sexta-feira, junho 22, 2012

"Scratching The Surface"

Alexandre Farto, Scratching The Surface, 2009

A Grécia perdeu. Viva a Grécia!


A Grécia perdeu com a Alemanha (e o nosso Fernando Santos também).
Mas o grito será ainda o mesmo:

Viva a Grécia!

domingo, junho 17, 2012

O salto em frente da Europa, por cima do abismo da história


«A inteligência europeia está agora perante o desafio de transformar a sua máquina de fabricar destino. Não se trata agora de uma nova reclamação do Império por um sujeito político pan-europeu com sede em Bruxelas; não competirá aos Europeus, nem hoje, nem amanhã, brincar aos Romanos pela enésima vez. Nenhum contemporâneo inteligente pode seriamente interessar-se por um «Leviatã supranacional» com o nome de União Europeia. (…)

Não se trata já de enformar as potências neoeuropeias por reivindicações dos modelos da velha Europa (como implicava outrora a simbólica carolíngia enganadora de Estrasburgo e de Aix-la-Chapelle), mas de substituir o próprio princípio do Império pela união dos Estados, num acto de criação da forma política que se inserirá na história do mundo. Na qualidade de federação multinacional, a Europa tem de afinar um primeiro modelo conseguido por essa entidade intermédia que falta entre os Estados-nação e as organizações do complexo United Nations. Tal é o tema incontornável de uma filosofia política europeia do futuro. Dela se pode dizer desde já que só pode realizar-se pelo modo de uma filosofia-de-processo do pós –imperialismo

Peter Sloterdijk (2008), Se a Europa Acordar. Relógio D’Água. Pág. 48-49

«O poder que se exerce a partir de Bruxelas sobre a grande Europa encontra-se agora perante uma escolha. Ou quer passar para um imperialismo mais ou menos aberto, nomeadamente sob influência de cenários sugestivos que profetizam uma guerra económica entre os Estados Unidos, o Japão e a Europa, bem como uma guerra mundial por infiltração do Sul contra o Norte. Ou compreende que a sua oportunidade reside na translação do Império para um não-império, uma nova união de entidades políticas. Se se decidir por um novo Império, perde o resto da sua alma e provoca o seu próprio desaparecimento por depravação das três gerações futuras. Apenas com a aliança da ambição e do cinismo, nenhuma cultura moderna percorrerá nem que sejam cem anos suplementares

Peter Sloterdijk (2008), Se a Europa Acordar. Relógio D’Água. Pág. 60

***

Passaram alguns anos desde 1994, data em que foi escrito o texto acima, e a Europa parece querer recuar agora para um cenário impossível. A constituição de uma federação multinacional parece não se encontrar na mesa das opções políticas. A falta de arrojo e de liderança política, a mediocridade e a inépcia política dos líderes europeus, com destaque para a chanceler Angela Merkel, parecem estar a lançar a Europa para a desagregação, para a Velha Europa dos Estados-nação rivais. Mas esse tempo já não existe mais. Estamos a querer voltar a um lugar que não existe. Ao procurarmos refúgio nessa ideia e nesse tempo, nem ao passado regressamos. Provocaremos o nosso próprio desaparecimento, como diz o filósofo. Por que aguardam os líderes para darem esse salto para a federação multinacional? Aguardarão a voz reivindicativa dos povos? Terão de ser os povos a exigi-lo?

Por agora, a Europa ainda dorme.

Zona Euro ao fundo


A Zona Euro está organizada (ou deveremos dizer, desorganizada?) como uma espécie de condomínio vertical com dezassete condóminos e, pasme-se, com dezassete administradores. Ora assim não há condomínio que funcione. Para que funcione, tem de haver um só administrador, como é óbvio, ou seja, um só Governo. Caso contrário, a Zona Euro continuará a oferecer o flanco à especulação financeira, que vai explorando as fraquezas deste disfuncionamento.

Neste edifício onde as potências económicas ocupam os andares cimeiros e os países periféricos os andares de baixo, ninguém está a salvo do fogo que vai consumindo já o rés-do-chão. Mais tarde ou mais cedo, os países do topo acabarão por ser atingidos, como peças de dominó que tombam em cadeia.

