Os passeios higiénicos, esporádicos, converteram-se em
rápidas retiradas de meia-hora em direcção ao bunker caseiro. Passeios
tristes, passeios vazios pelas ruas quase desertas.
Hoje vi avós à janela no rés-do chão a conversarem com a pequena
neta acompanhada pelos pais. O casal e a filha estavam encostados ao automóvel
de porta aberta frente à janela. Conviviam assim. Próximos, mas cautelosamente
distanciados, a dois metros da janela. Não queriam aproximar-se mais. Havia risos
que ecoavam na rua vazia vindos dali. A alegria dos avós, dos pais e da neta. Mais
adiante, noutra rua, deparei-me com uma cena idêntica.
Maldito vírus que impõe distâncias entre os entes mais
queridos. Maldito vírus que nos tolhe a liberdade.
Vi também papoilas cujas pétalas eram de um vermelho muito
vivo. Cresciam junto à base de um sinal de trânsito, no meio do estreito
passeio que acompanha a via rápida. Cruzei-me também com um sem-abrigo, um
jovem muito envelhecido, encurvado e cabisbaixo. Pressentia-se o sofrimento.
Não me cruzei com mais ninguém.
Regressei a casa.
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