sábado, agosto 30, 2008

Portugal, o Hino e o Porvir

“Embora não pareça, o homem, naquilo que tem de criador, não provém do passado e sim do futuro. Provém do futuro, provém da sua expectativa, e dirige-se dele ao presente, isto é, rumo ao presente a partir da convocação que lhe fazem os seus projectos.”

Santiago Kovadloff, “A construção do Presente. Feições filosóficas do conceito de Trauma” in O Estado do Mundo, FCG, Tinta da China, 2006.

Todas as novas nações se fundam no porvir. Quando nascem estão prenhes de futuro, esperança e projectos. Os seus vagidos são gritos do Ipiranga. E enquanto o presente for vivido em função do porvir, tudo avança. (“O mundo pula e avança como uma bola nas mãos de uma criança”, não é verdade?!) E enquanto os Homens viverem o seu presente em função do porvir, os escolhos no caminho serão desafios a transpor. O problema coloca-se a partir do momento em que se enfatiza um passado comum em detrimento de um futuro partilhado. Quando as vozes do passado soam mais forte e as nações se enleiam nas teias da Saudade, os obstáculos no caminho passam a ser considerados problemas e não, desafios. Adquirem uma dimensão quase intransponível. Hesitamos. Quando a Esperança se alicerça nos feitos do passado, vive com a face voltada para trás. O fatalismo instala-se e transforma-se em Fado. O futuro passa a ser constantemente abortado. Vive-se à espera de Dom Sebastião, “quer venha ou não”. Assim é connosco, portugueses. Oiçamos a letra do Hino. Enleados nas teias da Saudade, fatalistas, sem futuro…

É preciso refundar Portugal. Precisamos viver um novo presente, já não em função do passado, mas fundado no porvir.


Discover Carlos Paredes!

sexta-feira, agosto 29, 2008

Quanto à Rússia, afinal o Ocidente pode estar tranquilo

Enquanto a Rússia for governada por oligarcas neoliberais e cleptocratas, o Ocidente pode estar tranquilo. Por um lado, é possível comprar a paz receptando os recursos resultantes do saque que estão a realizar em solo russo; por outro lado, os oligarcas russos têm como último interesse o seu próprio poder e riqueza, e estes dependem em grande parte da manutenção dos seus clientes ocidentais: não vão, por isso, matar a “galinha dos ovos de ouro”. Os americanos já o perceberam e ameaçam tudo fazer para retirar a Rússia do G7 e da Organização Mundial de Comércio, caso os russos mantenham a ocupação da Geórgia. Os dirigentes russos já vieram dizer que não temem o isolamento mundial, mas estão completamente desarmados face aos seus reais interesses. Estão a fazer “bluff”.

O melhor negócio do mundo

O melhor negócio do mundo é o que nunca vai à falência. De acordo com o economista Silva Lopes e com o analista e especulador financeiro George Soros - quando se pronunciaram acerca da actual crise financeira mundial - os grandes bancos não podem falir e o Estado tudo deve fazer para impedir a sua queda, nem que seja à custa dos contribuintes. É este o neoliberalismo em que vivemos mergulhados. Quando a coisa dá para o torto, que sejam os contribuintes a pagar as aventuras especulativas dos bancos na economia de casino que vai alastrando pelo globo. É este o sistema económico que alimenta a injustiça social através da transferência de recursos dos contribuintes para os especuladores. É assim que o Estado joga o jogo dos neoliberais. É assim que enriquecem homens como George Soros ou Joe Berardo, ainda que acenem com a bandeira da liberdade (cada vez mais utilizada como uma cenoura) ou pisquem o olho à populaça. É assim que a democracia se transforma em cleptocracia.

Se os grandes bancos não podem ir à falência, então que se nacionalizem.

quinta-feira, agosto 28, 2008

A Ideologia Dominante

Querem fazer-nos crer que a ideologia morreu, que já não marca os nossos dias. Nada mais falso. Hoje há uma ideologia dominante que respiramos quase sem nos darmos conta. E por ser única e generalizada, tende paradoxalmente a passar despercebida por muitos. Parecemos ignorá-la, da mesma forma que um peixe ignora o oceano em que se encontra mergulhado. Tal como o marxismo, que teve os seus pais em Marx e Engels, a ideologia dominante tem os seus: Alfred Marshall, William Stanley Jevons e Leo Walras. Na segunda metade do século XX esta ideologia foi reavivada por homens como o filósofo político austríaco Friedrich von Hayek e o economista Milton Friedmann, que a fizeram emergir à primeira queda do keynesianismo. O neoliberalismo domina agora o nosso quotidiano e o nosso mundo e a sua pedra basilar é a liberdade individual, sendo o individualismo a sua expressão mais extremada. Daí a crise das ideologias que assentavam os seus princípios na igualdade, na solidariedade e na acção colectiva.

