Não se entende como há pessoas que, em caso de dúvida, e
tratando-se de vidas humanas, ainda assim defendam avançar em vez de esperar, como
manda a precaução.
Certos liberalóides que nem sabem o que uma escola é, opinaram
com toda a ligeireza, que deveriam permanecer abertas, na dúvida em relação ao
mal que tal decisão pudesse causar a quem nela trabalha, estuda, aos seus
familiares e à sociedade inteira. Como se na escola não laborasse um dos grupos
profissionais mais envelhecidos de todos, constituído por muitos e velhos
professores, para não falar dos excelentes auxiliares de acção educativa, afadigados
a toda a hora, a limpar tampos de mesas, cadeiras, teclados de computadores,
baldes do lixo e retretes e a lembrar aos alunos que cubram o rosto com a
máscara, ou a desinfectar-lhes as mãos à entrada da escola. Como se os novos
professores vivessem como monges, em missão e em mosteiros, isolados das suas
famílias e dos seus velhos. Como se as escolas fossem só constituídas por grupos
de alunos e crianças. E como se esses alunos estivessem sempre sentados a dois
metros uns dos outros. Não, não estão. Estão de ombro com ombro, lado a lado,
na mesma carteira, que a lei permite, muitas vezes numa sala abarracada e
apinhada, numa escola não intervencionada, e não no colégio de elite frequentado
pelos filhos deles, que forma elites e não ralés.
Liberalóides que se baseiam nas “sérias dúvidas sobre a
vantagem de tal decisão”, dizem eles, para sustentarem a defesa de uma escola
aberta, que assim é que o mundo avança. Nem que seja para o abismo, dizemos nós,
ou em direcção à doença.
Vantagem!?
A dúvida aqui era se a decisão de manter as escolas abertas poderia
levar ou não, facilmente, à contaminação e morte de mais alguns. O resto são balelas.
Uma dúvida destas não é para brincadeiras. O que manda o
princípio da precaução? Se há dúvidas relativas ao passo que se vai dar quanto
aos elevados danos que o mesmo possa causar, então mais vale estacar e aguardar.
Houve quem sugerisse atempadamente que se prolongasse a
interrupção das actividades lectivas do Natal por mais uma ou duas semanas. Não lhe deram ouvidos. Havia
que causar uma boa impressão, afinal éramos nós os que iriamos presidir,
vaidosamente, ao Conselho da União Europeia. Inchados e impantes anfitriões. Havia
que dar uma boa imagem aos dignatários estrangeiros que nos viriam visitar na
inauguração – um país de sucesso. Alguns saíram de cá contaminados e apoquentados.
Lá foram para o isolamento profiláctico nos seus países natais, acabrunhados.
A casa dos vizinhos (Reino Unido, França, Alemanha, Espanha
entre outros) já ardia e nós nem mangueira nem extintor. Não nos preparámos
atempadamente.
Estirpes inglesa, da África do Sul, do Brasil, anunciadas
aos quatro ventos e nós aguardando que por cá chegasse a inglesa para tomarmos
uma decisão. Que idiotas! Afinal a culpa é do Natal. Pois. Os portugueses
portaram-se mal, dizem eles. Fracos os governantes que culpam os governados. Correm
agora para as vacinas, os políticos.
Esta é a realidade: os decisores não foram prescientes, nem previdentes
e o princípio da precaução veio tarde – o passo já tinha sido por eles dado. Agora
deram o passo atrás, alegando exactamente, o princípio da precaução. Já
fecharam os corredores aéreos com o Reino Unido? Parece que é hoje. O Reino
Unido já fechou os corredores aéreos para Portugal há algum tempo. Prescientes.
O nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros reclamou outra vez, como sempre, da pronta
decisão inglesa. Fechámos os corredores aéreos para o Brasil? Fechámos????
Esta é a realidade: não foram proactivos. Foram sempre,
sempre, reactivos. Reagiram sempre, sempre por arrasto. E desde Março que é
assim.
Culpam agora portugueses, que se portaram mal. Que foram
passear para a praia nos gélidos dias de Janeiro. Não gozem connosco.
E eis-nos agora aqui, no topo do mundo – “o país do mundo
com mais mortes por milhão de habitantes (e continua o 1.º em novos casos)” anuncia
o Expresso, a 22 de Janeiro. Aqui.
Tenham vergonha!