sábado, dezembro 31, 2011

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Um Bom Ano de 2012!

Little Brown Jug by Glenn Miller Orchestra on Grooveshark

sexta-feira, dezembro 30, 2011

Aldeia de Montesinho (Trás-os-Montes)

© AMCD

Quando a tendência global aponta para a compressão do espaço-tempo, ou seja, para a redução das distâncias relativas (distância-custo e distância-tempo) e dessa forma para a aproximação de todos os lugares do planeta entre si, eis que Portugal decide rumar no sentido oposto, perseguindo o velho hábito medieval da colocação de portagens em quase tudo quanto é via. E assim, a região de Trás-os-Montes torna a ficar mais distante da capital pelo aumento da distância-custo. E se nos quisermos furtar ao custo da distância, calcorreando vias não portajadas para lá chegar, então aumentará a distância-tempo. Não há como escapar. Quando todo o planeta encolhe, Portugal dilata-se. É obra!

segunda-feira, dezembro 26, 2011

sábado, dezembro 24, 2011

Feliz Natal

Gentile Da Fabriano, Nascimento de Jesus, 1423

God Rest Ye Merry Gentlemen by Loreena McKennitt on Grooveshark

sexta-feira, dezembro 23, 2011

Ficar ou partir?


Ninguém pode escolher a terra onde nasce e o povo a que pertence. Ninguém pode aceitar o passado do seu país a benefício de inventário, rejeitando os erros e apropriando os êxitos. Mas escolher ficar é um acto de amor.
Adriano Moreira, Da Utopia à Fronteira da Pobreza. INCM. 2011. Página 82

“Que fazer? Marginalizar-se ou cooperar? «Fugir ou aguentar?»
(…)
Mas importa ver os momentos de verdade nas expressões desta alternativa. A marginalização justifica-se, porque quem tem olhos para ver não quer implicar-se nos cinismos insuportáveis de uma sociedade que perde a distinção entre produzir e destruir. Cooperar justifica-se porque o indivíduo tem o direito de se orientar para a autopreservação a médio prazo. Fugir justifica-se, porque com isso se recusa uma coragem estúpida e só loucos se esgotam em batalhas perdidas se houver espaços de refúgio mais favoráveis à existência. Aguentar justifica-se porque a experiência nos diz que todo o conflito meramente evitado acaba por nos apanhar em qualquer ponto de fuga.”

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica. Relógio D’Água. 2011. Página 168.

(Os negritos em ambas as citações são nossos.)

***

Adriano Moreira repete até à exaustão essa ideia de que ficar é um acto de amor. Di-lo expressamente nas páginas 46, 67, 82, 95 e 173 da obra supra citada. Neste país, que desaproveita os seus recursos físicos e, em particular, humanos, ficar é não só um acto de amor, como um acto de coragem. Mas partir, principalmente nas circunstâncias em que partiu a grande maioria dos emigrantes portugueses, nos anos 60 e no início dos anos 70 do século XX, e também naquelas em que hoje muitos partem, é um acto de coragem que está muito muito longe de ser um acto de desamor. Alguém põe em causa o amor que os cinco milhões dos nossos conterrâneos que vivem lá fora nutrem pelo país natal? Partir, faz parte da nossa condição, aliás, sempre fez (por isso a Saudade cresceu entre nós). “Para nascer, Portugal, para morrer, o mundo”, já dizia o Padre António Vieira.

Salazar, a dada altura, tentou estancar a hemorragia humana que abandonava o país porque precisava da gente que estava a escapar-lhe para a enviar para a Guerra Colonial ou para o Tarrafal. Hoje, estamos perante um Governo igualmente cínico, senão o mais cínico de todos (o cinismo parece ser o traço mais vincado deste Governo), que se aproveita desta nossa condição para oportunamente nos apontar a porta de saída. Só falta dizer-nos expressamente: quem está mal que se mude! E fá-lo-á, depois de nos ter esvaziado os bolsos e o futuro.

"Sous Le Ciel De Paris"



domingo, dezembro 18, 2011

De Vaclav Havel


De Vaclav Havel, retemos esta frase, que sublinhámos há 10 anos atrás:

O respeito pelo carácter único de uma qualquer nação, o modo como se desenvolve e, o grau em que cada comunidade decide o seu destino, são determinados em primeiro lugar por aqueles que aí vivem.

Vaclav Havel, Público, 21 de Abril de 2001


Vaclav Havel era, acima de tudo, um democrata. Como é fácil de perceber, hoje, em pleno capitalismo (e não sob regimes comunistas, que Vaclav abominava) já não somos nós a determinar o nosso destino, nem sequer o modo como nos desenvolvemos (pelo contrário, até estamos a empobrecer, à excepção da minoria que se alimenta do nosso trabalho e do nosso empobrecimento).

