telejornais abriram todos com a notícia do "Fim da OPA".

Ah! O Império, o Império...

Estamos todos a ser anastesiados pela comunicação social, ou então, estamos todos cegos.

Será que todos portugueses são agora especuladores bolsistas? Será que lhes interessam mais as venturas e desventuras das empresas cotadas na bolsa? Seremos todos accionistas?

domingo, fevereiro 25, 2007

O desenvolvimento enquanto desígnio

Trinta e três anos de democracia decorridos. Trinta e três anos de “Abril”. Estranhamos uma ausência: onde está o desenvolvimento? As promessas de desenvolvimento parecem ter passado de moda. Na verdade, nem parece ser, no momento, conveniente falar dele. A buzzword, mais proferida pelos políticos, agora com todos os soundbites, é a do "crescimento económico". Até a oposição lastima o retrocesso do “crescimento económico”, ao longo destes dois últimos anos. Porém, ninguém questiona o desenvolvimento. Será que todos pensam que o país se desenvolveu? Que já somos desenvolvidos?

O crescimento económico é apenas um meio para se atingir um fim: o desenvolvimento. Mas está a ser considerado pelos nossos políticos como se de um fim se tratasse. O desenvolvimento foi esquecido.

Porque foi abandonado tal conceito nos seus discursos e nas práticas governativas? Por que razão foi abandonado, enquanto desígnio?

Somos levados a pensar que os políticos deixaram de acreditar convictamente no desenvolvimento, porque sentem que são incapazes de promovê-lo ou então, porque são medíocres.
O Professor Simões Lopes, citando Dudley Seers, lembra que “as perguntas a formular acerca do desenvolvimento de um país, de uma região, são simplesmente estas: o que é que vem acontecendo com a pobreza? Com o desemprego? Com as desigualdades? Se os três se têm reduzido (a pobreza, o desemprego, as desigualdades), não pode duvidar-se de que houve desenvolvimento no país ou região em questão.” (1)
Decorridos trinta e três anos desde o 25 de Abril de 1974, período em que governaram principalmente sociais democratas e socialistas (!), nalguns casos com maioria absoluta, questionamo-nos então: como evoluíram no nosso país os indicadores de pobreza, de desemprego, e das desigualdades? As respostas infelizmente apontam para um agravamento. Os indicadores revelam claramente, o aprofundamento das desigualdades (económicas, sociais e territoriais), o aumento do desemprego (e degradação da qualidade do emprego) e o aumento do número de pobres. Basta consultar as estatísticas, contidas nos mais recentes Relatórios de Desenvolvimento Humano da ONU, do Eurostat e de outros organismos internacionais. Decorridos 33 anos, lamentamos dizer: eis o estado a que isto chegou.
_________________________________________
(1) Lopes, Simões (2006), "Encruzilhadas de desenvolvimento: Falácias, dilemas, heresias", Revista Crítica de Ciências Sociais, n.º 75, Outubro 2006, pp. 41-61.

terça-feira, fevereiro 20, 2007

O neoliberal século XXI e o Mediterrâneo

Sem qualquer nobreza, já não calcorreamos campos distantes, como soldados apartados da terra-mãe. Quentes nos nossos lares, confortáveis nas nossas poltronas, defronte das nossas lareiras, já não temos que lutar pela liberdade. Ela já nos foi oferecida (supostamente) numa bandeja de prata. Estamos agora demasiado acomodados, isolados e engordados, neste neoliberal século XXI. Não temos camaradas de armas com quem beber um copo e sonhar com lares distantes, deixados para trás. Não caminhamos já nas areias dos desertos, no Norte de África, de arma a tiracolo, como noutros tempos. Nem vigiamos o horizonte nas quentes ilhas do Mediterrâneo - esse mar navegado desde tempos imemoriais, por Ulisses, Eneias e outros antigos navegadores. O Mediterrâneo do passado ainda é porém, o dos nossos sonhos, e quem sabe, o do nosso futuro.

Século XX...Século XXI

O meu século XX teve início em 1968, após todas as tempestades do século. As guerras onde os nossos bisavôs se afundaram. O barco vogou após 1968 para águas mais tranquilas, climas quentes, mares tropicais. E hoje, perdidos neste mar, vogamos de ilha em ilha. Perdemos o tempo, ganhamos a vida...

Lassos corpos no convés, ao sol quente dos mares tropicais. Contemplamos o horizonte em busca de um ponto conhecido. O rumo da história trouxe-nos a estes mares nunca antes navegados. E por aqui velejamos, sem bússola e sem rumo. Aguardamos! Pode ser que o vento torne a soprar neste mar paradisíaco.

domingo, janeiro 21, 2007

Discurso de César às Legiões

Quando a mão cessar de agitar-se, e o lábio
de tentar falar; quando terminar
de organizar a minha destruição, e começar
a organizar meu esquecimento; quando for
coisa ou, menos ainda, a pegada de um gesto
ou, menos ainda, referência
de uma mancha muito zelosamente
apagada; quando acabem
as solúveis escórias, os destruídos
torrões, a fumarada,
de espalhar-se e afastar-se e ver-se
sumidos num fundo saco vazio; quando
nada estiver como está, como não esteve
nunca; quando já ninguém
entender nunca o que é nunca, e sempre
simule eternidades novas;
quando outros mordam o engano, ferido
o palato, e creiam a pés firmes
que estão e são, etcetera; e mais tarde,
quando já não haja nada que crer ou ninguém
que creia; quando não haja
ninguém; quando todas as récitas
acabem, se dispam os actores
de máscara e de pele, e o público
se retire e vá dormir, se apaguem
as luzes, e os ratos
busquem nas plateias
algum pedaço de chicle húmido; quando morrerem
também os ratos e os gulosos
vermes dos ratos e os pequenos
animais (ou plantas) que devoram
os vermes dos ratos; quando abatam
seu estriado prestígio os fustes; quando o brilho
se ensombre, e a sombra
se esfume; quando
tudo se suma num longo silêncio, e não haja um só
sinal para decifrar, TEREI VIVIDO.



(Alfonso Canales)

terça-feira, janeiro 02, 2007

Um Creso dos tempos modernos

Mais uma vez o passado assalta-nos a memória. Toda a glória é efémera! Essa é a lição de Creso, o rei Lídio que viveu em Sardes, no século VI a. C., e que pretendeu ser o mais feliz dos homens. Também Sadam teve destino quase semelhante. No auge do seu poder possuia esplendorosos palácios, tesouros valiosíssimos e tudo o que os seus desejos quisessem satisfazer. Nessa época julgava-se o mais feliz dos homens. Mas como narra a história, só no fim é que se faz o balanço. Só no fim um homem pode atestar da sua felicidade. A Creso salvaram-no, no último momento, da pira ardente, os deuses. O rei persa, Ciro, que o condenou, apiedou-se dele ao escutar os seus derradeiros lamentos. A Sadam, ninguém o escutou, nem os deuses vieram em seu auxílio. Fica a lição. Mais uma vez a história repete-se, ainda que, com ligeiras nuances.

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