quarta-feira, agosto 27, 2008

Alexis de Tocqueville e a industrialização da cultura

Alexis de Tocqueville calcorreou as estradas da América no século XIX, e fez uma análise acutilante da jovem democracia americana em contraposição às aristocracias europeias. A sua análise foi tão precisa que ainda hoje é valida. Na sua viagem, Toqueville assistiu à democratização de uma sociedade e à industrialização (massificação) da cultura. A massificação da cultura foi paralela à emergência das sociedades industriais. Sem menosprezar as qualidades da democracia, Tocqueville constatou que, no geral, se verificava um empobrecimento da cultura nas sociedades industriais e democráticas relativamente à das sociedades aristocráticas.

Desde então a cultura americana difundiu-se pelo mundo, tornou-se global. Ao nível cultural os resultados desta difusão são evidentes: um aumento exponencial da produção cultural e uma perda de qualidade que se aprofunda com o caminhar dos tempos. Se atentarmos ao caso da literatura em Portugal, por exemplo, basta uma simples comparação entre as actuais obras e as que eram escritas no aristocrático século XIX e nos séculos precedentes para verificar essa degradação. O mesmo se pode verificar em muitos outros países, alvos da massificação cultural trazida pela industrialização e pela mercantilização da cultura.

Abaixo transcreve-se a análise comparativa de Tocqueville entre a literatura dos tempos democráticos (e industriais) e a dos tempos aristocráticos. A profusão literária dos nossos dias reflecte o fenómeno descrito por Tocqueville.

«A democracia não somente faz estender o gosto pelas letras às classes industriais; ela introduz o espírito industrial no seio da literatura.


Nas aristocracias, os leitores são difíceis e pouco numerosos; nas democracias, é menos difícil agradar-lhes, e o seu número é prodigioso. Daqui decorre que, nos povos aristocráticos, não se deve esperar a celebridade literária sem o concurso de esforços enormes, e que tais esforços, que podem conferir muita glória, não trarão, no entanto muito dinheiro; ao passo que, nas nações democráticas, um escritor pode gabar-se de obter sem dificuldade um renome medíocre e uma grande fortuna. Para isso, não é necessário que o admirem bastando tão-somente que o aprovem.

A turba sempre crescente dos leitores e a sua necessidade contínua de novidades asseguram a venda de livros que de modo nenhum estimam.


Nos tempos de democracia, o público age frequentemente com os autores como de ordinário os reis com os seus cortesãos. De que mais precisam as almas banais que nascem nas cortes, ou que são dignas de aí viver?

As literaturas democráticas abundam sempre desses autores que não vêem nas letras mais que uma indústria, e, por um punhado de grandes escritores que aí se vislumbram, podem contar-se aos milhares os vendedores de ideias.»


Alexis de Tocqueville, Da Democracia na América, Capítulo III

segunda-feira, agosto 25, 2008

A maioria silenciosa e as minorias ruidosas

Contramanifestação da Direita a 31 de Maio de 1968.
A maioria silenciosa manifestou-se e a “revolução” terminou.
São as maiorias silenciosas que sustentam as minorias ruidosas. Não existem extremistas, radicais, revolucionários bem sucedidos, sem um núcleo pacífico que tacitamente os apoie. Paz não significa, necessariamente, neutralidade. Sem o apoio da maioria silenciosa, as minorias ruidosas perdem sustentação e as suas causas não vingam. Por essa razão, qualquer guerra contra o terrorismo estará condenada à partida se visar apenas as franjas e deixar incólume o grande cerne que as alimenta continuamente. O nazismo só foi derrotado quando a sociedade que o suportava foi violentamente desbaratada. A sociedade alemã que emergiu da IIª Guerra Mundial foi uma nova sociedade, embora feita com alguma massa da velha. Muitos dos funcionários que serviram a máquina burocrática nazi, passaram a laborar na nova sociedade, nascida das cinzas da antiga.

Contudo, aos revolucionários opor-se-ão sempre conservadores. Não há acção sem reacção e vice-versa.

sábado, agosto 23, 2008

Olímpicas

Nastia Liukin (EUA): a elegância de um cisne.


Yang Yilin (China): leve como um pássaro.

Shawn Johnson (EUA): agilidade felídia.

sexta-feira, agosto 22, 2008

Jogos Olímpicos


Os bens passam de um para outro humano,

e, com a ajuda dos deuses, muitos são

os caminhos que levam à prosperidade.