O nosso destino, como é sabido, é agora determinado pelos mercados, e o poder, hoje, já não reside na política. Indubitavelmente vivemos numa era pós-democrática e pós-política.

Ora é preciso voltar à política e à democracia, para que sejamos nós a determinar novamente, o nosso desenvolvimento e o nosso destino.

sábado, dezembro 17, 2011

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Petit Pays by Cesária Évora on Grooveshark

Cesária partiu. Entre nós, ficou a voz.

Até sempre.

sexta-feira, dezembro 16, 2011

Onde pus a esperança

Onde pus a esperança, as rosas
Murcharam logo.
Na casa, onde fui habitar,
O jardim, que eu amei por ser
Ali o melhor lugar,
E por quem essa casa amei -
Decerto o achei,
E, quando o tive, sem razão para o ter


Onde pus a feição, secou
A fonte logo.
Da floresta, que fui buscar
Por essa fonte ali tecer
Seu canto de rezar -
Quando na sombra penetrei,
Só o lugar achei
Da fonte seca, inútil de se ter.


Para quê, pois, afeição, esperança,
Se tê-las sabe a não as ter?
Que as uso, a causa para as usar,
Se tê-las sabe a não as ter?
Crer ou amar -
Até à raiz, do peito onde alberguei
Tais sonhos e os gozei,
O vento arranque e leve onde quiser
E eu os não possa achar!

Fernando Pessoa

***

Eis o estado de espírito do dia traduzido num poema. Uma derrota profunda.
A derrota da esperança.

Existem dias assim.

domingo, dezembro 11, 2011

O escravo e o senhor

A autolibertação do escravo deveria conduzir necessariamente, segundo uma dialéctica ideal, à libertação do senhor, das coerções do ser-senhor.

Peter Sloterdijk, Crítica da Razão Cínica, Relógio D’Água, pág. 70


Nunca pensamos desta forma. Parece até ridículo, pensar que o senhor é, de certa maneira, um coagido, e que a coacção que sobre ele se abate equivale à sofrida pelo escravo no campo oposto. Mas parece que um certo tipo de coacção existe sobre a condição de ser-senhor: até Deus está condenado a ser imortal (dizia Agostinho da Silva) e o Destino é mais forte do que os deuses (diziam os antigos gregos). Serão os deuses, por isso, também coagidos pelo Destino? Também o carrasco, diz George Steiner, “tortura a sua vítima e condena-se desse modo a ser uma eterna vítima.” Steiner, enquanto judeu, sabe bem do que fala.


Na verdade, em primeira instância, todo o homem é, simultaneamente, escravo e senhor de si mesmo, se considerarmos que a condição de escravatura implica sempre a existência, no campo oposto, das coerções do ser-senhor. Por outras palavras: não existem escravos sem senhores e vice-versa; não existem oprimidos sem opressores. O homem acaba por ser escravo de si mesmo porque está prisioneiro dos seus apetites, paixões e necessidades fisiológicas. Mas, como não pode existir um escravo sem um senhor, então o homem é também senhor de si mesmo, porque pode determinar a todo o momento que não se verga mais aos seus apetites, paixões e necessidades. Pode libertar-se quando quiser, mas essa libertação pode ter um preço. A partir desse momento está aberto o caminho para deixar de ser homem.

Vaticínio

Arrisco! Amanhã, segunda-feira (12-12-2011), os mercados bolsistas, linha avançada das agências de notação, vão começar a metralhar as economias da zona euro. Vai abrir tudo no vermelho (ou então passar ao vermelho, depois de abrir no verde). Uma ofensiva esperada face ao ultimato da S&P, de que iria baixar as notações de mui nobres e poderosos países se não houvesse entendimento e decisões substanciais na cimeira. A desunião da União será vista como um sinal de fraqueza que os lobos financeiros irão tentar aproveitar. O rebanho está agora reunido - mas não unido -, com medo, e uma ovelha negra abandonou o redil (ou o redil será o Titanic e a ovelha negra um rato? Não são eles os primeiros a abandonar o navio?).


A guerra continua: mercados vs Eurozona: e adivinhem quem está na linha da frente. E quem está a ganhar?

Aguardemos! (Oremos?!)

sexta-feira, dezembro 09, 2011

A Europa está sem líderes?!

"A Europa está sem estratégia e sem líderes". (Mário Soares)

Sem líderes?!

Olha aqui o líder.

Ainda alguém tem dúvidas?

Goste-se ou não, é ela quem manda.

Perguntem ao Sarkozy ou ao Cameron (que não quis brincar e foi posto fora da roda).

Ou então perguntem ao Passos, ao Monti ou ao Rajoi.

Enfim, são uns meninos.

