quarta-feira, abril 09, 2014

Quando a cobiça naufragou

Naqueles dias reinava a cobiça aliada ao poder tecnológico dos europeus. E naquelas terras e águas os europeus eramos nós. Cheios de hubris e vã glória chegávamos e pilhávamos. Tesouros para El Rei D. Manuel I. Era tanta a cobiça que as barcas, quais arcas flutuantes, se afundavam sob o peso dos tesouros pilhados nas industriosas cidades orientais. Foi assim com a Flor do Mar, hoje supostamente descoberta por drones subaquáticos nos mares da Indonésia.

Foi n’A Primeira Aldeia Global, de Martin Page, que tive um vislumbre do valor e magnitude do tesouro que se transportava na Flor do Mar, da cobiça do Vice-Rei, e do naufrágio da carraca à saída do estreito de Malaca.

«Quando chegou a altura da principal força portuguesa regressar à Índia, Afonso de Albuquerque mandou carregar o navio-almirante, a Flor do Mar, com o seu magnífico espólio, e com produtos para o rei D. Manuel I. Os bens destinados ao monarca incluíam duas réplicas, em tamanho real, de elefantes-bebés, feitas de prata maciça e embutidas com jóias, quatro estátuas de leões de ouro, cheias de perfumes raros, e o trono de Malaca incrustado de jóias.

A frota largou através do estreito, com o navio de Afonso de Albuquerque tão carregado que mal se mantinham à tona de água. Quando chegou às águas costeiras de Sumatra, após menos de meio dia de viagem, foi abalado por uma pequena borrasca e afundou-se. Albuquerque e a sua tripulação fizeram-se às jangadas salva-vidas, de onde foram recolhidos e levados para bordo de outros navios. 

Em 1992, a leiloeira de arte Sotheby's, contratada para avaliar o tesouro afundado a preços actuais, calculou esse valor em 2,5 mil milhões de dólares. Não surpreende, assim, que tenha havido tanto interesse em localizar os destroços do navio através do rastreio de satélite, nem tão-pouco o feroz litígio internacional em relação à sua posse legítima, em que Portugal não participa, mas que decorre principalmente entre a moderna Malásia, da qual Malaca é uma capital de província, e a Indonésia, na qual se integra Samatra.»


Martin Page, A Primeira Aldeia Global, 6ª edição, Casa das Letras, 2010. Pág. 162. 

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