Píndaro, Olímpicas, VIII

quinta-feira, agosto 21, 2008

Nelson Évora

foto Thomas Kienzle/AP
[No Ninho de Pássaro]

Vejo que a Vitória te contemplou!

Que os teus alados pés se demorem no alto
E o voo seja longo,

No triplo salto.

Tempos perigosos


…A Grande Guerra de 1914 veio surpreender-me quando eu comentava Tucidides para estudantes de Literae Humaniores em Balliol, e foi então que, de súbito, o espírito se me iluminou. A experiência que então atravessávamos no nosso mundo já tinha sido vivida por Tucidides no dele.
Toynbee, Civilization on Trial

Se considerarmos que a história se repete nas suas macro formas então deveremos ficar apreensivos com os acontecimentos actuais, pela semelhança que apresentam com os que antecederam as grandes e prolongadas guerras do passado. Com efeito a sensação é de déjà vu face aos sinais da actual conjuntura internacional. Também nos assalta uma espécie de assombro; o mesmo que invadiu Toynbee quando se deparou com os acontecimentos que desencadearam a Iª Guerra Mundial. Esperamos que seja déjà vu apenas, que o tempo apague estes sinais e tudo volte à normalidade. Vejamos então as causas deste déjà vu.

A Rússia invade a Geórgia alegando a necessidade de proteger as minorias étnicas da ofensiva desencadeada por este país na região rebelde da Ossétia do Sul. A Geórgia pede, de seguida, auxílio aos EUA e este país assina com a Polónia um acordo visando a instalação de um escudo anti-mísseis. A assinatura deste acordo, já anteriormente anunciado, é realizada agora, como resposta à invasão russa do território da Geórgia. Os russos protelam a retirada e consideram a assinatura do acordo uma provocação e o momento em que se concretiza uma prova das reais intenções dos americanos em relação à Rússia.

Onde é que reside a sensação de déjà vu neste caso? Também a guerra entre Esparta e Atenas relatada por Tucidides começou assim, num território periférico (a ilha de Córcira), e no desencadear de um jogo de alianças e atritos entre cidades-estado que conduziu à guerra entre as duas superpotências de então. A Guerra do Peloponeso durou quase 30 anos e terminou com a derrota de Atenas. Mas existem também semelhanças com outras épocas, mais próximas de nós: Hitler, antes de mandar invadir a Polónia e desencadear a IIª Guerra Mundial em 1939, mandou anexar a Checoslováquia com o pretexto de estar “preocupado” com as minorias alemãs dos montes Sudetas. Preocupações humanitárias portanto.

Mas existem outros sinais preocupantes na Ásia Central e no Médio Oriente: o agudizar do conflito no Afeganistão com o reacender de combates entre talibãs, ainda apoiados nas montanhas do Paquistão, e as forças da NATO – com a recente morte de 10 pára-quedistas franceses nestes recontros - num momento em que se regista um enfraquecimento da situação política no Paquistão, com a recente demissão do presidente pró-Washington, Pervez Musharraf.

A animosidade crescente entre o Irão e os EUA é por seu turno outro foco de tensão na região.

Esta conjugação de acontecimentos remete-nos para o Verão de 2001, pouco antes dos atentados do 11 de Setembro: também nessa altura os combates no Afeganistão entre os talibãs e a Aliança do Norte atingiam uma grande virulência, com a morte, a 9 de Setembro, do carismático líder da Aliança do Norte, Ahmad Shah Massoud. Dois dias depois ocorriam os atentados do 11 de Setembro e iniciava-se a guerra contra o terrorismo a pretexto da qual os EUA invadiram o Iraque.

Vivemos portanto tempos perigosos.

quarta-feira, agosto 20, 2008

Usain Bolt

O homem mais rápido do mundo. Pequim, 2008.

Felizes aqueles a quem cerca a fama gloriosa!

Píndaro, VIIª Ode Olímpica, (Séc. VI - V a. C.)

terça-feira, agosto 05, 2008

Cold Winter

Willem van de Velde the Younger, 1633-1707
É preciso recuperar energias.
A tempestade vai começar em Setembro e já se avistam nuvens no horizonte.

domingo, agosto 03, 2008

sábado, agosto 02, 2008

Babel Pós-moderna, ou, A Falar é que a Gente se Desentende

A história teima em repetir-se.

As torres do World Trade Center implodiram ante os nossos olhos estupefactos. E mais uma vez, a confusão das línguas, das religiões, das civilizações...

Mas se o embargo da torre primordial teve origem divina, a derrocada das torres pós-modernas de Nova Iorque teve origem humana. Nem podia ser de outra forma, pois Deus já não se encontra entre nós, (morreu, não é verdade?!).

Neste mundo abandonado à cacofonia das línguas já ninguém se entende.

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