A desunião da União

A União Europeia encontra-se perante uma tensão dialéctica entre a velha Europa e a nova Europa. Enquanto não for resolvida esta tensão, o impasse persistirá. Enquanto a União Europeia não se libertar dos fantasmas da velha Europa, jamais será uma Europa nova.


***

A velha Europa assoma-se uma vez mais e, nestes momentos de crise, sussurra aos ouvidos dos europeus e acicata-lhes as consciências. Alguns líderes políticos como James Cameron acenam com o velho linguarejar do veto em nome da defesa dos interesses nacionais (na verdade interesses neoliberais), como se fosse necessário proclamá-lo em alta voz. Teme que o directório franco-teutónico, pela alteração dos tratados, forme uma espécie de Império Continental e a partir daí ameace os interesses britânicos. Voltam a soar mais fortes os clarins dos velhos nacionalismos - Deutschland, Deutschland über alles!”, "Rule, Britannia!", etc. – cantados pela velha Europa na sua cacofonia de línguas que a todos ensurdece e desentende. Instalou-se a desconfiança entre os povos. O som cadenciado das botas cardadas, marchando sob o Arco do Triunfo numa tarde de Junho ainda está presente. Na Europa somos todos estrangeiros, somos todos “outros” e é isso que nos separa. Se nos agarrarmos a isso então é melhor esquecer o projecto de união dos povos desavindos.

Encontramo-nos portanto à beira da desunião, para gáudio dos norte-americanos. Triste espectáculo! É só ligar a CNN e verificar como se comprazem diariamente em parodiar a vitória da velha Europa sobre a nova. Eles começam a acreditar, no seu íntimo, que a União Europeia jamais se converterá nos Estados Unidos da Europa. Os europeus não se entendem. Chegada a hora da verdade, mostram-se divididos e hesitam em dar o passo que poderia levar ao nascimento de uma nova Europa.

domingo, dezembro 04, 2011

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Sócrates (1954 - 2011)

Em 1982 ainda não tinha ouvido falar de Sócrates, o filósofo, e muito menos do político, mas este, já o via passear glorioso pelos relvados. Um futebol inesquecível para jogos inesquecíveis.

Que descanse em paz.

quinta-feira, dezembro 01, 2011

Alvorada na Mancha


Entretanto já começavam a gorjear nas árvores mil espécies de coloridos passarinhos, que nos seus diversos e alegres cantos pareciam dar as boas-vindas e saudar a fresca aurora, que pelas portas e balcões do Oriente ia descobrindo a formosura do seu rosto, sacudindo dos seus cabelos um número infinito de pérolas líquidas, cujo suave licor, banhando as ervas, dava a impressão de serem elas que ressumavam e soltavam um branco e miúdo aljôfar; os salgueiros destilavam maná saboroso, riam-se as fontes, murmuravam os arroios, alegravam-se as selvas e enriqueciam-se os prados com a sua vinda.

Cervantes, Dom Quixote, Vol. II. Livraria Civilização Editora, 1999. Pág. 82-83.

Monasterio de Sal by Paco De Lucía on Grooveshark

Yellowstone

Doces como o algodão doce, as nuvens acariciam as colinas, à revelia de uma árvore só.

sexta-feira, novembro 25, 2011

«The grindadrap»: a estúpida tradição

Nas ilhas Faroé (Dinamarca), mantém-se o ritual de passagem dos rapazes à idade adulta, uma tradição que remonta ao século XI. O ritual é assinalado com a chacina de milhares de golfinhos.

quinta-feira, novembro 24, 2011

O trabalho dos escravos

A sociedade portuguesa precisa de serenidade e de trabalho.” José Relvas, Ministro-Adjunto e dos Assuntos Parlamentares à SIC em 24-11-2011

«Nunca ninguém me ouvirá a desincentivar a mobilização, mas, se reconheço a importância de se exprimirem, também reconheço bem como é importante para Portugal encontrar uma saída para a crise que resulta do nosso trabalho» Pedro Passos Coelho à SIC Notícias, 23-11-2011

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É fácil concordar com estas afirmações. Afinal parecem querer dignificar o nosso trabalho, o trabalho dos portugueses. Quem se opõe à dignificação do trabalho? O problema é que estes senhores valorizam o trabalho no discurso mas desvalorizam-no nas acções e nas medidas governativas que tomam. Ora as acções são mais reveladoras do que as palavras.

Se dizem valorizar tanto o trabalho, então por que razão tomam medidas que o desvalorizam? Por que razão baixam a remuneração do trabalho? Por que razão subtraem salários aos trabalhadores? Por que razão desincentivam o trabalho? (Ou será que se incentiva o trabalho pagando menos a quem o oferece?) Por que razão desincentivam as horas extraordinárias, desencorajando aqueles que gostariam de trabalhar mais? Por que razão desincentivam o trabalho nocturno? Por que razão não promovem o trabalho, na verdade? (É a crise, dizem, como se fossem os que sempre trabalharam os responsáveis por esta situação. Na verdade, onde estão os responsáveis?).

