segunda-feira, dezembro 26, 2011

sábado, dezembro 24, 2011

Feliz Natal

Gentile Da Fabriano, Nascimento de Jesus, 1423

God Rest Ye Merry Gentlemen by Loreena McKennitt on Grooveshark

sexta-feira, dezembro 23, 2011

Ficar ou partir?


Ninguém pode escolher a terra onde nasce e o povo a que pertence. Ninguém pode aceitar o passado do seu país a benefício de inventário, rejeitando os erros e apropriando os êxitos. Mas escolher ficar é um acto de amor.
Adriano Moreira, Da Utopia à Fronteira da Pobreza. INCM. 2011. Página 82

“Que fazer? Marginalizar-se ou cooperar? «Fugir ou aguentar?»
(…)
Mas importa ver os momentos de verdade nas expressões desta alternativa. A marginalização justifica-se, porque quem tem olhos para ver não quer implicar-se nos cinismos insuportáveis de uma sociedade que perde a distinção entre produzir e destruir. Cooperar justifica-se porque o indivíduo tem o direito de se orientar para a autopreservação a médio prazo. Fugir justifica-se, porque com isso se recusa uma coragem estúpida e só loucos se esgotam em batalhas perdidas se houver espaços de refúgio mais favoráveis à existência. Aguentar justifica-se porque a experiência nos diz que todo o conflito meramente evitado acaba por nos apanhar em qualquer ponto de fuga.”

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica. Relógio D’Água. 2011. Página 168.

(Os negritos em ambas as citações são nossos.)

***

Adriano Moreira repete até à exaustão essa ideia de que ficar é um acto de amor. Di-lo expressamente nas páginas 46, 67, 82, 95 e 173 da obra supra citada. Neste país, que desaproveita os seus recursos físicos e, em particular, humanos, ficar é não só um acto de amor, como um acto de coragem. Mas partir, principalmente nas circunstâncias em que partiu a grande maioria dos emigrantes portugueses, nos anos 60 e no início dos anos 70 do século XX, e também naquelas em que hoje muitos partem, é um acto de coragem que está muito muito longe de ser um acto de desamor. Alguém põe em causa o amor que os cinco milhões dos nossos conterrâneos que vivem lá fora nutrem pelo país natal? Partir, faz parte da nossa condição, aliás, sempre fez (por isso a Saudade cresceu entre nós). “Para nascer, Portugal, para morrer, o mundo”, já dizia o Padre António Vieira.

Salazar, a dada altura, tentou estancar a hemorragia humana que abandonava o país porque precisava da gente que estava a escapar-lhe para a enviar para a Guerra Colonial ou para o Tarrafal. Hoje, estamos perante um Governo igualmente cínico, senão o mais cínico de todos (o cinismo parece ser o traço mais vincado deste Governo), que se aproveita desta nossa condição para oportunamente nos apontar a porta de saída. Só falta dizer-nos expressamente: quem está mal que se mude! E fá-lo-á, depois de nos ter esvaziado os bolsos e o futuro.

"Sous Le Ciel De Paris"



domingo, dezembro 18, 2011

De Vaclav Havel


De Vaclav Havel, retemos esta frase, que sublinhámos há 10 anos atrás:

O respeito pelo carácter único de uma qualquer nação, o modo como se desenvolve e, o grau em que cada comunidade decide o seu destino, são determinados em primeiro lugar por aqueles que aí vivem.

Vaclav Havel, Público, 21 de Abril de 2001


Vaclav Havel era, acima de tudo, um democrata. Como é fácil de perceber, hoje, em pleno capitalismo (e não sob regimes comunistas, que Vaclav abominava) já não somos nós a determinar o nosso destino, nem sequer o modo como nos desenvolvemos (pelo contrário, até estamos a empobrecer, à excepção da minoria que se alimenta do nosso trabalho e do nosso empobrecimento).

O nosso destino, como é sabido, é agora determinado pelos mercados, e o poder, hoje, já não reside na política. Indubitavelmente vivemos numa era pós-democrática e pós-política.

Ora é preciso voltar à política e à democracia, para que sejamos nós a determinar novamente, o nosso desenvolvimento e o nosso destino.

sábado, dezembro 17, 2011

.



Petit Pays by Cesária Évora on Grooveshark

Cesária partiu. Entre nós, ficou a voz.

Até sempre.

sexta-feira, dezembro 16, 2011

Onde pus a esperança

Onde pus a esperança, as rosas
Murcharam logo.
Na casa, onde fui habitar,
O jardim, que eu amei por ser
Ali o melhor lugar,
E por quem essa casa amei -
Decerto o achei,
E, quando o tive, sem razão para o ter


Onde pus a feição, secou
A fonte logo.
Da floresta, que fui buscar
Por essa fonte ali tecer
Seu canto de rezar -
Quando na sombra penetrei,
Só o lugar achei
Da fonte seca, inútil de se ter.


Para quê, pois, afeição, esperança,
Se tê-las sabe a não as ter?
Que as uso, a causa para as usar,
Se tê-las sabe a não as ter?
Crer ou amar -
Até à raiz, do peito onde alberguei
Tais sonhos e os gozei,
O vento arranque e leve onde quiser
E eu os não possa achar!

Fernando Pessoa

***

Eis o estado de espírito do dia traduzido num poema. Uma derrota profunda.
A derrota da esperança.

Existem dias assim.

domingo, dezembro 11, 2011

O escravo e o senhor

A autolibertação do escravo deveria conduzir necessariamente, segundo uma dialéctica ideal, à libertação do senhor, das coerções do ser-senhor.

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica, Relógio D’Água, pág. 70


Nunca pensamos desta forma. Parece até ridículo, pensar que o senhor é, de certa maneira, um coagido, e que a coacção que sobre ele se abate equivale à sofrida pelo escravo no campo oposto. Mas parece que um certo tipo de coacção existe sobre a condição de ser-senhor: até Deus está condenado a ser imortal (dizia Agostinho da Silva) e o Destino é mais forte do que os deuses (diziam os antigos gregos). Serão os deuses, por isso, também coagidos pelo Destino? Também o carrasco, diz George Steiner, “tortura a sua vítima e condena-se desse modo a ser uma eterna vítima.” Steiner, enquanto judeu, sabe bem do que fala.


Na verdade, em primeira instância, todo o homem é, simultaneamente, escravo e senhor de si mesmo, se considerarmos que a condição de escravatura implica sempre a existência, no campo oposto, das coerções do ser-senhor. Por outras palavras: não existem escravos sem senhores e vice-versa; não existem oprimidos sem opressores. O homem acaba por ser escravo de si mesmo porque está prisioneiro dos seus apetites, paixões e necessidades fisiológicas. Mas, como não pode existir um escravo sem um senhor, então o homem é também senhor de si mesmo, porque pode determinar a todo o momento que não se verga mais aos seus apetites, paixões e necessidades. Pode libertar-se quando quiser, mas essa libertação pode ter um preço. A partir desse momento está aberto o caminho para deixar de ser homem.

Etiquetas