sexta-feira, dezembro 16, 2011

Onde pus a esperança

Onde pus a esperança, as rosas
Murcharam logo.
Na casa, onde fui habitar,
O jardim, que eu amei por ser
Ali o melhor lugar,
E por quem essa casa amei -
Decerto o achei,
E, quando o tive, sem razão para o ter


Onde pus a feição, secou
A fonte logo.
Da floresta, que fui buscar
Por essa fonte ali tecer
Seu canto de rezar -
Quando na sombra penetrei,
Só o lugar achei
Da fonte seca, inútil de se ter.


Para quê, pois, afeição, esperança,
Se tê-las sabe a não as ter?
Que as uso, a causa para as usar,
Se tê-las sabe a não as ter?
Crer ou amar -
Até à raiz, do peito onde alberguei
Tais sonhos e os gozei,
O vento arranque e leve onde quiser
E eu os não possa achar!

Fernando Pessoa

***

Eis o estado de espírito do dia traduzido num poema. Uma derrota profunda.
A derrota da esperança.

Existem dias assim.

domingo, dezembro 11, 2011

O escravo e o senhor

A autolibertação do escravo deveria conduzir necessariamente, segundo uma dialéctica ideal, à libertação do senhor, das coerções do ser-senhor.

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica, Relógio D’Água, pág. 70


Nunca pensamos desta forma. Parece até ridículo, pensar que o senhor é, de certa maneira, um coagido, e que a coacção que sobre ele se abate equivale à sofrida pelo escravo no campo oposto. Mas parece que um certo tipo de coacção existe sobre a condição de ser-senhor: até Deus está condenado a ser imortal (dizia Agostinho da Silva) e o Destino é mais forte do que os deuses (diziam os antigos gregos). Serão os deuses, por isso, também coagidos pelo Destino? Também o carrasco, diz George Steiner, “tortura a sua vítima e condena-se desse modo a ser uma eterna vítima.” Steiner, enquanto judeu, sabe bem do que fala.


Na verdade, em primeira instância, todo o homem é, simultaneamente, escravo e senhor de si mesmo, se considerarmos que a condição de escravatura implica sempre a existência, no campo oposto, das coerções do ser-senhor. Por outras palavras: não existem escravos sem senhores e vice-versa; não existem oprimidos sem opressores. O homem acaba por ser escravo de si mesmo porque está prisioneiro dos seus apetites, paixões e necessidades fisiológicas. Mas, como não pode existir um escravo sem um senhor, então o homem é também senhor de si mesmo, porque pode determinar a todo o momento que não se verga mais aos seus apetites, paixões e necessidades. Pode libertar-se quando quiser, mas essa libertação pode ter um preço. A partir desse momento está aberto o caminho para deixar de ser homem.

Vaticínio

Arrisco! Amanhã, segunda-feira (12-12-2011), os mercados bolsistas, linha avançada das agências de notação, vão começar a metralhar as economias da zona euro. Vai abrir tudo no vermelho (ou então passar ao vermelho, depois de abrir no verde). Uma ofensiva esperada face ao ultimato da S&P, de que iria baixar as notações de mui nobres e poderosos países se não houvesse entendimento e decisões substanciais na cimeira. A desunião da União será vista como um sinal de fraqueza que os lobos financeiros irão tentar aproveitar. O rebanho está agora reunido - mas não unido -, com medo, e uma ovelha negra abandonou o redil (ou o redil será o Titanic e a ovelha negra um rato? Não são eles os primeiros a abandonar o navio?).


A guerra continua: mercados vs Eurozona: e adivinhem quem está na linha da frente. E quem está a ganhar?

Aguardemos! (Oremos?!)

sexta-feira, dezembro 09, 2011

A Europa está sem líderes?!

"A Europa está sem estratégia e sem líderes". (Mário Soares)

Sem líderes?!

Olha aqui o líder.

Ainda alguém tem dúvidas?

Goste-se ou não, é ela quem manda.

Perguntem ao Sarkozy ou ao Cameron (que não quis brincar e foi posto fora da roda).

Ou então perguntem ao Passos, ao Monti ou ao Rajoi.

Enfim, são uns meninos.

A desunião da União

A União Europeia encontra-se perante uma tensão dialéctica entre a velha Europa e a nova Europa. Enquanto não for resolvida esta tensão, o impasse persistirá. Enquanto a União Europeia não se libertar dos fantasmas da velha Europa, jamais será uma Europa nova.


***

A velha Europa assoma-se uma vez mais e, nestes momentos de crise, sussurra aos ouvidos dos europeus e acicata-lhes as consciências. Alguns líderes políticos como James Cameron acenam com o velho linguarejar do veto em nome da defesa dos interesses nacionais (na verdade interesses neoliberais), como se fosse necessário proclamá-lo em alta voz. Teme que o directório franco-teutónico, pela alteração dos tratados, forme uma espécie de Império Continental e a partir daí ameace os interesses britânicos. Voltam a soar mais fortes os clarins dos velhos nacionalismos - Deutschland, Deutschland über alles!”, "Rule, Britannia!", etc. – cantados pela velha Europa na sua cacofonia de línguas que a todos ensurdece e desentende. Instalou-se a desconfiança entre os povos. O som cadenciado das botas cardadas, marchando sob o Arco do Triunfo numa tarde de Junho ainda está presente. Na Europa somos todos estrangeiros, somos todos “outros” e é isso que nos separa. Se nos agarrarmos a isso então é melhor esquecer o projecto de união dos povos desavindos.

Encontramo-nos portanto à beira da desunião, para gáudio dos norte-americanos. Triste espectáculo! É só ligar a CNN e verificar como se comprazem diariamente em parodiar a vitória da velha Europa sobre a nova. Eles começam a acreditar, no seu íntimo, que a União Europeia jamais se converterá nos Estados Unidos da Europa. Os europeus não se entendem. Chegada a hora da verdade, mostram-se divididos e hesitam em dar o passo que poderia levar ao nascimento de uma nova Europa.

domingo, dezembro 04, 2011

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Sócrates (1954 - 2011)

Em 1982 ainda não tinha ouvido falar de Sócrates, o filósofo, e muito menos do político, mas este, já o via passear glorioso pelos relvados. Um futebol inesquecível para jogos inesquecíveis.

Que descanse em paz.

quinta-feira, dezembro 01, 2011

Alvorada na Mancha


Entretanto já começavam a gorjear nas árvores mil espécies de coloridos passarinhos, que nos seus diversos e alegres cantos pareciam dar as boas-vindas e saudar a fresca aurora, que pelas portas e balcões do Oriente ia descobrindo a formosura do seu rosto, sacudindo dos seus cabelos um número infinito de pérolas líquidas, cujo suave licor, banhando as ervas, dava a impressão de serem elas que ressumavam e soltavam um branco e miúdo aljôfar; os salgueiros destilavam maná saboroso, riam-se as fontes, murmuravam os arroios, alegravam-se as selvas e enriqueciam-se os prados com a sua vinda.

Cervantes, Dom Quixote, Vol. II. Livraria Civilização Editora, 1999. Pág. 82-83.

Monasterio de Sal by Paco De Lucía on Grooveshark

Yellowstone

Doces como o algodão doce, as nuvens acariciam as colinas, à revelia de uma árvore só.

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