sábado, julho 02, 2016

É a geografia, estúpido

Do dia 23 para o dia 24 de Junho o mundo mudou, e a tal ponto mudou que os livros de Geografia terão de ser reescritos e os mapas políticos redesenhados. A União Europeia perdeu um país, mas poderão surgir outros na Europa, e o Reino Unido enfrenta forças centrífugas e forças externas  - as da globalização - que o poderão levar à desagregação.

Mas afinal o que se passou?

Um referendo cujo resultado, claríssimo, determina a saída do Reino Unido da União Europeia. O problema não se encontra, portanto, no resultado do referendo. O problema reside na distribuição geográfica dos resultados. Se o número de votos tivesse sido exactamente o mesmo, mas com uma distribuição geográfica diferente, e revelasse idênticas divisões em todas as nações do Reino Unido, tal como a que se verifica em Inglaterra, então não se colocaria o embaraço que agora se coloca.

O embaraço reside na geografia dos votos, na distribuição dos resultados. Estes mostram uma Inglaterra dividida e uma Escócia unida (o mesmo se poderá afirmar em relação à Irlanda do Norte, também ela unida). 

Fonte: The Guardian 

Um país dividido é um país enfraquecido (virtus unita fortius agit) e o Reino Unido, enquanto tal, encontra-se dividido, enfraquecido e com lideranças contestadas ou em debandada. O país navega agora em águas desconhecidas sem um capitão que o possa comandar, procurando desesperadamente, entre os seus tripulantes amotinados, alguém que possa assumir esse papel. Ora qualquer país nestas condições, quando sujeito a um choque, interno ou externo, corre sempre o risco de se esboroar.

terça-feira, junho 28, 2016

Brexit: qual é a pressa?

O Reino Unido protela a activação do artigo 50.º do Tratado de Lisboa. Seria bom que o fizesse depressa. Mas afinal, qual é a pressa?

A pressa chama-se “juros da dívida” ou dito de outra forma, “government bonds”. Quanto mais tempo a incerteza pairar, maior será a tendência para que os juros das dívidas soberanas subam, com destaque para os países do Sul da U.E. entre os quais o nosso. Se assim for, adivinhe quem vai pagar?

A City foi o primeiro district da Grande Londres, e um dos primeiros do Reino Unido, na noite de 23 de Junho, a declarar “remain”. A City perdeu. Os mercados responderam à afronta, descendo o “rating” da dívida soberana do reino, afundando a libra, baixando as cotações dos bancos ingleses (e não só) e subindo os juros da dívida soberana (do Reino Unido e não só), mas a procissão ainda vai no adro. 

domingo, junho 26, 2016

Sobre o brexit

Os cidadãos britânicos decidiram mal. A democracia directa tem destas coisas. Com o brexit poderão ter desencadeado o princípio do fim de um reino que encerra quatro nações e quiçá o princípio da desunião europeia. O júbilo dos xenófobos, dos populistas, dos separatistas, dos racistas e dos fascistas é a prova simples de que se tratou de uma má decisão. Rejubila Farage, rejubila Trump, rejubila Le Pen, rejubila Wilders, rejubila Erdogan, e até  Jirinóvsky rejubila, lá do alto do assento que tem na Duma. Também já se agitam os separatistas ou independentistas, da Escócia à Catalunha, do País Basco à Lombardia, e em muitos outros lugares, na mira da criação de novos Estados que pretendem governar. É a balcanização da Europa Ocidental que se prenuncia.


Afinal, a globalização que defendiam começa e termina na livre circulação do capital e das mercadorias. A livre circulação do trabalho e dos trabalhadores já lhes causa comichão. Pretendem agora erguer muralhas, muros, barreiras e vedações para travar os que pretendem circular na demanda de uma nova vida, longe da guerra e da fome.

Voltamos ao tempo do proteccionismo, ao tempo em que os países se fecham sobre si mesmos, ao tempo dos bárbaros às nossas portas, ao tempo dos pequenos países que ameaçam surgir por todo o lado como pequenos reinos medievais, ao tempo do medo. Tudo isto cheira, na verdade, a início de Idade Média ou ao fim do Império. Àquele tempo em que os cidadãos abandonaram em debandada as cidades e se encerraram atrás de muralhas, porque tudo mudou inesperadamente. Os bárbaros vinham aí.

sexta-feira, junho 10, 2016


sábado, maio 28, 2016

O Triunfo da Morte


Bruegel, o Velho, O Triunfo da Morte, c. 1562, Museu do Prado

Duas obras, em particular, viriam a possuí-lo [a Elias Canetti], embora com efeitos contrários. O Triunfo da Morte, de Bruegel, parecia confirmar a mensagem de Gilgamesh. A energia da resistência à morte que pulsa nas numerosas figuras da composição invadiu a consciência de Canetti. Embora a morte triunfe, a luta representada dos que a combatem mantém uma dignidade eminente, e é ela que liga todos os homens uns aos outros.
George Steiner
 ____________________

Fonte: George Steiner, in Robert Boyers (org.) George Steiner em The New Yorker, Gradiva, 2010, pág. 338.   

quinta-feira, maio 19, 2016

Odiosa vingança

Levadas ao excesso, as vinganças dos homens tornam-se odiosas aos deuses.

Heródoto
________________________________

Fonte: Heródoto, Histórias – Livro 4º, Edições 70. 2000. Pág. 154.

domingo, maio 15, 2016

Vitória

Vitória da Samotrácia
A Vitória é sempre alada.

Venceu o Benfica.

sexta-feira, maio 13, 2016

Liberdade para escolher

Escolham, escolham livremente. Mas não façam os outros pagar pelas vossas escolhas.

Como contribuinte não estou disposto a engordar os bolsos dos patrões dos colégios privados. Que as minhas parcas contribuições se dirijam à escola pública, onde há gente que precisa de ser apoiada, e que, sem a escola pública, nunca iria à escola.

Se optarem pelo ensino privado (e aqui ninguém vos priva dessa liberdade, ó liberais de pacotilha), então que paguem do vosso bolso. Deixem o bolso dos contribuintes e os escassos recursos financeiros do Estado em paz.

E de uma vez por todas, deixem-se de tretas e de birras, que aqui ninguém vos priva da liberdade para escolher.

quinta-feira, maio 12, 2016

Shit happens!

O livro de Nassim Taleb, O Cisne Negro, volvidas 196 páginas, está a tornar-se maçador. Trata-se de uma repetição ad nauseam do mesmo argumento, com exemplos e mais exemplos. E o que argumenta ele?

Que os cisnes negros existem. Que não se pode prever o imprevisível. Que os improváveis acontecem quando menos se espera. Que há “cisnes negros” por todo o lado. Que algo de improvável pode até estar já em andamento, contudo ainda não adquiriu uma dimensão que lhe dê visibilidade e impacto. Que o que desconhecemos ultrapassa infinitamente o que conhecemos (o velho argumento de Popper, de que nos assemelhamos mais uns aos outros pela infinidade de coisas que desconhecemos do que nos diferenciamos uns dos outros pelo pouco que cada um conhece). Que muitas explicações e certezas relativas à causa dos fenómenos só surgem a ex post facto, e por vezes erroneamente. Que estamos longe, muito longe, de conhecer todas as causas dos fenómenos. Que há causas que nos escapam e sempre escaparão.

Enfim, é a velha história.

Shit happens!

Etiquetas