sexta-feira, fevereiro 26, 2010

Pois

O senhor primeiro-ministro nunca foi constituído arguido.” (disse a procuradora-geral adjunta Cândida Almeida)

A candura de Cândida é de enternecer.
É de ir às lágrimas.

Não havia ninguém mais adequado para investigar o caso Freeport?

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Madeira

Funchal, 20 de Fevereiro de 2010

«Todavia, a pequena dimensão destas bacias e das suas ribeiras, aliada aos grandes desníveis e fortes declives das vertentes e à grande inclinação das linhas de água principais, são factores de enorme perigosidade face às cheias. Quando a ilha é assolada por precipitações intensas, as águas delas resultantes são rapidamente canalizadas ao longo da rede de drenagem, engrossando os caudais das ribeiras de forma desmesurada. As ribeiras tornam-se então num formidável agente erosivo, arrancando e transportando blocos de centenas de quilos e sedimentos das mais variadas dimensões: são as “aluviões”, como lhe chamam os Madeirenses. Estas cheias rápidas têm destruído, ao longo do seu historial, pontes, estradas, casas e matado pessoas. A sua perigosidade advém sobretudo da velocidade das águas, dos caudais atingidos, da carga sólida que transportam e da rapidez com que se formam.»

Catarina Ramos, “Recursos Hídricos das Regiões Autónomas” in Carlos Alberto Medeiros (dir.), Geografia de Portugal, Vol. 1, 1ª ed., Círculo de Leitores, Lisboa, 2005.

***

Passada a tragédia é hora de aprender e aplicar o que se aprende. Alguma coisa falhou no planeamento e ordenamento da ilha. Tal é uma evidência. Basta observar o desrespeito pelos leitos das ribeiras e a construção despreocupada e desregrada nas suas margens. E não é só uma questão de povoamento, como alguns nos querem fazer crer.

O crescimento económico da ilha (um dos maiores do País, senão o maior) tem sido acompanhado por um surto de construção sem regras. Um laissez faire, laissez passer urbanístico. Na ilha o crescimento económico parecer ser o valor que mais alto se levanta, como se tornou patente nas declarações do máximo responsável político da região, quando ainda decorria a tragédia: parecia estar mais preocupado com a imagem internacional da ilha e a forma como isso se poderia reflectir no turismo e nas receitas, do que com as vidas humanas que entretanto se perdiam.

domingo, fevereiro 21, 2010

O leviatã de Sloterdijk


Sem ser um paladino do neoliberalismo, Sloterdijk alerta-nos [aqui] para a pilhagem a que a futura geração já está a ser sujeita pela actual, sem que ainda tenha nascido. O perpetrador dessa pilhagem, não é mais nem menos do que o moderno Estado democrático, pelo enorme endividamento que contrai e através dos impostos excessivamente elevados que esmagam a classe produtiva. O imposto é o equivalente funcional a uma expropriação socialista, diz o filósofo.
Segundo Sloterdijk não vivemos sob um sistema capitalista, mas sim num regime semi-socialista, numa economia social de mercado. De acordo com o filósofo, um mundo pós-democrático prepara-se para suceder ao actual, como resultado de uma rebelião civil contra os impostos. Tal rebelião surgirá em resposta a uma situação paradoxal: o desapossamento dos credores devedores pelos devedores credores.
Não é uma situação inaudita: o legislador de Atenas, Sólon, resolveu o problema do excessivo endividamento que atormentava as famílias da antiga cidade-estado ao legislar contra os credores. Sólon conseguiu assim pacificar a sociedade ateniense porque os devedores eram a maioria e os credores a minoria. O legislador de Atenas conquistou o reconhecimento dos seus concidadãos para a posteridade e passou a ser considerado um dos maiores sábios da Grécia antiga.

segunda-feira, fevereiro 15, 2010

O carnaval tropical não passa por aqui


Ah! Triste fado.
Tudo é enfado e corso a passar.
Brasileiras desnudas tiritando ao ar.
E nós em bermudas errando com frio.
Brasileiras jucundas num arrepio.

Pára o cortejo já em retirada.
Que está um bêbado estirado na estrada.

sábado, fevereiro 06, 2010

As amendoeiras floriram! Quais jacarandás!



