Ontem, no programa “Jornal das 9”
da SIC Notícias, Mário Crespo (nem sei como ainda tenho pachorra para o ver) recebeu
Hélder Rosalino, Secretário de Estado da Administração Pública, e antes da
intervenção do Secretário de Estado, lá decidiu introduzir uma peça antiga, de
2010, em que o então Ministro das Finanças e da Administração Pública, Bagão
Félix, argumentava falaciosamente que cerca de 70% da população portuguesa
estaria de alguma forma dependente, directa ou indirectamente, do Estado (!). A
dita peça pode ser vista, ainda que cortada em partes essenciais, que alguém
quis esconder, AQUI.
Onde está a falácia? Está no
facto de Bagão ter omitido que, na verdade, também o Estado depende dos que
para ele trabalham e não só. O Estado, por exemplo, depende tanto do polícia,
do professor, do juiz, da enfermeira, do militar etc., como estes daquele.
Estes homens e mulheres vendem o seu trabalho ao Estado, exactamente porque o
Estado precisa deles e não necessariamente o contrário, como argumentava o “brilhante”
Bagão. Aliás, até os pensionistas, noutros tempos, quando trabalhavam e
descontavam, também o Estado precisava deles e é por isso que agora têm direito
à justa pensão. Mais, alguns dos que realmente dependem, ainda que de
forma indirecta, do Estado, como as crianças ou os estudantes, também desses um
dia o Estado precisará, ora como contribuintes, ora como funcionários ora como futuros
cidadãos.
Mas como agora tudo vale, na
sanha neoliberal de reduzir o Estado ao Estado mínimo, ou se quiserem, de “refundar
o Estado”, não há como começar, desde já, a contaminar a opinião pública com falácias
como a de que o Estado é parasitado por toda a gente, incluindo os que nele trabalham
ou trabalharam e descontaram. Para os falaciosos, o Estado tem de alijar-se destes
parasitas, nem que seja rasgando velhos contratos.
Ora feita a introdução no
programa televisivo do Mário Crespo, estava preparado o terreno para o Secretário
de Estado dar largas à argumentação da necessidade de se proceder a cortes e
mais cortes, que o Estado social, segundo ele e o Ministro das Finanças, é
demasiado luxuoso para as parcas contribuições dos contribuintes portugueses. É
que agora é preciso “refundar” o Estado! Mas como - é o dilema desta gente -
senão cortando nas carnes? É que se cortarem nas gorduras, serão eles, os
amigos, enfim, as nomenklaturas, os atingidos. Então que se lixe a Constituição.
Descobriram agora, dizem eles, que é possível refundar o Estado à revelia da
Constituição. Ainda assim, não deixam de piscar o olho ao PS, para a coisa seja
mais fácil e seja partilhado o prejuízo. O PS percebeu. Pelo menos, assim parece.
Enfim, é coisa para dizer: refundem,
refundem, meus amigos. Cá estaremos nas eleições, se não for antes, para vos
dar um bom chuto no traseiro. Que se lixem as eleições, não é verdade? Pois cá
vos esperamos. Que venham as eleições.