segunda-feira, dezembro 03, 2012

O peido mais funesto da história universal


Em homenagem ao Sr. Benjamin Netanyahu, que autorizou a construção de três mil casas na parte Leste da Cidade Santa e Cisjordânia, logo após a obtenção do reconhecimento da Palestina como Estado observador não-membro da ONU, com o apoio de 138 Estados, entre os quais Portugal. Como é óbvio, a pacificação da região não se alcança com decisões que implicam a construção de mais colonatos. Pelo contrário, tais decisões acirram mais ainda os ânimos da guerra e os ódios.

O que nos faz pensar que a esta gente – sionistas conservadores do Likud e alguns fanáticos que julgam pertencer ao povo eleito de Deus - tem de ser recordada a sua posição, posição essa que, nem é mais elevada nem é mais baixa do que a posição dos outros povos. Por outras palavras, e para sermos mais exactos, não acreditamos em povos eleitos e abençoados por Deus, ou qualquer deus que seja. Qualquer povo que seja. É claro que muito admiramos Albert Einstein, George Steiner, Stefan Zweig, Hannan Arendt, Eric Hobsbawn, Tony Judt e muitos outros judeus, mas tal admiração não implica que abandonemos essa ideia de que é tão importante, como ser humano, por exemplo, tanto um bosquímano como um judeu, aos supostos “olhos do Senhor”. Aliás, provavelmente a maioria judeus, também não embarca nessa história.

Ainda assim, invocamos aqui uma passagem de um texto de Peter Sloterdijk, que nos remete para outros tempos, quando o orgulhoso e cínico domínio romano na região mostrava aos supostos eleitos de Deus a sua posição naquela época.

Diz o filósofo Peter Sloterdijk:

«O peido, entendido como sinal, mostra que o baixo-ventre está em plena acção e isso pode ter consequências fatais nas situações em que toda e qualquer alusão às esferas desse género é absolutamente indesejada. Ernst Jünger notava no seu Diário Parisiense sobre a leitura de uma passagem da Guerra dos Judeus do historiador Flavius Josephus:

«Voltei a ir dar à passagem que descreve o início da agitação em Jerusalém sob o governo de Cumano. Enquanto os Judeus se reuniam para a festa do pão ázimo, os Romanos colocaram por sobre o pórtico do templo uma coorte a fim de manter a multidão sob observação. Um dos soldados levantou o manto e, voltando com uma reverência irónica o posterior para os Judeus, «emitiu um som indecente correspondente à sua posição». Foi motivo de um conflito que custou a vida a dez mil homens, de modo que podemos falar do peido mais funesto da história universal.» (Strahlungen, II, pp. 188-189)

O cinismo do soldado romano, que se peidou de forma politicamente provocatória e «blasfematória» no Templo, tem um paralelo no comentário de Jünger que faz a transição para o domínio do cinismo teórico.»

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica, Relógio D’Água, 2011, p. 203.

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