
Carontes bem pagos ajudavam à travessia
agora inversa, do Hades ao Éden, das terras dos mortos para as terras dos
vivos, terras prometidas de vida farta e plena. Então os novos bárbaros começaram
a chegar, ousando atravessar desertos e fossos dantescos, mediterrânicos. Os
novos bárbaros serão os novos europeus (lê-se numa revista), pois claro (afinal
os velhos europeus – nós - também não fomos já velhos bárbaros?).
***
Schengen rebentou como uma
barragem prenhe de água até não poder mais. O descontrolo instalou-se nas
fronteiras externas da “União” e depois nas fronteiras internas. Rios de
imigrantes e refugiados começaram a penetrar os caminhos da Europa em direção
ao Norte. A figura do imigrante clandestino, ilegal, desapareceu. Eram todos
refugiados. Um governo socialista francês fechou os olhos à construção de uma
cidade de barracas num extremo do seu território, frente à fossa mais estreita
e menos profunda, e por isso mais transponível, do Canal da Mancha. Formou-se então
essa enorme “selva” de habitações precárias – uma “selva” em plena Europa
continental, frente a esse outro paraíso mais paradisíaco, aos olhos de quem
procura, não refúgio, mas outra coisa qualquer, que é a Grã-Bretanha. Na
verdade, aqueles refugiados de Nord-Pas-de-Calais, já não fugiam da guerra, não
procuravam refúgio, procuravam sim outra coisa. Pois afinal no paraíso francês
não havia guerra, não é verdade? Então o que procuravam aqueles refugiados?
Não haviam alcançado já a paz nas terras de França? Não se encontravam já distantes
dos infernos terrestres? A constituição da “Selva” em Nord-Pas-de-Calais teve
um efeito desconfortável no subconsciente de muitos dos que viviam além Mancha.
Afinal, meu Deus, meu Deus, o que vinha aí. Epílogo: Venceu o Brexit! O Reino
Unido, desunido, abandona o barco Europeu, qual escaler lançado ao mar em
momento de aflição ou invasão, quando o grande navio já mete água por todo o lado.
***
Meses depois, do outro lado do
Atlântico, vence um Trump. Um grosseiro. Outro rombo no casco do navio
Ocidental.
O Euro afunda-se agora face ao
dólar, na iminência de uma subida das taxas de juro diretoras americanas e a
Itália ameaça uma evasão da zona Euro, aprofundando mais ainda a eterna crise
do Euro. Crise que só terminará, diga-se de passagem, com o fim do Euro. Em
suma: o Euro é a crise.
Por tudo isto são por isso agora
mais sonoros os brados dos profetas da desgraça e das cassandras, anunciando o
fim do Euro e a derrocada do projeto Europeu. O fim de um mundo que se queria
novo e o começo de um novo mundo que afinal é o velho.
The times are changing.
Mas o vento que por aqui sopra, nem cheira bem, nem está de feição.
Mas o vento que por aqui sopra, nem cheira bem, nem está de feição.
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