quinta-feira, janeiro 10, 2013

Heraclito, por Séneca

«Os nossos corpos fluem rapidamente como a corrente dos rios. Tudo quanto vês acompanha o veloz fluir do tempo; nada do que vemos permanece idêntico; eu mesmo, enquanto falo na mudança das coisas, já mudei.
É este o sentido da frase de Heraclito: “podemos e não podemos mergulhar duas vezes no mesmo rio”. O nome do rio permanece o mesmo, a água essa já passou adiante. Num rio o fenómeno é mais sensível aos olhos do que num homem, mas não é menos rápido o curso do tempo em nós; por isso me espanta a loucura que nos leva a tanto amarmos essa coisa fugidia que é o corpo, e a temer morrermos um dia quando cada momento é a morte do estado imediatamente anterior. Dispõe-te, portanto, a não recear que ocorra um dia aquilo que continuamente está ocorrendo.»

Séneca, Cartas a Lucílio, Livro VI, Carta 58, Fundação Calouste Gulbenkian, 2007, pág. 205.

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Ler os estóicos. O pensamento de Séneca atravessa o tempo e atinge-me quase dois mil anos depois. Ecoa no meu pensamento. Intemporal, conforta-me no meio desta tempestade contemporânea que atravessamos. Nasceu em Córdova, não muito longe daqui, viveu e escreveu no tempo do Império, no meio da pax romana, mas o seu pensamento adequa-se a todas as tempestades. Ajuda-nos a enfrentá-las, sem medo, de cabeça erguida e em paz connosco e com o mundo, com estoicidade.

Depois da sua breve explicação, alguém duvida ainda que todos os dias nasce um sol novo, como dizia Heraclito? Aquela fornalha a oito minutos-luz daqui, também muda, e não só todos os dias, mas a todos os nanosegundos, e o hidrogénio que queima converte-se em hélio e amanhã, quando voltar a raiar (como se alguma vez tivesse deixado de raiar), já não será por isso o mesmo. Mudará sempre, porque tudo muda. Tudo flui.

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