Já os dias se abrem, cada vez maiores, e a luz começa a conquistar as sombras e a escuridão. Avançam já a "passinhos de
pardal" para o equinócio primaveril, mas são ainda dias solsticiais.
Boas-Festas a todos os que por aqui passam.
Foi um privilégio e uma
honra ter sido seu aluno no ISEG, quando uma vez por lá frequentei um curso de
pós-graduação. Aprendi com ele, e muito. Economia Urbana e muito mais. As suas prelecções eram para mim um prazer. Os seus ensinamentos ainda me servem na vida
profissional que levo. Já o citei, por vezes, aqui.
«As sociedades modernas excluem
por definição os fracos, os estúpidos, os inúteis, os doentes, os indefesos. O
grande princípio do thatcherismo era essa ideia que estipulava que dadas a
igualdade de condições e oportunidade, todos pisaríamos forte pelo amanhã que
canta do sucesso e do trabalho remunerado. O
thatcherismo esqueceu-se dos que precisam de muletas para caminhar pela vida
fora. A sociedade portuguesa dos últimos anos enriqueceu, e pôs de lado. Chamou-lhe
o custo social do progresso, e pôs de lado.»
Reconheçamos: a Coreia do Norte é
o que mais há de parecido com o pesadelo orwelliano de 1984, mas este modelo de governação neoliberal que agora alastra ao mundo, aproxima-nos cada
vez mais do pesadelo dos Jogos da Fome
de Collins. Este sim, é um verdadeiro caminho para a servidão. Paradoxalmente,
Hayek, que quis afastar-se do caminho para a servidão (*) ao defender um aprofundamento do liberalismo, vê a tentativa de aplicação das suas ideias
ao nível social, económico e político, conduzir-nos também à servidão.
Os extremos tocam-se, não é verdade?!
Há quem lhe chame liberalismo
radical (o Papa Bento XVI), há quem se lhe refira como sendo ultraliberalismo,
outros referem-se à teologia do mercado, outros chamam-lhe neoliberalismo. Outros
fazem manobras de contorcionismo para contornarem a palavra “neoliberalismo”. Mas
que diabo, é só uma palavra, um rótulo (sim sabemos que as palavras são
importantes, contudo não são mais importantes do que os factos). Chamem-lhe o que
quiserem, chamem-lhe "batatas", se quiserem. Os fins e os efeitos da prática desta
doutrina estão à vista de todos e são incontornáveis, ainda que alguns teimem em
chamar-lhe liberalismo tout
court, como se de o mesmo se tratasse. Problema deles.
Há algum tempo atrás, nos idos de
2008, Vasco Pulido Valente (VPV) anunciava no Público que vivíamos numa Era
onde as ideologias já não tinham lugar. Em curtas palavras, lembrava-nos a
morte das ideologias. Esqueceu-se porém da ideologia dominante, nascida das
cinzas das lutas ideológicas: o neoliberalismo (sabemos que muitos não
ousam qualificá-lo como uma ideologia, preferindo chamar-lhe doutrina, enfim um
anexo do capitalismo ou uma forma de capitalismo tardio, mais agressiva e
invasora). O neoliberalismo emergiu das cinzas do fim do conflito entre o
comunismo, enquanto projecto alternativo, e o capitalismo (*) e passou a dominar o mundo, embora tivesse de arrumar primeiro com a
social-democracia e com o welfare state,
que ainda resiste nalguns bastiões. O neoliberalismo não deve ser confundido
com o antigo liberalismo. O neoliberalismo é aquilo em que o capitalismo
dominante, tardio e vencedor, se tornou ou se transmutou. Depois da implosão do
comunismo soviético, que por milagre lhe saiu da frente, foi a social-democracia o
próximo alvo a abater.