Assim é. Concordamos com Henrique
Raposo quando diz que “se tudo fosse relativo,
o canibalismo seria uma questão culinária”, contudo não empregaria o verbo odiar
na asserção “tolerar é respeitar o
“outro” apesar de odiarmos partes da
sua natureza”. Não é preciso tanto, basta não gostar de certas partes da natureza do “outro”, para ainda
assim o tolerarmos e respeitarmos. Nesta questão concordamos mais com Adriano
Moreira que defende, em entrevista ao jornal “i” de 26 de Julho de 2014, que “…o diálogo entre culturas não deve ser baseado na tolerância, mas sim no respeito. A tolerância só é precisa para aquilo de que não gostamos.” Tolerar não é necessariamente respeitar e vice-versa.
Além disso no texto de Henrique
Raposo “A Traição” é realizado um ataque aos excessivamente tolerantes – os Negris,
os Amins, os Ramonets e os Boaventuras deste mundo - que toleram o que não pode
ser tolerado, ou seja, o que atenta contra os Direitos Humanos, em particular, contra
o direito das mulheres no mundo islâmico e contra as islâmicas no mundo
ocidental. Mas neste ataque aproveita para pôr tudo no mesmo saco, realizando
um ataque ideológico, misturando e confundindo o social, o cultural e o
económico. Não conseguiu resistir à tentação e trouxe o neoliberalismo à liça.
Diz Raposo:
«Se a América vivia fascinada com a ideia da globalização como império
invisível, a Europa labutava no mito da globalização assassina. Segundo Negri,
Amin, Ramonet, Boaventura, a “globalização predatória” era a arma que o
Ocidente usava para sugar a riqueza do Resto do Mundo; nós, os pestíferos
ocidentais, estávamos a enriquecer à custa dos não-ocidentais. Quem desafiasse
este mantra era de imediato escorraçado e acorrentado à galé que albergava as
vozes ilegítimas, eurocêntricas, neoliberais.”»
(Henrique Raposo, aqui, sublinhado nosso)
Ora acontece que o neoliberalismo
é, em primeira instância, uma teoria de práticas políticas e económicas (Harvey,
2005: 2):
Neoliberalism is in
first instance a theory of political economic practices that proposes that
human well-being can best be advanced by liberating individual entrepreneurial freedoms
and skills within an institutional framework characterized by strong private
property rights, free markets, and free trade.
Ora não há nada de cultural ou social no neoliberalismo. É político e económico. Pratica-se na China, que nada tem de ocidental, por exemlo. Mas Raposo colou a questão do neoliberalismo ao argumento do relativismo cultural. Ora o problema do neoliberalismo é outro: trata-se de um projecto que só pode ser sustentado, em último grau, pelo autoritarismo, na medida em que a liberdade das massas acaba por ser restringida em favor das liberdades de uma minoria abastada, rica e poderosa (Harvey, 2005:70). Misturar o neoliberalismo com o relativismo cultural é misturar alhos com bugalhos.
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Referência
David Harvey (2005), A Brief History of Neoliberalism, Oxord University Press.
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