Se bem percebemos, querem que trabalhemos o máximo contra a mínima remuneração possível. Levando esta ideia ao extremo, para esta gente, o ideal seria que trabalhássemos sem nada receber. Zero! De graça, sem qualquer remuneração!

Não saberão que o trabalho é um meio e não um fim? Será que pensam e sentem como os cínicos que mandaram escrever no cimo dos portões dos campos de concentração “Arbeit macht frei”? Também diziam glorificar o trabalho, não é verdade? O trabalho dos escravos, que afinal não libertava coisa nenhuma.

quarta-feira, novembro 23, 2011

A argentinização de Portugal


(excerto do quadro Índice de Desenvolvimento Humano e seus Componentes, Human Development Report 2011, UNDP, 2011)

(Clique em cima do quadro para ampliar)

Prossegue a argentinização de Portugal. “Cavallo”* já temos: o nosso Ministro das Finanças. Mas porque digo eu isto? Há muito que navegamos rumo ao empobrecimento. Caímos em espiral no ranking de Índice de Desenvolvimento Humano do PNUD. Há sinal mais evidente do que este? Em 1999, há 12 anos portanto, Portugal ocupava o 28º lugar e países como a Hungria ou a Polónia, há pouco saídos do comunismo, estavam abaixo (a Hungria ocupava o lugar 47º e a Polónia o 44º). Não foi preciso mais de uma década para que nos ultrapassassem: hoje Portugal ocupa o 41º lugar, a Hungria o 38º e a Polónia o 39º (para não falar doutros países do leste europeu como a República Checa, que ocupava o 36º em 1999 e que agora está em 27º!).
Afinal, parece que o comunismo não foi assim tão mau: o sistema educativo nesses países funcionava melhor do que nos países ocidentais capitalistas e o capital educativo deixado pelos regimes comunistas permitiu que esses países rapidamente recuperassem e ascendessem rumo ao desenvolvimento, quando passaram a viver sob regimes capitalistas e democracias liberais.
Resta saber se esse capital educativo dos tempos comunistas se manterá incólume face ao empobrecimento cultural associado ao consumo de massas capitalista e à decadência dos seus sistemas educativos públicos devido ao desinvestimento neoliberal.
De qualquer forma, a Polónia e a Hungria ultrapassaram-nos e uma das razões é o facto de o tempo médio de permanência no ensino ser maior entre Polacos e Húngaros do que entre nós, como se pode ver pelo quadro acima. Por outras palavras: os polacos e os húngaros são povos mais cultos do que nós.
Por sua vez, a Argentina, país da América do Sul, conhecido por ter embarcado em aventuras neoliberais sob o jugo do FMI, em 1999 estava em 39º do ranking do IDH. Hoje encontra-se no 45º lugar . Nós, para lá caminhamos.
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Notas:
(*) – Alusão ao antigo ministro da Economia argentino, Domingo Cavallo, que tomou medidas draconianas (e cavalares!) de austeridade, afundando ainda mais a Argentina num mar de empobrecimento e desespero.
Já o autor do interessante blogue Equação Base, parece ter outra perspectiva. Contenta-se com o facto de nos encontrarmos entre os países com um nível de desenvolvimento humano considerado "muito elevado", porém a sua análise não tem em consideração a evolução da posição de Portugal no ranking, que nos mostra que estamos a encaminhar-nos para um nível inferior de desenvolvimento. São leituras.

domingo, novembro 20, 2011

Os peões de Wall Street

Wall Street coloca os seus peões nos governos e instituições financeiras da Europa e do Mundo, à revelia dos povos e pela porta do cavalo da democracia. Lucas Papademos, Mario Monti e Mario Draghi são três destes peões.


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E existem muitos mais. Eles andam por aí (António Borges, por exemplo, ex-director do departamento europeu do FMI e ex-vice-governador do Goldman Sachs). Todos têm fortes ligações ao poderoso banco de negócios de Wall Street, qual nova Maçonaria ou Opus Dei, com os seus agentes infiltrados. São uma espécie de fundamentalistas da alta finança. Gente fanática. Há mais fé do que ciência nas suas intenções e acções. Crêem cegamente numa teoria económica que não encaixa na realidade e querem que a realidade encaixe na teoria. A realidade somos nós! Eles são os missionários da nova teologia de mercado. Agentes. Actantes. Lacaios de uma engrenagem gigantesca que os tolhe e que nos quer tolher, arrasadora de democracias, escravizadora de povos. É mais forte do que eles. Não pode ser mais forte do que nós.