Até agora não houve um só líder político que confrontasse com seriedade os demais relativamente à opção que tem de ser tomada: ou se desfaz a Zona Euro e voltamos à velha Europa babilónica das nações rivais, ou se avança para uma Federação multinacional, aprofundando-se ainda mais a integração política na União. Assim como estamos, os problemas vão-se avolumando: apaga-se um fogo aqui, surge outro acolá. E disto não saímos.

Embora a crise não se restrinja à Zona Euro, esta, neste contexto, encontra-se bastante fragilizada e por isso é um alvo apetecível para os ataques especulativos (há gente que está a ganhar muito dinheiro com isto, e nós, cidadãos e contribuintes europeus, estamos todos a perder e a pagar, cada vez mais).

A criação da Zona Euro, há que assumi-lo, foi um erro. Mas parece ser um erro que ninguém quer assumir. E agora, o que fazer? Ou se bate em retirada, ou se avança a todo o vapor. Aqui é que não podemos ficar. Parece que só falta a coragem, ou a liderança política que nos tire deste atoleiro. Mas se assim é, nesse caso teremos de ser nós a sair disto. Teremos de ser nós, europeus, a sair pra a rua.

sexta-feira, maio 25, 2012

D. Sebastião libertado


Pediu-nos em tempos que esperássemos…

D. SEBASTIÃO
Esperai! Caí no areal e na hora adversa
Que Deus concede aos seus
Para o intervalo em que esteja a alma imersa
Em sonhos que são Deus.
Que importa o areal e a morte e a desventura
Se com Deus me guardei?
É O que eu me sonhei que eterno dura,
É Esse que regressarei.


                            Fernando Pessoa, Mensagem


***
Ou esperamos, como nos pediu, e aguardamos que regresse para todo o sempre
(nem outra coisa tem feito o povo que adormece, sonhando o sonho, como num encanto).
Ou esquecemos o episódio e encaramos o futuro.


***

D. Sebastião libertado

Acordai! Há muito que sucumbi na hora adversa
Que Deus concedia aos seus,
E finda a alma imersa
Nos eternos sonhos de Deus.
Decidi ficar neste outro mundo,
Agora que Deus morreu.
Jamais regressarei.
Sois livres!

quinta-feira, maio 24, 2012

Nós os novos, construamos uma anarquia portuguesa. Que esperamos?


«Somos incapazes de revolta e de agitação. Quando fizemos uma “revolução” foi para implantar uma coisa igual ao que já estava. Manchámos essa revolução com a brandura com que tratámos os vencidos. E não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; não nos resultou uma anarquia, uma perturbação das consciências. Ficámos miserandamente os mesmos disciplinados que éramos. Foi um gesto infantil, de superfície e fingimento. Portugal precisa dum indisciplinador. Todos os indisciplinadores que temos tido, ou que temos querido ter, nos têm falhado. Como não acontecer assim, se é da nossa raça que eles saem? As poucas figuras que de vez em quando têm surgido na nossa vida política com aproveitáveis qualidades de perturbadores fracassam logo, traem logo a sua missão. Qual é a primeira coisa que fazem? Organizam um partido... Caem na disciplina por uma fatalidade ancestral.
 Trabalhemos ao menos — nós, os novos — por perturbar as almas, por desorientar os espíritos. Cultivemos, em nós próprios, a desintegração mental como uma flor de preço. Construamos uma anarquia portuguesa.»

Fernando Pessoa, in “Crónica da vida que passa”, O Jornal, n.º 6, 8 de Abril de 1915.

***

Fernando Pessoa continua actual. Actualíssimo! Deposita nos novos a esperança. Que perturbem as almas! Que desorientem os espíritos! Que agitem as águas paradas onde as consciências dos velhos portugueses adormecem! Em vez de se lamentarem: “Que parva que eu sou! E fico a pensar, que mundo tão parvo onde para ser escravo é preciso estudar.» Que se ergam! É a sua hora! É hora!

