
Os alemães rejubilam. O seu poder nunca foi tão grande desde a II.ª Guerra Mundial.
Voltar aos mercados o mais brevemente possível. Para os que agora nos governam, esse é o grande desígnio nacional. Se o conseguirmos, acreditam, poderemos continuar alegremente na senda do endividamento. Voltar aos mercados para que passe a haver dinheiro no “pote”! Pobre desígnio. Mal vai um povo quando o suor do seu rosto, do seu trabalho, não lhe basta. Passa então a viver de mão estendida. Perdeu a liberdade.
Só líderes fracos podem acalentar tal desígnio.
Já dizia o Poeta: “Que um fraco Rei faz fraca a forte gente.” (Camões)
Em determinadas circunstâncias de grande esforço vêm-me à cabeça essas primeiras palavras do poema de Lorca: “Que esforço! Que esforço do cavalo para ser cão!” (É que não está na natureza do cavalo ser um cão. Não se pode ensinar um cavalo a ser um cão. Só a morte os transforma, ou pode transformar um no outro. Porque na verdade, nada se perde, tudo se transforma e por isso nada morre. )
Dizem que o cavalo é o mais poderoso símbolo onírico da morte. É, curiosamente, por aí que o poeta começa.
Morte
Que esforço!
Que esforço do cavalo
para ser cão!
Que esforço do cão para ser andorinha!
Que esforço da andorinha para ser abelha!
Que esforço da abelha para ser cavalo!
E o cavalo,
que flecha aguda exprime da rosa!,
que rosa de cinza seu bafo levanta!
E a rosa,
que rebanho de alaridos e de luzes
ata ao vivo açúcar da sua haste!
E o açúcar
que punhais vai sonhando em vigília!
E os punhais,
que lua sem estábulos, que nudez,
pele eterna e rubor andam buscando!
E eu, pelos beirais,
Que serafim de chamas busco e sou!
Porém o arco de gesso,
que grande, e invisível, e diminuto,
sem nenhum esforço!
Garcia Lorca
(traduzido por Eugénio de Andrade, Poesia e Prosa [1940 – 1986], II Volume, 3ª edição aumentada, Circulo de Leitores.
Os poemas de Lorca são como os quadros do Dali. Os seus versos, por vezes, parecem sucessões de imagens surreais. Lorca é o surrealismo na poesia.

Ao ampliar os seus horizontes físicos, o homem sente-se tentado a julgar-se preparado para o acontecimento da Cultura. Porém, conhecer mais nomes célebres e lugares estranhos não desperta o carácter primordial duma cultura, que é o de ser livre de orgulho e dispensado da inteligência de grupo.
Aos pobres e demais classe média.
Esqueçam toda a ascensão social. Esqueçam a prosperidade. Esqueçam a emancipação. Esqueçam o desenvolvimento. Esqueçam a riqueza. Esqueçam a independência. Esqueçam o colectivo. Esqueçam a democracia. Esqueçam a liberdade. Isto é o retrocesso. Voltamos ao passado. Pão e vinho sobre a mesa. É uma casa portuguesa com certeza. Pobrezinhos e austeros. Humildes e pequeninos. Finalmente voltámos ao lugar onde, para alguns reaccionários, nunca deveríamos ter saído. Enfim, voltámos a uma espécie de Estado Novo, agora sob uma nova ditadura: a dos mercados. E pianinho! Sem barulho! Não vão os mercados importunar-se.