domingo, outubro 06, 2013

Tangerinas de Tânger, laranjas de Portugal

Quanta história se cruza nas ruas de Tânger – até a fruta que recebeu nome da cidade fala de séculos de intercâmbios comerciais e choques culturais. E por causa das frutas, e da geografia cultural que representam, vem-me à memória uma conversa uma vez num mercado do Irão. Eu que explicava que era de Portugal. O vendedor de fruta mostrou-me uma laranja e sorriu: “Ah, portugália”. O nome para “laranja” em persa era “portugália”.


Tangerinas de Tânger, laranjas de Portugal – e pelo meio um estreito de mar com a largura de um milénio de desconfianças, preconceitos, ódios e guerras. Que estúpidos que são os homens e as coisas em que acreditam.

Gonçalo Cadilhe, África Acima, Oficina do Livro, 2007, pp. 197-198

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O livro de Gonçalo Cadilhe é para ler com o auxílio de um bom atlas ou mapa e de uma lupa, para podermos acompanhá-lo no seu percurso e localizarmos as cidades que atravessa. Li-o num ápice. Consegue transportar-nos para África, é divertido e faz pensar. Agradeço ao autor.

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Curiosamente acabei de ler o livro numa semana marcada pela tragédia (mais uma) que se abateu sobre centenas de africanos que tentavam alcançar a ilha de Lampedusa num barco que ardeu e se afundou. Morreram centenas de imigrantes, incluindo mulheres grávidas. Prenhes de África, esperançosas de Europa. Que problema este. Que tragédia.


Estamos pois, muito longe desse tão apregoado mundo plano, aplanado pela globalização, onde supostamente existiria igualdade de oportunidades para todos. A globalização capitalista não é solução porque gera enormes desigualdades socio-económico-espaciais – polarizações, chamam-lhe os sociólogos - e são estes diferenciais que estão na origem de todos fluxos, no caso, fluxos de desesperados que pagam muitas vezes com a vida, a ousadia de sonharem com outra existência, mais promissora do que a que lhes é oferecida nos poeirentos campos de África.

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