domingo, outubro 12, 2008

A quem servem os governos dos Estados?

Criticámos aqui, muitas vezes, as políticas neoliberais do Estado mínimo ou do “menos Estado, melhor Estado”, que vai dar ao mesmo. Contudo nem sempre a maior intervenção do Estado significa maior promoção da justiça social. Basta que, quem esteja ao leme, adopte políticas que favoreçam grupos minoritários poderosos, elites dominantes ou nomenklaturas instaladas, em desfavor da maioria dos cidadãos, que vai sendo dessa forma, desapossada pelos governos dos Estados. O processo é sempre o mesmo: as receitas dos impostos e o património do Estado são colocados ao dispor desses grupos em detrimento das necessidades da maioria. É que o “melhor Estado” do chavão dos neoliberais é o Estado que os serve. A isto chamam alguns empoderamento pelo desempossamento. Ocorre quando os governos colaboram no saque realizado à generalidade dos contribuintes e ao património do Estado, que é de todos os cidadãos, para o canalizarem para grupos sociais dominantes minoritários, concentrando a riqueza e aumentando o seu poder. Temos aqui portanto, uma crise de democracia (*).

(*) Também os nazis parasitaram a democracia para tomarem conta do Estado e o colocarem ao seu serviço (e ao serviço dos grandes empresários alemães da época). Como verdadeiros parasitas que foram, acabaram por matar o hospedeiro.

sábado, outubro 11, 2008

O que se seguirá?

Primeiro foi o imobiliário, depois os bancos e os seguros, agora a indústria automóvel, que já se ressente, fechando fábricas e despedindo operários. Que sector se seguirá?

Tal como em certos concursos de televisão, em que os vencedores que podiam escolher o prémio, desejavam a casa, e depois, assegurada a casa, passavam a solicitar o automóvel, e finalmente, assegurado tudo isso, passava a ser uma viagem o prémio mais desejado, assim são os sectores da economia real, afectados pela economia de casino.

Os sectores da economia real mais atingidos são os que estão relacionados com os produtos e serviços mais valorizados pela classe média e que esta agora sente dificuldade em comprar: as casas, os automóveis. Seguir-se-ão por certo, as viagens. Por fim serão os bens de consumo e os de primeira necessidade.

Instalam-se os cavaleiros do apocalipse da economia: a recessão, a falta de confiança nas instituições... Seguir-se-ão por certo, o desemprego e a inflação, esta desencadeada pela baixa das taxas de juro e pelas injecções maciças de dinheiro (liquidez) no mercado. É só aguardar que façam efeito as medidas desproporcionadas tomadas no momento de pânico.

O mercado livre e não intervencionado só funciona bem nos abstractos modelos dos livros de economia. Já não é credível. Os acólitos do neoliberalismo correm agora, pateticamente, em direcção ao Estado e gritam por planos salvadores que os retirem da alhada em que se meteram.

Apetece dizer: pois o sacro mercado livre que os salve! Desenrasquem-se!

segunda-feira, outubro 06, 2008

No money, no trust!

Afadigam-se os políticos em manter ou elevar a confiança dos consumidores. São agora cautelosos nas palavras, não vá a confiança resvalar. Estão a esquecer-se do essencial: a confiança dos consumidores é directamente proporcional ao volume das suas carteiras. Palavras, leva-as o vento.

Não existem consumidores confiantes, sem dinheiro. Não existem consumidores confiantes, com o desemprego no horizonte. Não existem consumidores confiantes, com trabalho precário. A confiança atinge-se com estabilidade e segurança, seja no trabalho, seja na vida.

As políticas prosseguidas até aqui minaram os fundamentos da confiança e conduziram-nos à actual crise. Grassa a desconfiança na economia, nos políticos e nos partidos. Tenhamos esperança em que a desconfiança não se instale em relação à democracia e à liberdade.

sábado, outubro 04, 2008

Derrocadas económicas: sinais

É curioso.