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Epílogo

Já somos governados pelos teólogos do mercado. Uma espécie de “Chicago boys” que chegaram ao Governo, pela via democrática, é um facto, mas também pela via da sua mentirosa “política de verdade”, anunciada aos quatro ventos durante a campanha eleitoral. Curiosamente, ou nem por isso, ouvimos hoje da boca de Mariano Rajoi a mesma expressão. Os espanhóis que se cuidem. Não há nada a fazer com esta gente que se julga dona da verdade. São uma espécie de Testemunhas de Jeová da Economia. Fanáticos de mente blindada. Fundamentalistas. A sua crença na teoria económica clássica e neoliberal é tão cega, que julgam que a economia recuperará com a austeridade e que a democracia acabará por funcionar a seu favor.

Bye, bye, Einstein!

Com que então, não há nada mais rápido do que a luz?!

Os neutrinos não só são mais rápidos como são "bem mais rápidos" segundo se diz AQUI.

E assim cai por terra a teoria da relatividade.

Sic transit gloria mundi!

sábado, novembro 19, 2011

O darwinismo do Génesis

O criacionismo é coisa de fundamentalistas protestantes, diz Umberto Eco, e, paradoxo dos paradoxos, o texto em que se baseiam – o Génesis - até é “refinadamente” darwinista. Nos nossos dias, e sabendo o que sabemos hoje, qualquer interpretação literal da Bíblia, como a que realizam os fundamentalistas protestantes, ultrapassa a fronteira da sanidade e da razoabilidade. Mas, por outro lado, a leitura metafórica também pode prestar-se a diversas interpretações, algumas até de sinal contrário. E assim, tudo o que antes era religiosamente proibido passa agora a ser vagamente permitido.

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Ora, seria infantil pedir a São Tomás absolvições para quem pratique um aborto dentro de um dado período de tempo, e, provavelmente, ele não pensava sequer nas implicações morais do seu discurso, que hoje chamaremos de tipo refinadamente científico. No entanto, é curioso que a Igreja, que sempre se reclama do magistério do doutor de Aquino, sobre este ponto tenha decidido afastar-se tacitamente das suas posições.

Aconteceu um pouco aquilo que aconteceu com o evolucionismo, com que a Igreja tinha chegado a acordo há muito, porque basta interpretar em sentido metafórico os seis dias da criação, como sempre fizeram os padres da Igreja, e eis que deixa de haver contra-indicações bíblicas a uma visão evolucionista. Pelo contrário, o Génesis é um texto refinadamente darwinista, porque nos diz que a criação aconteceu por fases, do menos complexo ao mais complexo, do mineral ao vegetal, ao animal, ao humano.


No princípio, Deus criou o céu e a terra. [...] Deus disse: «Haja luz!» E houve luz. Deus viu que a luz era uma coisa boa e separou a luz das trevas e chamou à luz dia e às trevas noite. [...] Deus fez o firmamento e separou as águas que estão debaixo do firmamento das águas que estão por cima do firmamento. [...] Deus disse: «Juntem-se as águas que estão debaixo do céu num único lugar e apareça seco.» E assim aconteceu. Deus chamou ao seco terra e à massa das águas mar. [...] E Deus disse: «A terra produza rebentos, ervas que produzam sementes e árvores de fruto, que dêem na terra fruto com a semente, cada uma segundo a sua espécie» [...]. Deus fez as duas luminárias grandes, a luminária maior para senhorear o dia e a luminária menor para senhorear a noite, e as estrelas. [...] Deus disse: «As águas fervilhem de seres vivos e aves voem sobre a terra, diante do firmamento do céu.» [...] Deus criou os grandes monstros marinhos e todos os seres vivos que deslizam e fervilham nas águas [...]. Deus disse: «A terra produza seres vivos segundo a sua espécie: gado, répteis e animais selvagens segundo a sua espécie.» [...] E Deus disse: «Façamos o homem à nossa imagem, à nossa semelhança.» [...] E então o Senhor Deus formou o homem com pó da terra e soprou-lhe nas narinas um fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente.


A escolha de uma batalha anti-evolucionista e de uma defesa da vida que chega até ao embrião parece sobretudo um alinhamento com as posições do protestantismo fundamentalista.

Eco, Umberto; Construir o Inimigo e Outros Escritos Ocasionais, Gradiva, 2011. Pág. 127-128

domingo, novembro 13, 2011

sexta-feira, novembro 11, 2011

1984?

O esquizofrénico plano do Governo - empobrecer para enriquecer - é uma coisa sinistra. Pela ambivalência, faz lembrar o lema do Grande Irmão: "Guerra é Paz; Liberdade é Escravidão; Ignorância é Força."

