Quando as predições sobre a apocalíptica escassez de recursos fracassam
reiteradamente, temos de concluir que a humanidade escapou milagrosamente
sucessivas vezes de uma morte certa, como um herói de um filme de acção de
Hollywood, ou que há alguma falha no pensamento que predisse a apocalíptica
escassez de recursos. A falha foi apontada em múltiplas ocasiões. A humanidade
não sorve os recursos do planeta como uma palhinha num batido até que um
borbulhar lhe diga que o recipiente está vazio. Em vez disso, quando as
reservas de um recurso que se extrai facilmente começam a escassear, o seu
preço sobe, levando mais gente a querer conservá-lo, a chegar a depósitos menos
acessíveis ou a encontrar substitutos mais baratos e mais abundantes.
De facto, para começar, é uma falácia pensar que as pessoas «necessitam
de recursos». Do que necessitam são formas de produzir alimentos, deslocar-se,
iluminar as suas casas, exibir informações e outras fontes de bem -estar.
Satisfazem estas necessidades com ideias: com receitas, fórmulas, técnicas,
projectos e algoritmos para manipular o mundo físico a fim de que este lhes
ofereça o que desejam. A mente humana, com a sua capacidade combinatória
recursiva, pode explorar um espaço infinito de ideias e não se encontra
limitada por nenhuma classe de material terrestre. Quando uma ideia deixa de
funcionar, outra pode ocupar o seu lugar. Isto não desafia as leis da
probabilidade, apenas lhe obedece.
É certo que esta maneira de pensar não encaixa bem com a ética da
“sustentabilidade”. (…) A doutrina da sustentabilidade assume que o ritmo
actual de utilização de um recurso pode ser extrapolado para o futuro até se
atingir um tecto. A consequência que implica a dita assunção é que temos de
trocar para um recurso renovável capaz de repor-se indefinidamente à medida que
o vamos usando. Na realidade, as sociedades sempre abandonaram um recurso por
outro melhor, muito antes que o velho se esgotasse. Com frequência se disse que a
Idade da Pedra não terminou porque o mundo ficou sem pedras, e outro tanto cabe
dizer da energia.
Steven Pinker (2018), Enlightenment, now!
[Tradução nossa]
Pinker é um optimista. Tem fé na
Razão, no Progresso, na Ciência e na Tecnologia. Tem fé nos valores do
Iluminismo. Tem fé no Homem. Ao contrário de Heidegger, que diz que só um deus nos
pode salvar, Pinker defende que o Homem pode salvar-se a si mesmo, caso se guie
pelos valores do Iluminismo. A Razão, o Progresso, a Ciência e a Tecnologia
poderão salvar-nos de qualquer apocalipse
previamente anunciado, assim o Homem se empenhe e disso sinta
necessidade, pois a necessidade aguça o engenho. O problema é que a Razão, o
Progresso, a Ciência e a Tecnologia são facas de dois gumes, em que um cortará
mais do que outro se forem perseguidos sem Ética. O Progresso pode ser a bomba
atómica e à sua sombra, em tempos, defendeu-se o eugenismo, só para dar dois
exemplos. Mas também é verdade que o Progresso evitou uma catástrofe malthusiana,
salvando milhões da fome, permitiu à Humanidade conciliar procedimentos para evitar a depleção da camada de ozono, contribuiu para aumentar a esperança
média de vida no mundo, para baixar a mortalidade infantil e para tratar e
curar doenças no passado incuráveis. O Progresso contribuiu para diminuir o
sofrimento humano. Pinker acredita em tudo isto, defendendo que hoje se
sobrevaloriza o que é negativo, desde as alterações climáticas ao esgotamento
dos recursos naturais e aos anúncios de extinção de espécies ou de uma sexta
extinção em massa…e que se está a subvalorizar a capacidade humana de superação
de problemas e obstáculos, mediante a Ciência e a Tecnologia, pelo Progresso.
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