Pouco antes do colapso da economia soviética, as lojas estavam vazias de mercadorias e os consumidores faziam filas à entrada. Actualmente, com a crise da economia capitalista, as lojas estão repletas de mercadorias e vazias de consumidores.

sexta-feira, outubro 03, 2008

Algo mais que uma crise financeira

Reportar a conjuntura económica actual a uma crise financeira é considerar a questão com demasiada superficialidade. É necessário cavar mais fundo e afastar o pó do pânico bolsista, para que se possam vislumbrar os verdadeiros fundamentos da crise, ou a crise que se esconde por detrás da crise.
Por outras palavras, é necessário ir à origem do verdadeiro problema. E na origem da crise, o que encontramos? Por um lado, aqueles que contraíram empréstimos para a aquisição de uma residência, e que, por vicissitudes várias, não foram capazes de satisfazer os seus compromissos junto dos credores. Por outro lado, os credores sobrestimaram a capacidade de endividamento daqueles a quem concederam empréstimos e que, por vicissitudes várias, acabaram por não receber as prestações que lhes eram devidas. Ora temos aqui um problema de avaliação e de vicissitudes várias, e não de “produtos tóxicos”, como agora alguns lhes chamam para sua conveniência.

O problema reside portanto nas “vicissitudes várias” e não nos mercados financeiros que se limitaram a receber e reflectir as ondas de choque de uma crise mais profunda. E que vicissitudes várias são essas? A perda de capacidade aquisitiva da maioria das famílias e dos consumidores, num sistema económico que sempre se organizou em torno do consumo e da capacidade de consumir.

Quando Henry Ford começou a produzir em série o modelo “Ford T”, engenhosamente, fê-lo a um custo suficientemente baixo para que os seus próprios operários pudessem adquirir o automóvel que estavam a produzir. E o “Ford T” vendeu-se bem para os padrões da época.

Em 1929, a crise foi de superprodução. E embora inicialmente houvesse capacidade aquisitiva, a oferta rapidamente ultrapassou em muito a procura e a crise desencadeou-se.

Actualmente, a crise coloca-se na perda de capacidade aquisitiva da maioria das famílias nos países desenvolvidos, ou seja, há oferta quanto baste, mas a procura está a minguar. Resultado: o escoamento da produção não se faz, porque não há quem a compre. O sector do mercado imobiliário foi o primeiro a ressentir-se, com repercussões no sistema financeiro. Seguir-se-ão os outros sectores da actividade económica.

Ao fomentar a concentração da capacidade aquisitiva em poucos, em detrimento da maioria, o actual sistema económico capitalista (e existem muitas formas de capitalismo) torna-se autodestrutivo e antidemocrático. E ainda que poucos tenham uma grande capacidade aquisitiva, não têm capacidade nem necessidade de consumir tudo o que se produz.

Com o actual sistema económico, capitalista neoliberal, vai engrossando a multidão daqueles que perdem poder de compra, dessapossados, endividados e incumpridores, ao mesmo tempo que a riqueza e o poder se vão concentrando nas mãos de poucos, cada vez mais poderosos, mas incapazes de alimentar um sistema económico que se baseou sempre no consumo de massa.

Pode portanto continuar a produzir-se e a colocar-se à venda no mercado os mais diversos artigos, produzidos a baixo custo em fábricas longínquas, mas está a chegar o dia em que as lojas estarão cheias de produtos e vazias de consumidores. É que já não haverá cá ninguém com capacidade para comprar.

Não são apenas os mercados financeiros que estão em crise, mas sim, o sistema económico capitalista e neoliberal.

terça-feira, setembro 23, 2008

A Propósito das Palavras do Presidente sobre a Derrocada dos Mercados Financeiros

Disse o Presidente Cavaco Silva que a economia de mercado é o pior dos sistemas económicos, à excepção de todos os outros; tal como a democracia relativamente aos outros sistemas políticos. Acontece que neste momento de crise financeira, não é a economia de mercado que está em causa. O que está em causa é uma certa concepção fundamentalista de que o mercado se basta a si mesmo, com o mínimo de regulação na prossecução do bem-estar social; a ideia de que o mercado tende para o equilíbrio se for deixado a si mesmo, funcionando livremente.

O que está em causa é a ideia de “menos Estado, mais mercado”, escondida sob o chavão de “Menos Estado, melhor Estado”.

O que está em causa é a agenda política neoliberal levada a cabo, quer por governos conservadores, quer por governos que se dizem socialistas, mas que há muito colocaram o socialismo na gaveta.