Mas não. Partem... Viram as costas... É mais fácil partir do que mudar... Desolação. Fatalidade. Portugal.

segunda-feira, maio 14, 2012

Sobre as declarações de Passos Coelho acerca do desemprego


Qual é a admiração? Ficaram indignados? Chocaram-se com o que ele disse?! Então ainda não sabiam? Passos é um neoliberal e para um neoliberal, um desempregado é apenas um trabalhador em trânsito entre dois empregos? É assim que ele o vê. É assim que eles o consideram. Reduzem o homem a uma dimensão apenas - o homo oeconomicus - quando um homem é muito mais do que isso. Enfim, tudo reduzem à árida economia e às suas leis do mercado.


Mas não somos nós que o dizemos. É Foucault:

«Em particular, a política neoliberal a respeito do desemprego é perfeitamente clara. Numa situação de desemprego, seja qual for a taxa de desemprego, não se deve nele intervir directamente, como se o pleno emprego tivesse de ser um ideal político e um princípio económico a salvar de qualquer maneira. O que se deve salvar, e salvar antes de tudo o mais, é a estabilidade dos preços. (…) Como diz, penso eu, Röpke, o que é o desempregado? Não é um deficiente económico. O desempregado não é uma vítima social. O desempregado é um trabalhador em trânsito. É um trabalhador em trânsito entre uma actividade não rentável e uma actividade mais rentável. E é tudo sobre acções reguladoras.»

Michel Foucault, Nascimento da Biopolítica, Edições 70. Página 183.
(os destaques são nossos)

E é tudo. (É claro que quando Michel Foucault proferiu esta aula no Collège de France, no dia 14 de Fevereiro de 1979, Passos ainda era um mocinho.)

sábado, maio 12, 2012

A desagregação do cristianismo


«Enquanto o povo judeu foi vencido e disperso e entrou na amarga segunda metade da sua história – em que o seu modelo poderia ter sido mais Ahasver do que David -, o cristianismo prosseguiu a resistência judaica contra o império romano a outro nível. O cristianismo começou por se tornar uma grande escola de resistência, da coragem e da fé encarnada; se o cristianismo fosse na época aquilo que é hoje na Europa, não teria sobrevivido sequer cinquenta anos. Durante o império romano, os cristãos tornaram-se a tropa de elite de uma resistência interior. Ser cristão então significava não se deixar intimidar por nenhum poder no mundo, sobretudo pelos imperadores-deuses romanos arrogantes, brutais e amorais cujas manobras político-religiosas eram perfeitamente conspícuas

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica, Relógio D’Água. 2011. Pág. 298

***

Naquele tempo a morte assomava-se sempre no horizonte. Estava sempre presente e, muitas vezes, aproximava-se sorrateira. A vida terrena era breve. Cristo apareceu então, proclamando a vitória da vida sobre a morte. Essa crença funcionou entre os cristãos como uma espécie de argamassa muito forte que os mantinha unidos: a Fé. Contra a morte e contra o Império. Entravam no circo romano cantando, momentos antes de serem chacinados. Mas não soçobravam. Por isso o Império ruiu.

Hoje a morte está mais distante. Assoma-se na TV. A argamassa da Fé enfraqueceu e o cristianismo também.

A Fé do cristianismo está hoje tão enfraquecida na Europa, que se fosse confrontada com o poder dos imperadores, não sobreviveria sequer cinquenta anos, diz Sloterdijk. Na verdade, o cristianismo já pouca oposição revela face aos novos impérios sem rosto que dominam o nosso mundo.

Parece que ao alinhar tantas vezes com os impérios, foi o cristianismo que enfraqueceu.

domingo, maio 06, 2012

Surpreendidos com a evolução da taxa de desemprego?


O pleno emprego nunca fez parte das prioridades políticas deste governo (isso é coisa de keynesianos). Premeditadamente quiseram criar uma reserva de mão-de-obra suficientemente vasta para que a remuneração do trabalho (o salário) baixasse. A economia ficaria mais competitiva e acabaria mais tarde ou mais cedo por gerar postos de trabalho. Continuamos à espera.

E se um dia o tão propalado crescimento económico advir, qual será a percentagem de crescimento necessária para que o desemprego comece a reduzir-se por essa via? Além disso, pode haver crescimento económico com desemprego. A tendência histórica é para que assim seja, e cada vez mais.

Etiquetas