Afinal, que tempo é este que estamos a viver? 1984?

domingo, novembro 06, 2011

Povo-boi

A apropriação dos rendimentos do trabalho prossegue à vista desarmada, e o povo a ruminar numa pacata mansidão. É espantoso!

Parece que nunca abandonámos da nossa memória colectiva a vivência dos tempos de uma "casa portuguesa, com certeza: pão e vinho sobre a mesa." Esses tempos em que tudo nos faltava, menos a açorda e o vinho (e os meninos do povo animavam-se com “sopas de cavalo cansado” e trabalho), que a carne ou o peixe, nem vê-los – coisa de burgueses. Até a liberdade nos faltava, ou a liberdade acima de tudo. Comia-se açorda e bebia-se vinho. Fado, Fátima e Futebol. Os anos em que todos éramos magriços. Foram muitos anos de Estado Novo. Anos que não se apagaram. Os “brandos costumes”, mil vezes martelados aos nossos ouvidos por uma insidiosa propaganda, e a coerção pidesca, amansaram-nos. Até a Revolução foi uma coisa de flores.

Os tempos de falsa prosperidade foram breves e, pelos vistos, não foram suficientes para iludir os portugueses da sua condição de pobre povo do cú da Europa. Os “cafres da Europa”, já dizia o Padre António Vieira. Só assim se consegue explicar a apatia e a plasticidade de um povo, que tão bem se adapta a estes tempos de infortúnio e abuso. É um povo-boi que tudo suporta.

Pobre povo.

P.S. – 5 milhões de entre nós (1/3 dos portugueses no mundo) foram-se embora. Não estiveram para isto.

Cristo indignado

A Expulsão dos Vendilhões do Templo, El Greco, c. 1600 (pormenor)

Estava próxima a Páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém. Encontrou no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas, e os cambistas nos seus postos. Então, fazendo um chicote de cordas, expulsou-os a todos do templo com as ovelhas e os bois; espalhou as moedas dos cambistas pelo chão e derrubou-lhes as mesas; e aos que vendiam pombas, disse-lhes: «Tirai isso daqui. Não façais da Casa de meu Pai uma feira.»

Jo 2, 13-22

O templo imaterial da democracia está hoje tomado por vendilhões da alta finança. Para dizer a verdade, o mundo está hoje tomado por essa gente. Ele indignar-se-ia, decerto.

sábado, novembro 05, 2011

Também tu, Obama?!


Obama e Cameron, ao recusarem a aplicação da Taxa Tobin – a tributação dos movimentos de capitais -, mostram, mais uma vez, a sua verdadeira face: a de servidores e testas de ferro de obscuros interesses financeiros antidemocráticos. Afinal a quem servem eles, na verdade? Não deveria ser a democracia? Contudo, parecem defender mais as organizações financeiras multinacionais e os patrões da alta finança do que os povos que os elegeram. Mais uma traição à democracia.

***

Já em 2002, Ignacio Ramonet alertava (os destaques são nossos):

"Podem as sociedades democráticas, durante muito tempo, tolerar o intolerável? É urgente deitar grãos de areia nestes movimentos devastadores dos capitais. De três formas: supressão dos “paraísos fiscais”; aumento da fiscalidade sobre os rendimentos do capital; tributação das transacções financeiras.

(…)

A tributação dos lucros financeiros é uma exigência democrática mínima. Esses lucros deveriam ser tributados da mesma forma que os rendimentos do trabalho. Tal não acontece em nenhum lado, nomeadamente no seio da União Europeia.

A liberdade total de circulação de capitais desestabiliza a democracia. É por isso que importa implementar mecanismos dissuasivos. Um dele é a Taxa Tobin, assim chamado pelo nome do Prémio Nobel da Economia, o americano James Tobin que a propôs em 1972. Trata-se de tributar, de forma módica, todas as transacções no mercado de capitais para os estabilizar e, simultaneamente, para encontrar receitas para a comunidade internacional. À taxa de 0,1%, a Taxa Tobin conseguiria, num ano, qualquer coisa como 166 mil milhões de euros, duas vezes mais do que o total anual necessário para erradicar a extrema pobreza em cinco anos."

Ignacio Ramonet, Guerras do Século XXI, Campo das Letras. 2ª ed. 2003. pág. 106-107.

***

Parece que o Presidente Cavaco Silva vai aos EUA encontrar-se com Obama: porque não tenta convencê-lo a abraçar a Taxa Tobin? (Eu sei, eu sei…é uma piada.)

Cavaco Silva clama por unidade social. Mas como, se os lucros não são tributados da mesma forma que os rendimentos do trabalho? Como pode haver unidade social quando não há justiça na distribuição dos sacrifícios?

quarta-feira, novembro 02, 2011

Economias!

