«A inteligência europeia está agora perante o desafio de transformar a
sua máquina de fabricar destino. Não se trata agora de uma nova reclamação do
Império por um sujeito político pan-europeu com sede em Bruxelas; não competirá
aos Europeus, nem hoje, nem amanhã, brincar aos Romanos pela enésima vez.
Nenhum contemporâneo inteligente pode seriamente interessar-se por um «Leviatã
supranacional» com o nome de União Europeia. (…)
Não se trata já de enformar as potências neoeuropeias por
reivindicações dos modelos da velha Europa (como implicava outrora a simbólica
carolíngia enganadora de Estrasburgo e de Aix-la-Chapelle), mas de substituir o
próprio princípio do Império pela união dos Estados, num acto de criação da forma política que se inserirá na história do mundo.
Na qualidade de federação multinacional,
a Europa tem de afinar um primeiro modelo conseguido por essa entidade
intermédia que falta entre os Estados-nação e as organizações do complexo United
Nations. Tal é o tema incontornável de
uma filosofia política europeia do futuro. Dela se pode dizer desde já que só
pode realizar-se pelo modo de uma filosofia-de-processo do pós –imperialismo.»
Peter Sloterdijk (2008), Se a Europa Acordar. Relógio D’Água.
Pág. 48-49
«O poder que se exerce a partir de Bruxelas sobre a grande Europa
encontra-se agora perante uma escolha. Ou quer passar para um imperialismo mais
ou menos aberto, nomeadamente sob influência de cenários sugestivos que
profetizam uma guerra económica entre os Estados Unidos, o Japão e a Europa,
bem como uma guerra mundial por infiltração do Sul contra o Norte. Ou
compreende que a sua oportunidade reside
na translação do Império para um não-império, uma nova
união de entidades políticas. Se se decidir por um novo Império, perde o
resto da sua alma e provoca o seu próprio desaparecimento por depravação das
três gerações futuras. Apenas com a aliança da ambição e do cinismo, nenhuma
cultura moderna percorrerá nem que sejam cem anos suplementares.»
Peter Sloterdijk
(2008), Se a Europa Acordar. Relógio
D’Água. Pág. 60
***
Passaram alguns anos desde 1994,
data em que foi escrito o texto acima, e a Europa parece querer recuar agora
para um cenário impossível. A constituição de uma federação multinacional parece
não se encontrar na mesa das opções políticas. A falta de arrojo e de liderança
política, a mediocridade e a inépcia política dos líderes europeus, com
destaque para a chanceler Angela Merkel, parecem estar a lançar a Europa para a
desagregação, para a Velha Europa dos Estados-nação rivais. Mas esse tempo já
não existe mais. Estamos a querer voltar a um lugar que não existe. Ao
procurarmos refúgio nessa ideia e nesse tempo, nem ao passado regressamos.
Provocaremos o nosso próprio desaparecimento, como diz o filósofo. Por que
aguardam os líderes para darem esse salto para a federação multinacional?
Aguardarão a voz reivindicativa dos povos? Terão de ser os povos a exigi-lo?
Por agora, a Europa ainda dorme.