O que está em causa é o neoliberalismo: essa teoria político-económica que defende que o bem-estar social pode ser melhor alcançado através da livre empresa e do empreendedorismo individual, dentro de um quadro institucional caracterizado por fortes direitos de propriedade privada, mercados livres de regulação e comércio livre e desregrado.

Não é portanto a economia de mercado que está em causa. São as políticas assumidas desde o início dos anos 80 até hoje, baseadas na privatização dos lucros e na socialização dos prejuízos, que estão em causa.

Querer fazer-nos crer que o que está a ser posto em causa é a economia de mercado e não as políticas neoliberais, é querer iludir a questão e iludir-nos a todos.

Máximas

1. Não temos que tolerar os intolerantes.

2. O facto de um crime ser cometido por um menor, não faz desse crime, necessariamente, um crime menor.

domingo, setembro 21, 2008

O Desnorte Neoliberal

Assestam agora as suas baterias contra as entidades reguladoras, os que antes defendiam um mercado, o mais possível livre de amarras reguladoras, fosse do Estado, fosse dessas entidades. Os que sempre defenderam o mercado sem qualquer impedimento, vêm agora, em momento de crise financeira, apontar responsabilidades às entidades reguladoras, que segundo dizem, se distraíram e deixaram passar. Mas afinal, onde está o “laissez faire, laissez passer” que defendiam antes? Onde está o princípio neoliberal dos sacrossantos mercados intocáveis?

É evidente que num ambiente que respira os princípios neoliberais do mercado livre, as entidades reguladoras passaram a ter um papel meramente ornamental. Exactamente porque estas entidades defendem o “bom funcionamento” dos mercados, que pela via da doutrina dominante, se querem “livres”. É evidente que as entidades reguladoras se deixaram adormecer na defesa dos interesses dos especuladores que actuam no mercado e não na defesa dos interesses dos cidadãos, que sofrem no bolso os efeitos colaterais das crises financeiras, ainda que não participem nas transacções bolsistas. As entidades reguladoras não têm como vocação a defesa dos interesses dos cidadãos, ao contrário do Estado.

Os responsáveis que encabeçam estas entidades reguladoras, também eles, acabam por adoptar os princípios neoliberais, ao defenderem o meio onde livre campeie a especulação de mercado e os que nele actuam.

Incorre-se contudo num erro ao apontar o dedo às entidades reguladoras que supostamente não funcionaram, quando a responsabilidade deve ser imputada a uma doutrina económica que grassa pelo planeta: a doutrina do "laissez faire, laissez passer" – o neoliberalismo, e aos que, ao abrigo das suas “leis” engordam à custa do incremento exponencial das desigualdades sociais e das disparidades territoriais.

Querem iludir-nos também os que defendem que a ênfase do papel regulador deve ser colocada nas entidades reguladoras e não no Estado, acusando de desnorte os que querem ver no Estado esse papel. Acontece que o interesse das entidades reguladoras são o bem-estar de quem actua nos mercados – os especuladores - e o interesse do Estado deveria ser o bem-estar de todos os cidadãos, a liberdade e a justiça social.

Infelizmente alguns governos jogam também o jogo neoliberal, e acabam por contribuir para uma desigual distribuição da riqueza e para a sua concentração, retirando a todos, através dos impostos, e atribuindo imerecidamente a alguns, através de privatizações (privatização do lucro, claro está). E quando lhes convém, recorrem às nacionalizações para sobrecarregarem toda a sociedade com o prejuízo de alguns (socialização dos prejuízos).

Esta é uma das razões da falácia do neoliberalismo enquanto doutrina económica promotora do bem-estar das sociedades. O neoliberalismo é apenas uma via que leva à transferência da riqueza colectiva para os bolsos de alguns poderosos. Uma espécie de empoderamento pelo desempossamento. O empoderamento de alguns através do desempossamento de todos. Isto tem um nome antigo.

sexta-feira, setembro 19, 2008

Porto de Abrigo

Repousará,
Junto ao grande rio do Sul,
de águas calmas e aconchegantes,
(sempre frescas, mas nunca frias),
Já próximo do mar infinito.

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