Para a social-democracia, que governa sozinha em vários grandes países europeus, a política é a economia; a economia são as finanças; e as finanças são os mercados.

Ignacio Ramonet, Guerras do Século XXI, Campo das Letras. 2ª ed. 2003. pág. 39.

E daqui recuamos cerca de 140 anos, ao criticado partido reformista por Eça de Queirós, nas suas Farpas. Aquele partido, segundo Eça de Queirós, respondia invariavelmente a todas as questões que lhe colocavam, com uma única palavra: “Economias!”


- Senhor – disseram [questionando o partido reformista]-, espalharam-se por aí que vindes restaurar o País. Ora deveis saber que um partido que traz uma missão de reconstituição deve ter um sistema, um princípio que domine toda a vida social, uma ideia sobre moral, sobre educação, sobre trabalho, etc. Assim, por exemplo, a questão religiosa é complicada. Qual é o vosso princípio nesta questão?

- Economias! – disse com voz potente o partido reformista.

Espanto geral.

- Bem! E em moral?

- Economias! – bradou.

- Viva! E em educação?

- Economias! - roncou.

- Safa! E nas questões de trabalho?

- Economias! – mugiu.

- Apre! E em questões de jurisprudência?

- Economias! – rugiu.

- Santo Deus! E em questões de literatura, de arte?

- Economias! – uivou.

Havia em torno um terror. Aquilo não dizia mais nada.

Eça de Queirós (1871) , Uma Campanha Alegre. Edição Livros do Brasil. Lisboa. Pág. 39-40.

***

O terror a que Queirós se referia não é mais do que o horror económico que agora nos assola. Somos hoje governados por uma espécie de partido reformista à Queirós, ao qual parece faltar “um sistema, um princípio que domine toda a vida social, uma ideia sobre moral, sobre educação, sobre trabalho, etc.” Os que nos governam submetem toda a sua política a um único fim: “Economias!”

Economias e mercados!

sábado, outubro 29, 2011

Epitáfio de Cláudia (Roma, Séc. II a.C.)

Estrangeiro, pouco tenho para dizer; pára e lê.

Este é o sepulcro não pulcro de uma pulcra mulher.

Cláudia foi o nome que lhe puseram seus pais.

Ao marido amou de todo o seu coração.

Filhos, criou dois. Destes, a um,

Deixou sobre a terra, o outro sob ela.

Aprazível a sua fala, gracioso era o seu andar.

Cuidou da sua casa, fiou lã. Disse. Podes ir-te.

Roma, Séc. II a.C.

Traduzido do original por Maria Helena da Rocha Pereira, Romana – Antologia da Cultura Latina, 6.ª ed, Guimarães, pág. 23

Imperatrix Europa


Os alemães rejubilam. O seu poder nunca foi tão grande desde a II.ª Guerra Mundial.

sexta-feira, outubro 28, 2011

O que se passa na Islândia?

O Prémio Nobel da Economia, Paul Krugman, diz-nos aqui: "The Path Not Taken"

Não há só uma alternativa. Isso é uma treta tatcheriana que os fundamentalistas de mercado, para não dizer pior, nos querem impor. A austeridade que estamos a atravessar é uma opção política, acima de tudo, e está longe de ser uma fatalidade.

A alternativa não é a Irlanda! É a Islândia!

domingo, outubro 23, 2011

O grande desígnio nacional

Voltar aos mercados o mais brevemente possível. Para os que agora nos governam, esse é o grande desígnio nacional. Se o conseguirmos, acreditam, poderemos continuar alegremente na senda do endividamento. Voltar aos mercados para que passe a haver dinheiro no “pote”! Pobre desígnio. Mal vai um povo quando o suor do seu rosto, do seu trabalho, não lhe basta. Passa então a viver de mão estendida. Perdeu a liberdade.

Só líderes fracos podem acalentar tal desígnio.

Já dizia o Poeta: “Que um fraco Rei faz fraca a forte gente.” (Camões)

Morte

Em determinadas circunstâncias de grande esforço vêm-me à cabeça essas primeiras palavras do poema de Lorca: “Que esforço! Que esforço do cavalo para ser cão!” (É que não está na natureza do cavalo ser um cão. Não se pode ensinar um cavalo a ser um cão. Só a morte os transforma, ou pode transformar um no outro. Porque na verdade, nada se perde, tudo se transforma e por isso nada morre. )

Dizem que o cavalo é o mais poderoso símbolo onírico da morte. É, curiosamente, por aí que o poeta começa.


Morte

Que esforço!

Que esforço do cavalo

para ser cão!

Que esforço do cão para ser andorinha!

Que esforço da andorinha para ser abelha!