Posse!

Avisam-se os estimados urbanitas que o animal preto à esquerda não é um touro nem um boi cobridor.

terça-feira, janeiro 26, 2010

A globalização atingiu em cheio o Algarve Oriental

Quando éramos crianças passeávamos alegremente ao lombo de velhos burros, nos verões quentes dos idos anos 70.

Muitas vezes éramos surpreendidos por sonoros zurros que ecoavam nas ruas tortuosas da aldeia. Os grunhidos eram omnipresentes. Bovinos, muares, caprinos e ovinos povoavam os estábulos. As casas, entre estrumeiras e pocilgas, não tinham electricidade nem água canalizada e os fogões ainda funcionavam a lenha. Pendurados nas chaminés secavam chouriços. Ao entardecer as mulheres transportavam cântaros à cabeça e reuniam-se junto às noras, centros de convívio local. Os homens, quando regressavam da lavoura ou das salinas, reuniam-se nas tabernas e bebiam vinho, muitas vezes até à embriaguez. Ao fim da tarde, nos pátios e nos quintais, ouvia-se a algaraviada da gente feliz. Candeeiros a petróleo alumiavam as noites estreladas. A civilização rural ainda fervilhava nas aldeias do Algarve Oriental, sem pressentir que estava à beira do fim.

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Volvidos 40 anos, tudo mudou.

Os campos de golfe invadiram a arcádia algarvia. Antigos montes convivem agora com moradias de 500 000 euros e mais.

segunda-feira, janeiro 25, 2010

Para lá do horizonte, dançam criaturas bisonhas

Max Ernst, The Fireside Angel, 1937

Um horizonte onírico, claro está.

E voltamos ao mesmo

Se é verdade que a crise económica e financeira abalou o neoliberalismo, também é verdade que não constituiu o seu fim. O capitalismo, por sua vez, está longe do seu estertor porque as crises fazem parte da sua natureza. O neoliberalismo é apenas uma forma de capitalismo, tal como o keynesianismo o foi, antes da década de 70.

Ultrapassados os dias de tempestade financeira e na iminência de soprarem ventos bonançosos, o comportamento dos governantes altera-se novamente e rapidamente se esquecem das intenções que manifestaram, com veemência, nos dias de aflição. Não terminaram com os paraísos fiscais onde os ricos e as empresas mais lucrativas depositam os lucros, furtando-se ao dever de contribuírem através dos impostos para o progresso social e para todos os esquemas de solidariedade social e redistribuição de riqueza (essas empresas são contudo, as primeiras a apelar ajuda ao Estado, nos momentos de maior aflição financeira).

Voltámos portanto à economia de casino, irresponsavelmente. Iniciou-se a distribuição de bónus chorudos aos especuladores (gestores e accionistas) pelas maiores instituições financeiras norte-americanas, das quais a Goldman Sachs é um exemplo. Não estão no entanto ainda saldadas as suas dívidas para com os contribuintes e o Estado. Obama bem tenta moralizar os mercados, mas o capitalismo é uma hidra de muitas cabeças. Ainda que seja o Presidente e chefie o governo dos EUA, não consegue levar a sua reforma do sistema de saúde a bom porto. Os conservadores e as empresas seguradoras opõem-lhe uma resistência tenaz.

A cada crise capitalista reforça-se a acumulação e a concentração da riqueza. As empresas mais resistentes, ficam maiores pelas aquisições e fusões que realizam. Acentuam-se as desigualdades entre ricos e pobres e a sociedade torna-se progressivamente mais polarizada e desequilibrada: a uma poderosa minoria de ricos opõe-se uma larga maioria de pobres, que engrossa cada vez mais.

Chegámos agora ao ponto de o crescimento económico se tornar independente do emprego, ou seja, o crescimento económico é hoje possível com desemprego crescente. Desactualiza-se então o discurso dos políticos e economistas neoliberais, que vêem no crescimento económico a panaceia para o desemprego e para a saída da crise social. Ainda que a crise económica possa ser ultrapassada, a crise social persiste. O sistema económico capitalista serve por isso, cada vez menos, porque agrava as disparidades sociais em vez de as resolver.

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