Ele [o mundo disfuncional onde nos é dado viver] é caracterizado por um processo, iniciado
de modo mais sistemático no dealbar os anos de 1980, e que se traduz numa
enorme expansão do capital financeiro (suplantando em muito a produção de bens
e serviços da chamada «economia real»). Por outro lado, regista-se um enorme
aumento da concentração de riqueza, a nível global, facilitado pela quase
irresponsabilização da circulação de capitais, com a correspondente perda de peso da componente de rendimentos
do trabalho nas economias nacionais. A globalização permitiu a criação de
uma elite mundial, transnacional, capaz de influenciar ou mesmo determinar as
agendas políticas nacionais e internacionais.
(…)
O «sistema
bancário sombra» (que efectua operações bancárias sem ser submetido à
disciplina do bancos oficiais) movimentou 67 biliões de dólares
norte-americanos em 2011 (111% do PIB mundial).
Viriato
Soromenho-Marques, Portugal na Queda da
Europa, Temas & Debates/Círculo de Leitores, pág. 109
***
O crescimento exponencial da
componente dos rendimentos do capital financeiro no rendimento global
planetário ditou uma desvalorização relativa dos rendimentos do trabalho.
Paradoxalmente, no “mundo
disfuncional onde nos é dado viver”, a acumulação de riqueza é, cada vez mais, independente do trabalho, daí que se assista hoje, mais do que nunca, à
destruição inescrupulosa de estruturas económicas nacionais e à precarização do
trabalho, com as inevitáveis consequências na vida do trabalhador, que,
ironicamente, já empobrece a trabalhar. O trabalhador, no “mundo disfuncional
onde nos é dado viver”, é cada vez mais prescindível. Neste mundo, o
especulador vence em toda a linha. O capitalismo financeiro é mais sedutor do
que o capitalismo industrial e industrioso. O dinheiro enquanto mercadoria é já
a principal variável da equação. Dinheiro gera dinheiro, riqueza gera riqueza.
O trabalho é deixado para trás, enquanto prossegue o processo de concentração
do rendimento e da riqueza.