Que esforço da abelha para ser cavalo!

E o cavalo,

que flecha aguda exprime da rosa!,

que rosa de cinza seu bafo levanta!

E a rosa,

que rebanho de alaridos e de luzes

ata ao vivo açúcar da sua haste!

E o açúcar

que punhais vai sonhando em vigília!

E os punhais,

que lua sem estábulos, que nudez,

pele eterna e rubor andam buscando!

E eu, pelos beirais,

Que serafim de chamas busco e sou!

Porém o arco de gesso,

que grande, e invisível, e diminuto,

sem nenhum esforço!

Garcia Lorca

(traduzido por Eugénio de Andrade, Poesia e Prosa [1940 – 1986], II Volume, 3ª edição aumentada, Circulo de Leitores.

***


Os poemas de Lorca são como os quadros do Dali. Os seus versos, por vezes, parecem sucessões de imagens surreais. Lorca é o surrealismo na poesia.

sábado, outubro 22, 2011

sexta-feira, outubro 21, 2011

O Cavalo de Tróia para o assalto à Constituição


Gomes Canotilho, constitucionalista e Professor jubilado esta semana em Coimbra
(citação extraída do blogue Almocreve das Petas)

Havia na Roma Antiga uma designação legal para uma situação de excepção, à qual não se aplicava a Lei geral – o homo sacer. Tratava-se de uma pessoa que podia ser morta ou assassinada por qualquer outra, sem que a sua morte fosse reconhecida, em qualquer sentido legal, como sendo um homicídio ou sacrifício religioso. Tratava-se de uma pessoa à qual não se aplicavam os direitos civis porque se encontrava num estado de excepção mediante o qual a lei era preservada através da sua suspensão autorizada (Barkan, 2011). Por outras palavras, para se poder contrariar a lei geral, criava-se uma situação de excepção, para justificar todo o tipo de violações dessa mesma lei.

À escala das nações e dos Estados, a criação ou existência de situações de excepção tem servido para justificar violações de Direitos Humanos entre outros direitos. É conhecida a situação da base Guantanamo e a tortura dos prisioneiros. Também sobre eles não recai a lei geral que os poderia proteger legalmente da tortura. Os prisioneiros são mantidos numa base distante do solo continental dos EUA: não convém violar os Direitos Humanos dentro de casa e à vista dos olhares do cidadão comum. As vergonhas têm de ser escondidas. Na verdade, aos prisioneiros de Guantanamo não se aplica a lei geral que vale para o comum dos cidadãos, porque a situação excepcional da Guerra ao Terror assim o determina. Homo sacer, portanto.

Tudo isto para dizer que a criação de cenários que envolvam situações de excepção, situações de crise, como a que vivemos actualmente, pode constituir uma estratégia política para se tomarem decisões que vão contra a lei geral, a Constituição ou os direitos sociais de que fala Canotilho.

Os cidadãos devem permanecer alerta pois a crise que atravessamos é muitas vezes referenciada, e não por acaso, como uma situação de emergência ou uma espécie de estado de guerra – situações de excepção, portanto. Os que alimentam este discurso, geralmente os políticos que nos governam e certos comentadores, tentam dessa forma, justificar as medidas de austeridade que estão a ser tomadas e que obrigam os cidadãos ao seu cumprimento, ainda que em violação da Constituição do País. O estado de crise ou de emergência enquadra medidas que violam a lei geral: cortam-se ou reduzem-se salários à revelia do diálogo social, da concertação entre Estado, sindicatos e entidades patronais, por exemplo, quando a Constituição determina que assim seja. Atropelam-se direitos laborais e outro tipo de direitos sociais. Tudo à nossa vista.

Não foi por acaso que, ao abrigo da situação excepcional em que vivemos, Manuela Ferreira Leite, sem qualquer pudor, vem propor, em alternativa aos cortes do subsídio de férias e do 13.º mês por dois anos na função pública, que os cidadãos passassem a pagar os serviços de saúde e de educação prestados pelo Estado durante igual período, quando a Constituição determina a sua gratuitidade ou a tendência para tal (é óbvio que nada é gratuito e que são os contribuintes que, mediante os seus impostos, asseguram os serviços do Estado, ainda que a Constituição se refira a gratuitidade). A gratuitidade da educação e da saúde é um direito que lhes assiste. Suspendia-se a Constituição portanto. Já antes Manuela Ferreira Leite tinha sugerido a suspensão da democracia durante uns meses, como se os males do país fossem a democracia ou a Constituição.

Vivemos tempos excepcionais dizem eles, para que possam fazer vingar a sua agenda política de leis excepcionais.

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Referência

Barkan, Joshua (2011), "Law and the geographic analysis of economic globalization", Progress in Human Geography, 35(5), 589 - 607,

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